Ítalo - Livro Reencontros - Familiares Diversos / Chico Xavier - Cap. 3 - Meritória e abençoada premonição
2ª Carta
“Quem dirá que existe a morte, quando a vida resplende por toda a parte?”
Querida Diva, peço a Jesus nos abençoe.
Estamos aqui na emoção de quem relembra o alvorecer do dia de março que nos separou, do ponto de vista físico.
O coração se emociona e as lágrimas me sobem do íntimo para os olhos — entretanto são as boas lágrimas da alegria de quem agradece a Deus as bênçãos recebidas.
Temos todos os nossos filhos queridos conosco, neste momento, representados pelo João, com Renato, Ricardo e Mara, com o nosso prezado José Luiz, que é igualmente nosso filho pelo coração, e junto de nós temos os amigos, na pessoa de nossa irmã de sempre, dona Nega, e pelo amigo José Sebastião, aliás, complementando a família de irmãos que temos no recinto. Agradeço os pensamentos de paz e amor que você, querida esposa, me traz com os corações queridos do lar.
O primeiro aniversário da morte é também o natalício da verdadeira vida. Trezentos e sessenta e seis dias de saudade que a nossa fé em Deus enfeitou com a esperança.
Dizem que o amor imenso, e o afeto das entranhas da alma, pertencem às mães; entretanto, fui pai e estou assim qual você própria, na hipótese de se reconhecer à distância dos filhos queridos.
Graças à Divina Providência, não é você em minha situação, porque, em verdade, insubstituível é a presença materna para conservar a estabilidade da família. Conforto-me ao saber que sou eu o suposto ausente, embora reconheça quanto nos dói a todos a separação ilusória.
Foi justa, como sempre, a Lei que me arrebatou ao convívio de casa, porquanto, sem a sua companhia no Plano Físico, não saberia, por mim mesmo, de que modo agir para manter a aglutinação de todos os nossos, em torno da nossa confiança recíproca dentro da reunião de que necessitamos para seguir à frente, com o desempenho de nossas obrigações.
Aqui encontrei disposições da Vida Espiritual que me surpreenderam pelo sentido humanitário que as inspira. Os amigos desencarnados, de cuja legião agora participo, se trazem algum equilíbrio, desfrutam a possibilidade de prosseguir ao lado daqueles entes amados, aos quais se vinculam desde que se ofereçam para trabalhar em benefício da vida comunitária de que procedem.
Quem aspire à elevação usufrui o direito de buscar o Mais Alto; entretanto, os que se acham presos pelos laços afetivos — os mais sublimes — preferem as tarefas do ambiente em que viveram e de que foram partícipes nas realizações da retaguarda, e foi assim que preferi estar tanto tempo, quanto me seja possível, em Araras, a terra florida de bênçãos em que Deus nos permitiu constituir o ninho doméstico.
Procuro servir de algum modo, junto aos companheiros do ideal e especialmente nas tarefas da Fraternidade Ararense, nas quais o esforço maçônico é dos mais amplos e mais dignos, especialmente no lado da Vida em que presentemente me encontro.
É por isso que em todos os seus momentos de tristeza, sinto-me positivamente atingido por suas lembranças e quanto se me faculta o trabalho, de retorno à intimidade familiar, eis-me compartilhando com você de todas as preocupações e incertezas que lhe alcançam a sensibilidade.
Como vê, não é fácil desencarnar o amor, quanto se desencarna o habitante transitório do corpo físico. Pela força do amor, prosseguimos unidos àqueles que amamos e nem poderia ser de outro modo, porque de que serviria um céu de alegrias fáceis para mães e pais que se apartassem dos filhos — tesouros de Deus que Deus nos confiou?
Peço-lhe, por isso, esperança e otimismo, diante de quaisquer ocorrências da Vida. Recorde, querida companheira, que todos os acontecimentos vão passando, como se estivéssemos aí no mundo inseridos num caleidoscópio a funcionar em câmara lenta. Basta lembrar projetos e realizações nossos de vinte a vinte e cinco janeiros atrás e você perceberá a legitimidade do que afirmo.
