Hammed - Livro Imensidão dos Sentidos - Francisco do Espírito Santo Neto - Pág. 63
Instrumento da vida
O desenvolvimento da mediunidade está em razão do desenvolvimento moral do médium?
"Não; a faculdade, propriamente dita, relaciona-se com o organismo; é independente da moral; não ocorre o mesmo com seu uso, que pode ser mais ou menos bom, segundo as qualidades do médium". (O Livro dos Médiuns - 2a Parte - Cap. XX, Item 226-1°)
Estamos seguindo na jornada evolutiva um marco instintivo que nos conduz de volta ao "lar" que existe dentro de nós. Podemos perceber que em nossa intimidade há uma seta espiritual que nos indica a direção da volta para a nossa "casa" interior.
O termo ecologia provém das palavras gregas óikos (casa) e lógos (ciência), podendo ser interpretado como "ciência da casa". A Natureza é criação divina, e nós, filhos de Deus, somos também Natureza.
A Terra (nossa casa) é um imenso complexo ecológico. Seus diversos ecossistemas (associações físicas e biológicas entre os elementos naturais - uma espécie de "vida coletiva" - que se autoorganizam e autorreproduzem) não existem isolados uns dos outros, mas se agrupam em unidades cada vez maiores e mais complexas, formando por fim uma unidade global de vida no planeta.
Assim considerando, a Terra pode ser equiparada a uma teia interligada, um intricado sistema integrado, onde todo ser humano tem um papel criativo e revelador a desempenhar em sua jornada existencial - perceber sua relação íntima com a Natureza.
O homem, nesta aurora do terceiro milênio, necessita compreender que nascer, sobreviver, desenvolver, crescer, criar, viver e morrer são partes de uma única movimentação inseparável e coesa. E que ele é somente uma porção dessa grande sinfonia da evolução da vida.
Há dentro de nós uma ânsia inquestionável de sair dos domínios da escuridão e da ignorância de nós mesmos e de entrar no mundo da claridade e da sabedoria. Portanto, a evolução da alma pode ser comparada a uma caminhada das trevas para a luz. O grão de nossa consciência foi plantado nas profundezas escuras do solo da inconsciência, que constitui a semeadura da aprendizagem e das experiências. Por fim, quando ele desabrocha na superfície terrestre e deslumbra o clarão do dia pela primeira vez, se esquece, quase que de imediato, de onde veio. Talvez aí esteja uma analogia perfeita da razão da perda de nosso senso de identidade.
Não podemos dissociar ou separar o Criador da Natureza e o Espírito do corpo. Ao percebermos a íntima ligação da Divindade dentro de nós, também a veremos igualmente no exterior, quer dizer, nos processos cósmicos que deram origem à vida e dos quais nossas vidas dependem - física e espiritualmente.
Os Espíritos Superiores sabem que em todas as coisas vivas e não vivas há uma qualidade divina, que deve ser respeitada. Em razão disso, Leon Denis sintetizou de forma notável: "O psiquismo dorme na pedra, sonha na planta, agita-se no animal e desperta no homem".
Os povos primitivos tinham como crença o "animismo", considerado um dos primeiros sistemas religiosos de nossa civilização. Acreditavam que os rios, montes, florestas, lagos e mares, bem como os animais e o próprio homem, todos eram animados por uma mesma essência divina. Viviam plenamente no mundo natural, numa época de inocência e também de liberdade. Certamente, quando recuperarmos esse nosso senso de identidade com a Natureza, que esses homens primitivos tinham por instinto nato e leve noção, poderemos voltar a viver numa fase paradisíaca, sentindo a imensa harmonia que governa tudo o que existe no Universo.
A faculdade extra-sensorial é um "instrumento da vida", uma condição natural do desenvolvimento dos seres humanos. Independentemente de as criaturas aceitarem ou não, ela faz parte da naturalidade da existência. É uma faculdade comum a todos, ou seja, integra o processo ontogenético do organismo humano; está presente no desenvolvimento inato das criaturas. Assim afirmam os Espíritos Superiores a Kardec: "(...) a faculdade, propriamente dita, relaciona-se com o organismo; é independente da moral (...)".
Além do mais, "Os bons Espíritos não aconselham jamais senão coisas perfeitamente racionais; toda recomendação que se afaste da reta linha do bom senso ou das leis imutáveis da Natureza, acusa um Espírito limitado e, por conseqüência, pouco digno de confiança". (1)
A interação da mediunidade com a Natureza sempre foi reverenciada por inúmeras culturas do passado, e a ligação entre os mundos visível e invisível, cultivada em todos os tempos da humanidade.
Os sensitivos percebem em todos os lugares o toque da inspiração divina. A abertura da sensibilidade proporciona "olhos sutis", que vêem e exaltam os espetáculos ocultos do Universo.
Exemplo disso é a história de Michelangelo e, mais especificamente, uma de suas mais primorosas obras - a estátua de Davi. Conta-se que, em certa ocasião, utilizando-se de sensibilidade espiritual, ele se dirigiu a um bloco de mármore de Carrara para apará-lo. Divinamente inspirado, começou a dar forma à famosa escultura (hoje exposta em Florença), munido de cinzel e martelo. O iluminado artista italiano afirmava, simbolicamente, que apenas removia o excesso de pedra daquele sólido bloco, dele libertando Davi, aprisionado. Revelar a beleza escondida na matéria, captar as dimensões invisíveis do Universo, faz parte do nosso "sexto sentido".
Michelangelo sabia restituir nossas relações rompidas com o mundo da Natureza.
Os médiuns espiritualizados, a nosso ver, são aqueles que investigam a vida através de suas próprias experiências, integradas a um todo de possibilidades cognitivas. Possuem uma predisposição incomum ao serviço da racionalidade e do sentimento, a ponto de se autoprotegerem da superstição e do misticismo fanático. Podem ser encontrados entre os artistas, filósofos, cientistas, escritores, sacerdotes. Eles sempre lançam mão de um estilo de vida reflexivo, desenvolvendo uma associação íntima entre intelecto e fé, entre Natureza e si mesmos.
Hammed
(1) O Livro dos Médiuns - cap. XXIV, item 267-18º.
Fonte: Imensidão dos Sentidos-pdf
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