Espírito Vianna de Carvalho - Livro À luz do Espiritismo - Divaldo P. Franco - Cap. 1
Na glória da vida
Nesta hora em que a aflição campeia no mundo açoitado pelas calamidades morais e sociais do século, o homem bate às portas da fé, sedento de paz e esperança nas promessas de Jesus.
A religião tradicional, porém, encontra-se muito preocupada com os negócios políticos, na disputa dos poderes terrenos para manter a supremacia de seus enunciados, adornada de ouro e joias de alto preço. Não se preocupa com o homem em si mesmo.
A igreja de Martinho Lutero e suas facções dissidentes demoram-se no desespero proselitista, arregimentando números para estatísticas retumbantes e combatendo-se reciprocamente, ou fazendo alianças improcedentes para vencer nos grandes jogos do mundo. Não se pôde deter no auxílio do indivíduo.
Os diversos pastores, sobrecarregados de responsabilidades sociais, em nome das igrejas a que pertencem, não dispõem de tempo. Deslizam apressados junto aos fiéis atônitos que lhes seguem os passos, desencantados, mantendo postura de fé, no templo, e vivendo profanamente no lar, na rua e na oficina de trabalho.
A ciência materialista do século XX alargou os horizontes do mundo e prolongou a vida física sobre o orbe.
Antibióticos poderosos combatem nos recessos das células, focos de vidas microscópicas organizadas em tarefas de destruição da existência física. As sulfas aniquilam perigosos adversários da saúde. Produtos farmacêuticos surgem diariamente, perseguindo enfermidades orgânicas. Tuberculoses, lepra, sífilis e tantas outras doenças que dizimavam multidões, pertencerão, em breve, aos horrores do passado. No entanto, com os mesmos valiosos recursos continuam funcionando as máquinas do aborto delituoso, a criminosa eutanásia, o desrespeito à maternidade pela limitação de filhos, através de processos pouco dignos, a câmara de gás...
Os índices de criminalidade, decorrentes do uso da maconha, cocaína e morfina, são alarmantes nos países cristãos com foros de civilidade.
A eletricidade aliada à técnica, em nome do conforto e da comodidade, criou veículos velozes, climas artificiais no reduto doméstico, aparelhos fabulosos de várias utilidades, instrumentos de precisão e outros, encurtando as distâncias com o telefone, a televisão, o avião nas suas várias modalidades; radares e sonares, que penetram os abismos do ar e das águas, anotando objetos estranhos, localizando-os e medindo-lhes o peso, a velocidade e seguindo-os implacáveis. Todavia, nos recintos superconfortados campeiam perversões de toda ordem, em que o pudor é motivo de desprezo e vergonha; originam-se hediondos crimes passionais e propaga-se a aberração moral, em flagrante desprestígio da inteligência e da cultura.
As manchetes de jornais apresentam, diariamente, suicídios nefandos, fatos policiais lamentáveis, levando ao seio das famílias os espetáculos das tragédias que, de cedo, predispõem as mentes infantis ao cinismo e à amoralidade.
Os teleguiados que sondam os céus e as distâncias, oferecendo dados fabulosos aos geofísicos, são constantemente alçados à condição de arma inconsciente de destruição pelos governos apaixonados e dominadores.
...E o homem apenas sonha, transformando a antevisão em terríveis pesadelos.
As grandes lunetas, que a inteligência aponta para os altos cimos, mostram a glória de Deus, apresentam as Leis de equilíbrio e falam da Grandeza da ordem, apelando para a razão e o sentimento humanos.
Se olham em torno do Sol, deslumbram-se com o seu poder de rei, adornado de áulicos obedientes a circularem à sua volta em movimentos harmônicos e gráceis. Entretanto, o próprio Sol é vassalo de Alcyone, em torno da qual preenche, em duzentos e vinte cinco mil séculos, uma das suas graciosas revoluções. E Alcyone é apenas umas das estrelas do grupo das Plêiades, que se compõe de aproximadamente mil astros, dos quais apenas sete podem ser vistos a olho nu. Tão longe se encontra do homem, a grandiosa Alcyone, que a sua luz demora 715 anos para chegar à vista insignificante da mais poderosa luneta terrestre.
