segunda-feira, 29 de agosto de 2022

Manoel Philomeno de Miranda - Livro Transição Planetária - Divaldo P. Franco - Cap. 9 - Desafios existenciais



Manoel Philomeno de Miranda - Livro Transição Planetária - Divaldo P. Franco - Cap. 9


Desafios existenciais


Embora de nossa comunidade pudéssemos desfrutar da luminosidade do Sol, sobre a área imensa desolada pairava uma nuvem sombria, pesada, resultante da angústia coletiva, do desespero que assolava os sobreviventes, da revolta que a muitos tomava, enfim, dos transtornos psíquicos causados por aqueles que tiveram a desencarnação violenta.

Podíamos ver as tempestades vibratórias que produziam raios e relâmpagos ameaçadores sobre a imensa cortina quase negra que vestia a paisagem espiritual.

A condensação das energias mórbidas, à semelhança do que acontece na atmosfera terrestre com o choque das temperaturas fazendo desencadear as tormentas, os tornados, sucedia de maneira semelhante na imensa faixa avassalada.

Certamente essa psicosfera perturbava os sobreviventes aflitos que mais adensavam os cúmulos escuros e ameaçadores.

Tornava-se um círculo vicioso: as mentes emitindo ondas sombrias e ab­sorvendo os efeitos danosos que pairavam no ar...

A emoção de ternura e compaixão tomou-me e deixei-me arrastar pelas blandícias da oração em favor daquela sociedade atormentada.

Chegou o momento de retornarmos aos labores. Todos nos encontrávamos assinalados pelo bom humor, pela alegria que se deriva do serviço fraternal de amor ao próximo, e nossa condução fez-se da mesma maneira como chegáramos sob o comando do nosso Benfeitor.

Atingida a região do nosso destino, de imediato passamos ao programa de assistência espiritual aos irmãos do carreiro da agonia.

Logo chamou-me a atenção um Espírito feminino que se encontrava sob terrível dominação de outro, masculino, que se apresentava com aspecto terrível e a explorava psiquicamente de maneira cruel.

Totalmente desvairada e presa aos vestígios carnais, a atormentada debatia-se entre as sensações da decomposição cadavérica avançada e a injunção penosa a que era submetida. Podíamos ver o algoz que a explorava emocionalmente, levando-a a acessos contínuos de gritos, blasfêmias e loucura.

Enquanto a contemplava presa ao corpo que tentava reerguer, talvez pensando em fugir à situação penosa, acercou-se-nos uma anciã desencarnada que, lacrimosa e aflita, pediu-nos ajuda, informando-nos ser-lhe a genitora.

Imediatamente, fez um sintético retrato biográfico da infeliz.

- Minha filhinha - começou entre lágrimas de resignação e débil voz - era vendedora de ilusões. Tornou-se profissional aos catorze anos de idade, quando foi consorciada, de acordo com os nossos costumes, com um homem de aparência respeitável e de caráter vil, muito mais idoso do que ela. Os esponsais foram ricos de alegria, porém, passados dois meses, ele a encaminhou a um prostíbulo de luxo de sua propriedade, onde moçoilas inexperientes e sonhadoras vendiam o corpo em volúpias de paixões.

Fez uma pausa, enxugando o pranto, e logo deu continuidade à narração:

- Minha menina foi estimulada à exploração carnal... Recebeu cuidados adequados ao comércio de que iria participar, submeteu-se a uma cirurgia, a fim de evitar a gravidez, e foi treinada em um tipo de dança muito especial­mente sedutora.

"Com o passar dos dias e meses tornou-se tão célebre, quanto cínica e debochada, atraindo, à casa festiva, os aficionados da sensualidade atormentada. Com o desgaste natural, resultante dos abusos e pela necessidade de vender-se mais e sempre mais, derrapou para os infelizes comportamentos sexuais aberrantes e, para tanto, passou a consumir drogas terríveis...

Visitada por mais de uma vez pela minha ternura, já que o seu pai morrera pouco depois do desvario a que ela se entregava, desgostoso, em razão do choque com a religião que professávamos, pois que somos muçulmanos austeros, adverti-a sem cessar, não conseguindo a mínima consideração nem respeito. Por fim, parecendo cansada dos meus conselhos, num momento de desequilíbrio total expulsou-me do seu bordel de luxúria, sempre dirigida pelo maldito explorador - o próprio marido!

Minha filha havia enlouquecido por uma doença que eu não conseguia compreender. De um para outro momento, transformava-se, ficando tigrina e agressiva, perigosa e má, comprazendo-se em atemorizar os servos e mesmo alguns dos clientes, que lamentavam as suas frequentes mudanças de personalidade, o que os desconsertava no vil conúbio a que se entregavam.