Não perca a sua paciência e igualmente não se afaste da sua alegria de viver. Conserve o seu contentamento e a sua confiança na Vida. Nossos filhos e nossos netos, nossos familiares e amigos necessitam de nós, quais fôssemos peças lubrificadas com segurança para o melhor funcionamento da engrenagem social de que participamos.
Não permita que a tristeza lhe ensombre a face e, nas situações consideradas piores, não arquive o sorriso com que você sempre me abençoava nas lutas de homem que a Bondade do Senhor transformara em pai de família.
E não deseje vir ao meu encontro, antes do instante certo. Isso poderia alterar os planos de serviço que abracei a fim de esperá-la com mais recursos de paz e felicidade no futuro. Continue aconchegando nossas novas crianças no coração.
Os netos são amores de nossos meninos, desses doces meninos a que estamos enlaçados para a realização do melhor ao nosso alcance. Creia que afago a todos eles com a mesma ternura e são eles, as riquezas nossas, que me estimulam no aprendizado de servir e de ser mais útil onde me encontro, na continuidade da ventura de prosseguir ao seu lado.
Estimaria relacionar a todos pelos nomes, a fim de marcar-lhes a presença em minhas lembranças escritas, mas dos que estão aí com você, personalizo em nossa pequenina e terna Lucila, de Marta e do Esem, o jardim dos netos queridos; e daqueles com os quais convivo na Espiritualidade, antes mesmo de se corporificarem na Terra, simbolizo na querida Marinazinha, de João e Mírian, a nossa garotada que virá. Não importa me veja aqui, porquanto sei que do lado humano está você repartindo o nosso coração com todos.
Por vezes, querida Diva, as saudades de pai são tão grandes que procuro na região de minha nova moradia visitar as crianças, que formam em nossos recantos verdadeiros conjuntos de esperança e carinho. E então que me consolo ao abraçar os pequeninos do Parque da Esperança, que desfruta a direção criteriosa e nobre da nossa irmã Rosa Zurita e de muitas companheiras da irmã Yolanda Cabianca, admiráveis amigas da infância carente de amor.
E os diálogos de amizade se desdobram. São irmãos da Fraternidade que estudam novos métodos de auxiliar aos semelhantes, são os amigos Franzini, Rodini, Padre Atílio, Nunes e tantos outros com os quais me entretenho, a fim de assimilar ensinamentos de solidariedade que desconhecia.
Ao nosso grupo se associou o nosso companheiro Roberto Mercatelli e você pode avaliar quantas faixas de serviço se ampliam presentemente em nosso favor. O nosso Michielin é outro amigo a esforçar-se intensivamente na retomada das construções educativas a que se dedicou na bondade que lhe conhecemos, e Araras prossegue em nós e por nós, à busca do porvir em conjunto com todos aqueles que amamos, que ficaram e que vieram, porque vieram em nosso carinho e em nossa saudade, à maneira de âncoras a nos resguardarem firmes na disciplina do trabalho em pleno mar da vida terrestre.
Peço a você dizer ao nosso Rui e à nossa estimada Maria que o irmão Pedro Pôncio está igualmente em nosso campo de ação e, qual me vejo docemente acorrentado à família, também ele se observa carinhosamente agrilhoado à nossa irmã Sebastiana, a companheira querida e digna, que ele deixou na retaguarda.
Elos divinos! Quem dirá que existe a morte, quando a vida resplende por toda parte? Em nenhum lugar a solidão nem o vazio, porque, ao que me parece, a Natureza de Deus deve ser o oceano de amor em que todos nos achamos imersos.
Aqui se encontra em nossa companhia o amigo Ferdinando Pinton que igualmente se nota ligado à nossa estimada Dona Nega e, qual assinalamos, as conexões da alma nunca se desfazem.
Ao nosso estimado José Luiz desejamos anunciar a presença da irmã Della Torre que, como nos sucede, se incorpora gradativamente à moldura da Vida Espiritual.
Todos nós, os amigos liberados das inibições físicas, aqui estamos e nos rejubilamos com as preces e com os ensinamentos ouvidos.
Da comunidade familiar notei a sensação de estranheza com a ausência dos nomes de meus irmãos em minhas notícias, mas sem possibilidade de nomear a todos, em nosso Luís e em nossa irmã Ida, abraço a quantos permanecem no veludo de recordações da mamãe Joaninha.