Alfa Centauri, a mais próxima estrela do homem, dista 4,3 anos-luz.
Sirius, de luz alvinitente, viaja nove anos-luz pelos espaços para oscular a terra com os seus raios diamantinos.
Aprofundando as observações, fulgura na constelação Argo Navis, serena e majestosa, a soberba Canopus, com uma luz correspondente a 8.760 sóis brilhando simultaneamente reunidos, a girar soberana no Infinito.
Apesar da distância incomensurável, Arcturus, estrela dupla de primeira grandeza, na constelação do Boeiro, situada no prolongamento da cauda da Ursa Maior, apresenta singulares e múltiplas variações, brilhando como a mais bela do céu boreal.
Betelguese, na constelação de Orion, vale muitos milhares de sóis iguais ao nosso.
A Via-Láctea, que nos serve de berço, ornamenta-se de cem bilhões de estrelas e, perto dela, num arquipélago de bilhões de astros distantes setecentos mil anos-luz, encontra-se Andrômeda, a galáxia deslumbrante...
E muito além das nossas concepções, fulguram ilhas interplanetárias, quais a Nébula M-87, distante oito milhões de anos-luz..
Os microscópios eletrônicos, pesquisando o infinitamente pequeno, revelam, na máquina grandiosa que é o corpo humano, dados impressionantes. Num centímetro quadrado de pele humana viva há cerca de quatro metros de filetes nervosos, com mil canais sudoríparos, cinco mil pontos sensíveis, seis milhões de células, vinte e cinco pontos de apalpação, duzentos pontos de percepção da dor, doze pontos sensitivos do frio e um metro de vasos expressando a sabedoria do Criador na vida organizada.
Além da sua Esfera, o homem descobre a Majestade Divina em toda parte, e se demora esmagado.
No arcabouço que lhe serve de indumentária para a ascensão da alma nos continuados avatares, encontra a Sabedoria infinita, tecendo a própria glória da vida, e permanece angustiado.
A eletrônica empurra-os para a frente nas pesquisas incessantes.
A cibernética, como ciência do porvir, abre-lhe as portas para novas conquistas.
Mas no casulo carnal onde dorme, incessante inquietação interior o aflige e estiola.
Pulsa o coração divino em todo o universo. Todavia, o homem não tem ouvidos para auscultar a vibração sublime.
Constata que a ciência moderna redescobriu o mundo e o embelezou. No entanto, observa-se escravo da paixão, sendo, por isso mesmo, perturbado e desditoso.
Olha o firmamento com o cérebro incendido de anseios de liberdade, mas permanece na Terra, torturado pelos mais comezinhos fenômenos da existência...
É nesse homem, todavia, que os acordes de uma fé racional e pura, consoladora e científica, tangidos pela bondade de Deus, encontram ressonância. Escutando essa harmonia que a Doutrina Espírita lhe dirige, encontra a alegria que lhe falta e a chave que desvenda todos os mistérios do ser.
Através de processos metafísicos positivos, no Espiritismo, defronta um contingente novo de inquirições e soluções, descerrando a cortina da ficção religiosa para a realidade divina, cujo caminho ainda é Nosso Senhor Jesus Cristo, o Sublime Governador do orbe terrestre.
Cantam, então, nessa alma renovada, as emoções superiores do espírito em libertação, buscando integrar-se na obra grandiosa do Celeste Pai, glorificando a vida imortal.
Espírito Vianna de Carvalho
Manuel Vianna de Carvalho (1874 – 1926), nascido em Icó, no Ceará, foi engenheiro militar, bacharel em matemática, ciências físicas, destacando-se como um dos maiores tribunos do Espiritismo de seu tempo, inspirando a fundação de vários núcleos espíritas em diversos estados do Brasil. Tendo abraçado o ideal espírita desde os 17 anos, foi também um grande incentivador da evangelização infanto-juvenil, além de ter igualmente trabalhado precocemente pela causa da unificação dos espíritas brasileiros.