Sem que ninguém soubesse o que ocorria, começou a emagrecer, a de­finhar, como se fosse sugada nas suas energias por uma força estranha e maléfica sempre cruel.

"As dores morais foram-me superiores às frágeis resistências, e não su­portando as angústias contínuas, em razão do imenso amor dedicado à minha menina, faleci vitimada por um ataque cardíaco..."

Silenciou, entristecida, olhando o Espírito querido, ainda vitimado pelo seu algoz...

- Por favor, socorram-na - rogou, súplice, de mãos postas e quase ajoelhando-se, no que foi impedida de imediato. Um ser demoníaco toma-a e desgraça-a desde aqueles longes-pertos dias de aberrações.

Não havia dúvidas que a jovem dançarina atraíra terrível amante de outra existência que se lhe vinculara psiquicamente enquanto no corpo físico, enciumado da conduta que se permitia, passando a explorá-la nos conúbios sexuais de ocasião e de perversão, usurpando-lhe as energias emocionais e, não poucas vezes, tomando-a em surtos obsessivos terríveis...

Examinando o psiquismo do perseguidor, pudemos perceber-lhe os clichês mentais das mais chocantes aberrações, a revolta pela morte que a dominara durante o tsunami, assim ameaçando-lhe a exploração de energias. Tão profundos eram os vínculos entre um e outro, perispírito a perispírito, que ele se lhe imanava qual um molusco à concha que conduz, perversamente ameaçando-a.

Aproximei-me da infeliz e apliquei-lhe energias balsâmicas e calmantes, levando­-a a um ligeiro torpor. Enquanto isso, a mãezinha orava as sutras do Corão, dominada por emoção compreensível e acompanhando a nossa terapia.

Quando conseguimos que o Espírito adormecesse, demos início ao seu deslindamento das vísceras orgânicas, o que conseguimos com o auxílio e a bondade de Abdul que veio em nosso socorro. As duas entidades muito ligadas, lembravam-nos um caso de xifopagia espiritual. O malfeitor bradava em alucinação com medo de perder a presa que explorara por alguns anos, enquanto Abdul falou-lhe com ternura e energia sobre o crime que perpetrava, informando-lhe que a exploração infeliz chegara ao fim naquela oportunidade, quando a morte os separaria e ele teria que enfrentar as conseqüências nefastas da sua crueldade.

A conduta mais própria era adormecê-lo também, a fim de ser providenciado recurso de libertação, quando ela pudesse contribuir com o pensamento e os sentimentos renovados, porquanto a atração mantida era resultado do seu comportamento que facilitara a perfeita identificação entre o plugue nos chakras coronário e sexual e as tomadas do seu agressor...

As Divinas Leis jamais recorrem aos recursos de cobranças comuns às criaturas humanas que se comprazem em fazer justiça mediante as concepções infelizes a que se atem.

Ninguém pode permitir-se o luxo desditoso de recuperar débitos morais e espirituais, colocando-se em posição de vítima, que nunca existe, porquanto, se tal houvesse, deparar-nos-íamos com lamentáveis falhas dos códigos da justiça divina.

Mecanismos próprios de reparação fazem parte das legislações superiores da vida, que jamais falham. Nada obstante, o orgulho e a intemperança daqueles que se consideram prejudicados, logo tomam posições de justiceiros e encarceram-se nas redes fortes dos crimes desconhecidos pela sociedade, porém jamais ignorados pela realidade que sempre terão que enfrentar...

Quando a mãezinha percebeu que a filhinha dormia relativamente em paz, embora alguns estertores naturais, como resultado inevitável das construções mentais arquivadas no inconsciente e as emanações morbíficas do adversário que se mantinha vinculado, sorriu feliz e tentou abraçá-la.

Tratava-se, para mim, de um caso muito especial, porquanto era a primeira vez que observava o fenômeno da obsessão que se iniciara durante a vilegiatura carnal, prosseguindo além da morte, sem nenhuma alteração por parte do perseguidor inclemente. Nessas ocorrências lamentáveis, o algoz também sofria as contingências experimentadas pela sua vítima, em torno do processo de desencarnação. Explorada pelo vingador, ela o intoxicava, embora inconscientemente, com as emanações de desespero e de perda do tônus vital (animal), da conjuntura física, que era absorvido pelo inimigo.

Abdul providenciou uma padiola, e amigos cooperadores para o transporte de ambos os Espíritos ao lugar próprio que lhes estava destinado, considerando-se a especificidade da ocorrência.

