quarta-feira, 25 de agosto de 2021

Allan Kardec - O Evangelho Segundo o Espiritismo - Cap. 13 - Não saiba a vossa mão esquerda o que dê a vossa mão direita - Fazer o bem sem ostentação - Item 3



Allan Kardec - O Evangelho Segundo o Espiritismo - Cap. 13 - Não saiba a vossa mão esquerda o que dê a vossa mão direita


Fazer o bem sem ostentação 


3. Em fazer o bem sem ostentação há grande mérito; ainda mais meritório é ocultar a mão que dá; constitui marca incontestável de grande superioridade moral, porquanto, para encarar as coisas de mais alto do que o faz o vulgo, mister se torna abstrair da vida presente e identificar-se com a vida futura; numa palavra, colocar-se acima da Humanidade, para renunciar à satisfação que advém do testemunho dos homens e esperar a aprovação de Deus. Aquele que presa o sufrágio dos homens mais do que o de Deus, prova que tem mais fé nos homens do que em Deus e que mais valor dá à vida presente do que à futura, ou mesmo que não crê na vida futura; se diz o contrário, age como se não cresse no que diz.

Quantos há que só dão na esperança de que o que recebe irá bradar por toda a parte o benefício recebido! Quantos os que, em público, dão grandes somas e que às ocultas não dariam uma só moeda! Foi por isso que Jesus declarou: “Os que fazem o bem com ostentação já receberam sua recompensa.” Com efeito, aquele que busca sua própria glorificação na Terra, pelo bem que pratica, já se pagou a si mesmo; Deus nada mais lhe deve; só lhe resta receber a punição de seu orgulho.

Não saber a mão esquerda o que dá a mão direita é uma imagem que caracteriza admiravelmente a beneficência modesta. Mas, se há a modéstia real, também há a falsa modéstia, o simulacro da modéstia. Há pessoas que ocultam a mão que dá, tendo, porém, o cuidado de deixar aparecer um pedacinho, olhando em volta para verificar se alguém não o terá visto ocultá-la. Indigna paródia das máximas do Cristo! Se os benfeitores orgulhosos são depreciados entre os homens, que não será perante Deus? Também esses já receberam na Terra sua recompensa. Foram vistos; estão satisfeitos por terem sido vistos. É tudo o que terão.

E qual poderá ser a recompensa do que faz pesar os seus benefícios sobre aquele que os recebe, que lhe impõe, de certo modo, testemunhos de reconhecimento, que lhe faz sentir a sua posição, exaltando o preço dos sacrifícios a que se vota para beneficiá-lo? Oh! para esse, nem mesmo a recompensa terrestre existe, porquanto ele se vê privado da grata satisfação de ouvir bendizer-lhe do nome e é esse o primeiro castigo do seu orgulho. As lágrimas que seca por vaidade, em vez de subirem ao Céu, recaíram sobre o coração do aflito e o ulceraram. Do bem que praticou nenhum proveito lhe resulta, pois que ele o deplora, e todo benefício deplorado é moeda falsa e sem valor.

A beneficência praticada sem ostentação tem duplo mérito. Além de ser caridade material, é caridade moral, visto que resguarda a suscetibilidade do beneficiado, faz-lhe aceitar o benefício, sem que seu amor-próprio se ressinta e salvaguardando-lhe a dignidade de homem, porquanto aceitar um serviço é coisa bem diversa de receber uma esmola. Ora, converter o serviço em esmola, pela maneira como se faz, é humilhar aquele que o recebe, e há sempre orgulho e maldade  em humilhar alguém. A verdadeira caridade, ao contrário, é delicada e engenhosa no dissimular o benefício, no evitar até as simples aparências capazes de melindrar, dado que todo atrito moral aumenta o sofrimento que se origina da necessidade. Ela sabe encontrar palavras brandas e afáveis que colocam o beneficiado à vontade em presença do benfeitor, ao passo que a caridade orgulhosa o esmaga. A verdadeira generosidade adquire toda a sublimidade quando o benfeitor, invertendo os papéis, acha meios de figurar como beneficiado diante daquele a quem presta serviço. Eis o que significam estas palavras: “Não saiba a mão esquerda o que dá a direita.” 


Allan Kardec








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