Diva, peça ao Renato e ao João transmitirem aos nossos companheiros do Instituto o meu apelo a que prossigam atentos.
O trabalho na extensão do conhecimento libertador é uma bênção que os nossos Mentores nos concederam, creio que por empréstimo de essência divina, tamanhas são hoje aos meus olhos a responsabilidade e a alegria de que se revestem.
E agora, muito carinho a todos os nossos. Peço à Mara e ao nosso querido Lemão permanecerem atentos aos seus bons avisos e rogo ao seu coração beijar a todos os rebentos de nossos rebentos, a começar da Lucilinha.
A todos os meus filhos e nossos amigos a minha dedicação e o meu reconhecimento de todos os dias e para você, querida Diva, neste primeiro ano de muita saudade e de mais amor, de tanta distância e de maior aconchego através da luz de nossa união, para nós divina, todos os sentimentos de ternura e gratidão, de esperança e fé viva em Deus, do esposo e companheiro que foi, é e será sempre o seu
Ítalo
NOTAS E IDENTIFICAÇÕES
— Carta psicografada pelo médium Francisco C. Xavier, em reunião pública do Grupo Espírita da Prece, em Uberaba, Minas, na noite de 7/3/1980.
— Ítalo desencarnou às 14:45 horas, do dia 8/3/1979.
— José Luiz, que é igualmente nosso filho pelo coração — José Luiz Cóser, grande amigo de Renato, sempre frequentou a casa de Ítalo. Estava presente à reunião.
— Nossa irmã de sempre, dona Nega — Maria Duarte Pinton, mais conhecida por D. Nega, grande amiga da família.
— Amigo José Sebastião — Namorado de Mara, filha de Ítalo.
— Trezentos e sessenta e seis dias de saudade — Ao final da reunião, Chico comentou com a família que ao ler a carta, de público, estranhou o número 366, pensando que tivesse havido uma falha na captação mediúnica: o certo seria 365 dias. Mas, o Espírito de Ítalo, ao seu lado explicou que o texto estava certo pois o ano de 1980 fora bissexto.
— Fraternidade Ararense — Loja Maçônica “Fraternidade Ararense”, a qual Ítalo pertencia.
— Nossa pequenina e terna Lucila, de Marta e do Esem — Na época em que escreveu esta carta, sua netinha Lucila contava com um ano de idade.
— E daqueles com os quais convivo na Espiritualidade, antes mesmo de se corporificarem na Terra, simbolizo na querida Marinazinha, de João e Mírian, a nossa garotada que virá — Este é um dos mais lindos trechos da carta de Ítalo, descortinando-nos a evolução de uma família nos dois Mundos: Material e Espiritual, através de abençoadas reencarnações. Quando ele a redigiu, a neta Marinazinha já estava de regresso ao Plano Espiritual havia 2 anos; e, desde então, nasceram mais dois netos: Luciana, filha de Rodolfo e Mirângela; e Ítalo, filho de Marta e Esem.
— É então que me consolo ao abraçar os pequeninos do Parque da Esperança — Ver comentário sobre o futuro das crianças no Mundo Espiritual no Capítulo 5 (Nota 3).
— Rosa Zurita — Rosa Padula Zurita, esposa de Ignácio Zurita Júnior (Identificado na Nota 12 deste Capítulo), faleceu em 24/4/1961. “Esposa devotada e mãe amantíssima, fez de sua existência uma lição e um exemplo.” Uma das Vilas, o seu Centro Comunitário e um dos Parques Infantis da cidade receberam o nome: “Dona Rosa Padula Zurita” — justas homenagens à sua memória.
— Yolanda Cabianca — Yolanda Sales Cabianca, dedicada e estimada professora, lecionou, por muitos anos, na Fazenda Santa Cruz, do município de Araras. Faleceu em São Paulo, a 15/8/1971, sendo sepultada em Pirassununga, SP, onde residia. Em 1974, foi homenageada pelo Governo do Estado com a denominação de Escola Estadual de 1º Grau “Profª. Yolanda Sales Cabianca” a um grande estabelecimento de ensino do bairro Jardim Marabá, em Araras.
— Franzini — Narciso Franzini, amigo e companheiro de diretoria da Associação Atlética Ararense. Faleceu em 3/4/1965.