Emocionada pela felicidade que fruía, a genitora expressou-nos os seus sentimentos de gratidão, inopinadamente osculando nossas mãos, o que muito nos constrangeu, considerando-se que o mais beneficiado éramos nós próprio.

A obsessão sempre apresenta angulações que nos surpreendem, em razão das organizações mentais e espirituais de cada criatura, variando, portanto, de indivíduo para indivíduo.

A observação desse fenômeno perturbador sempre nos convida a acuradas reflexões em torno da conduta interior do ser humano, que sempre procede do campo mental, a irradiar-se em todas as direções, produzindo sintonias compatíveis com a sua equivalência com outros campos e áreas vibratórios que propiciam as vinculações por afinidade.

Quando as criaturas compreenderem que são as responsáveis por tudo quanto lhes diz respeito, certamente serão alterados os comportamentos individuais e coletivos, elegendo-se aquilo que conduz à harmonia e à felicidade, mesmo que a esforço, ao invés do prazer desgastante de um momento com as suas conseqüências perturbadoras de longo prazo. Na sua ilusão orgânica, porém, preferem a intoxicação do gozo doentio até a exaustão, sem qualquer responsabilidade, agasalhando as idéias absurdas de encontrar-se soluções miraculosas quando se lhes manifestam as conseqüências afugentes, que são inevitáveis.

Não é de estranhar-se a grande mole que recorre ao Espiritismo, à mediunidade, procurando solução milagrosa para os problemas que engendraram e pretendem ver resolvidos, assim mesmo sem a sua contribuição sacrificial.

A existência no corpo físico é uma oportunidade de aprendizagem que a vida concede ao ser espiritual no seu processo de crescimento interior, facultando-lhe os recursos apropriados para que a divina chama que existe em todos alcance a plenitude. De acordo com a maneira como cada um se comporte no mister, estará semeando as ocorrências do futuro, que terá de enfrentar, a fim de recompor-se e corrigir o que foi danificado.

Cada reencarnação é sublime concessão divina para a construção ditosa da imortalidade pessoal.

Escola abençoada, a Terra é o reduto formoso no qual todos nos aperfeiçoamos, retirando a ganga pesada do primarismo, que impede o brilho do diamante estelar do Espírito que somos. Os golpes do processo evolutivo encarregam-se de liberar-­nos, permitindo que as facetas lapidadas pela dor e buriladas pelo amor reflitam as belezas siderais.

Onde nos encontrávamos, podíamos notar as diferenças de conduta entre os aflitos, assinalando maior soma de desespero ou de equilíbrio, que nos proporcionava auxiliá-los com maior ou menor eficiência. Nem todos, porém, aos quais buscávamos socorrer, conseguiam ser liberados, tão fortes se lhes faziam os laços da sensualidade da vida orgânica distante de qualquer espécie de crença na sobrevivência do Espírito.

Não foi possível divagar mentalmente por mais tempo, porque o nobre dirigente chamou-nos ao serviço, considerando que novas desencarnações continuavam ocorrendo e os assaltos por Entidades animalizadas se faziam de contínuo.

A visão das ocorrências post mortem surpreendem mesmo aqueles que, à nossa semelhança, se encontram na Erraticidade há expressivo número de anos.

A vida física disfarça pela aparência o Espírito que habilmente se mascara, procurando demonstrar o que gostaria de ser, mas tudo fazem para não se transformar interiormente para melhor. No entanto, a realidade que o caracteriza, desmistifica-o durante o processo da desencarnação, ocorrendo conforme cada um é e de acordo com as suas possibilidades de recuperação e reequilíbrio.

As paisagens, portanto, próximas à fronteira do túmulo, são, normalmente, afugentes, exceção daquelas que acolhem os Espíritos que se esforçaram para viver de acordo com os padrões do dever, do respeito ao próximo e à vida, mesmo que sem qualquer filiação religiosa. O importante é a conduta que se vivência e não a crença que se esposa. Nada obstante, a religião, quando liberta da ignorância, destituída de fantasias e de superstições, caracterizando-se pela lógica e pela razão, é via sublime de acesso à liberdade plena, pelo que proporciona de lucidez e esclarecimento, auxiliando o viajor a melhor contribuir em favor do próprio êxito na jornada imortalista.

Não havia, porém, tempo para mais amplas reflexões e, ao chamado para o trabalho, dispusemo-nos alegremente ao serviço estabelecido.


Manoel Philomeno de Miranda







VÍDEO: 


Título: Transição Planetária
Autor: Manoel Philomeno de Miranda e Divaldo Franco
Narrador: Paulo Paixão
Editora: Leal
Produtora: Tocalivros Studios





Para ouvir este audiolivro completo: https://www.tocalivros.com/audiolivro/transicao-planetaria


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