— Rodini — José Dante Rodini (9/9/1904 — 22/11/1962), amigo e companheiro de diretoria da Associação Atlética Ararense.
— Padre Atílio — Padre Attílio Cosci nasceu na cidade de Salerno, Itália, em 1868. Recebeu a batina das mãos de D. Bosco, em Turim, e logo em 1892 embarcou para o Brasil. Em 1903, trabalhando em Guaratinguetá, SP, destacou-se pela caridade com que recebia os salesianos atacados pela febre amarela. Era o único que tinha coragem de ficar com os doentes até o momento da morte. Em 1905, fundou em Batatais, SP, um colégio da congregação. Exerceu sua missão em Araras, SP, de 1923 a 1926, e posteriormente, de 1930 a 19/7/1941, data de seu falecimento. Dotado de grandes virtudes, amigo e conselheiro de todos que o procuravam, até hoje é lembrado com saudades pelo povo ararense, que visita seu túmulo frequentemente. Revelando alto espírito ecumênico, cultivava um bom relacionamento, e mesmo amizade, com líderes de outras religiões, dentre eles, o Dr. Roberto Mercatelli, com quem fazia tratamento dentário. A importante Avenida Padre Atílio, em Araras, é uma expressiva homenagem póstuma à sua memória.
Além dessa referência na carta de Ítalo, há outra mensagem mediúnica que mostra a operosidade desse sacerdote no Mundo Espiritual. Em Pedro Leopoldo, MG, com a presença de uma caravana de Araras, dirigida pelo Dr. Lauro Michielin, que buscava orientação espiritual para a campanha pró Sanatório A.L. Sayão, Chico Xavier psicografou, em 7/4/1950, mensagem de Antônio Michielin, avô do Dr. Lauro, da qual destacaremos o seguinte trecho: “Aqui nos achamos com a caravana fraterna diversos companheiros, dentre os quais destaco o Padre Zabeu, o Padre Attílio, o irmão Brito e outros, que aguardam, confiantes, o prosseguimento das tarefas de todos, no rumo de nosso instituto de amor fraternal com o Mestre e Senhor.”
— Nunes — João Nunes Rollo, um dos fundadores da Loja Maçônica “Fraternidade Ararense”, foi amigo, confrade e irmão maçônico de Ítalo. Desencarnou em 18/2/1978.
— Roberto Mercatelli — (23/4/1904 — 17/7/1979). Amigo e companheiro de Doutrina. Um dos fundadores do Sanatório A. L. Sayão. Ver sua biografia em Anuário Espírita 1980, sob o título: “Roberto Mercatelli, um incansável servidor”. (Veja Nota 1 do Cap. 5.)
— Michielin — Dr. Lauro Michielin, advogado e professor de Sociologia, foi um dos fundadores do Sanatório A. L. Sayão e da Loja Maçônica “Fraternidade Ararense”. Escreveu várias obras, sob o pseudônimo de Jacques Garnier, dentre elas: Meditações (Ed. IDE), até hoje em sucessivas reedições. Editou o 1º número do Anuário Espírita (1964). Voltou ao Plano Maior em 24/6/1975, aos 55 anos de idade. Ver sua biografia em Anuário Espírita 1976.
— Pedro Pôncio — Pai de D. Maria Aparecida Pôncio Scanavini, esposa de Rui Scanavini. Faleceu em Araras, a 19/4/1965. Deixou viúva D. Sebastiana, atualmente residente em Sumaré, SP.
— Ferdinando Pinton — Faleceu em 14/1/1979, deixando viúva D. Nega (D. Maria Duarte Pinton), residente em Araras, presente à reunião pública.
— Della Torre — Márcia Della Torre (19/1/1965 — 16/6/1979) residia em Mogi Mirim, SP, e faleceu em acidente automobilístico. Seu primo, José Luiz, presente à reunião, em papel colocado sobre a mesa dos trabalhos, havia pedido notícias de seu estado no Mundo Espiritual.
— Luís e Ida — Luís Scanavini e Ida Scanavini, irmãos, residentes em Araras.
— Companheiros do Instituto — Refere-se ao Instituto de Difusão Espírita (IDE).
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