“Havia muitos que iam e vinham e não tinham tempo para comer.” — (Marcos, 6.31)
O convite do Mestre, para que os discípulos procurem lugar à parte, a fim de repousarem a mente e o coração na prece, é cada vez mais oportuno.
Todas as estradas terrestres estão cheias dos que vão e vêm, atormentados pelos interesses imediatistas, sem encontrarem tempo para a recepção de alimento espiritual. Inúmeras pessoas atravessam a senda, famintas de ouro, e voltam carregadas de desilusões. Outras muitas correm às aventuras, sedentas de novidade emocional, e regressam com o tédio destruidor.
Nunca houve no mundo tantos templos de pedra, como agora, para as manifestações de religiosidade, e jamais apareceu tamanho volume de desencanto nas almas.
A legislação trabalhista vem reduzindo a atividade das mãos, como nunca; no entanto, em tempo algum surgiram preocupações tão angustiosas como na atualidade.
As máquinas da civilização moderna limitaram espantosamente o esforço humano, todavia, as aflições culminam, presentemente, em guerras de arrasamento científico.
Avançou a técnica da produção econômica em todos os setores, selecionando o algodão e o trigo por intensificar-lhes as colheitas, mas, para os olhos que contemplam a paisagem mundial, jamais se verificou entre os encarnados tamanha escassez de pão e vestuário.
Aprimoraram-se as teorias sociais de solidariedade e nunca houve tanta discórdia.
Como acontecia nos tempos da permanência de Jesus no apostolado, a maioria dos homens permanece no vaivém dos caminhos, entre a procura desorientada e o achado falso, entre a mocidade leviana e a velhice desiludida, entre a saúde menosprezada e a moléstia sem proveito, entre a encarnação perdida e a desencarnação em desespero.
Ó meu amigo, se adotaste efetivamente o aprendizado com o Divino Mestre, retira-te a um lugar à parte, e cultiva os interesses de tua alma.
É possível que não encontres o jardim exterior que facilite a meditação, nem algum pedaço de natureza física onde repouses do cansaço material, todavia, penetra o santuário, dentro de ti mesmo.
Há muitos sentimentos que te animam há séculos, imitando, em teu íntimo, o fluxo e o refluxo da multidão. Passam apressados de teu coração ao cérebro e voltam do cérebro ao coração, sempre os mesmos, incapacitados de acesso à luz espiritual.
São os princípios fantasistas de paz e justiça, de amor e felicidade que o Plano da carne te impôs. Em certas circunstâncias da experiência transitória, podem ser úteis, entretanto, não vivas exclusivamente ao lado deles. Exerceriam sobre ti o cativeiro infernal.
Refugia-te no templo à parte, dentro de tua alma, porque somente aí encontrarás as verdadeiras noções da paz e da justiça, do amor e da felicidade reais, a que o Senhor te destinou.
O Espírito de Verdade - O Evangelho Segundo o Espiritismo - Allan Kardec - Cap. XX - Os trabalhadores da última hora - Instruções dos Espíritos
Os obreiros do Senhor
5. Aproxima-se o tempo em que se cumprirão as coisas anunciadas para a transformação da Humanidade. Ditosos serão os que houverem trabalhado no campo do Senhor, com desinteresse e sem outro móvel, senão a caridade! Seus dias de trabalho serão pagos pelo cêntuplo do que tiverem esperado. Ditosos os que hajam dito a seus irmãos: “Trabalhemos juntos e unamos os nossos esforços, a fim de que o Senhor, ao chegar, encontre acabada a obra”, porquanto o Senhor lhes dirá: “Vinde a mim, vós que sois bons servidores, vós que soubestes impor silêncio aos vossos ciúmes e às vossas discórdias, a fim de que daí não viesse dano para a obra!” Mas, ai daqueles que, por efeito das suas dissensões, houverem retardado a hora da colheita, pois a tempestade virá e eles serão levados no turbilhão! Clamarão: “Graça! graça!” O Senhor, porém, lhes dirá: “Como implorais graças, vós que não tivestes piedade dos vossos irmãos e que vos negastes a estender-lhes as mãos, que esmagastes o fraco, em vez de o amparardes? Como suplicais graças, vós que buscastes a vossa recompensa nos gozos da Terra e na satisfação do vosso orgulho? Já recebestes a vossa recompensa, tal qual a quisestes. Nada mais vos cabe pedir; as recompensas celestes são para os que não tenham buscado as recompensas da Terra.”
Deus procede, neste momento, ao censo dos seus servidores fiéis e já marcou com o dedo aqueles cujo devotamento é apenas aparente, a fim de que não usurpem o salário dos servidores animosos, pois aos que não recuarem diante de suas tarefas é que ele vai confiar os postos mais difíceis na grande obra da regeneração pelo Espiritismo. Cumprir-se-ão estas palavras: “Os primeiros serão os últimos e os últimos serão os primeiros no reino dos céus.”
Alan Kardec - O Livro dos Espíritos - 4ª Parte - Das esperanças e consolações - Cap. 2 - Das penas e gozos futuros - O nada.
Vida futura
959. Donde nasce, para o homem, o sentimento instintivo da vida futura?
“Já dissemos: antes de encarnar, o Espírito conhecia todas essas coisas, e a alma conserva vaga lembrança do que sabe e do que viu no estado espiritual.” (393)
Em todos os tempos o homem se preocupou com o seu futuro para lá do túmulo, e isso é muito natural. Qualquer que seja a importância que ligue à vida presente, não pode ele furtar-se a considerar quanto essa vida é curta e, sobretudo, precária, pois que a cada instante está sujeita a interromper-se, nenhuma certeza lhe sendo permitida acerca do dia seguinte. Que será dele, após o instante fatal? Questão grave esta, porquanto não se trata de alguns anos apenas, mas da eternidade. Aquele que tem de passar longo tempo em país estrangeiro se preocupa com a situação em que lá se achará. Como, então, não nos havia de preocupar a em que nos veremos, deixando este mundo, uma vez que é para sempre?
A ideia do nada tem qualquer coisa que repugna à razão. O homem que mais despreocupado seja durante a vida, em chegando o momento supremo pergunta a si mesmo o que vai ser dele, e involuntariamente nutre esperança.
Crer em Deus sem admitir a vida futura seria um contrassenso. O sentimento de uma existência melhor reside no foro íntimo de todos os homens e não é possível que Deus aí o tenha colocado em vão.
A vida futura implica a conservação da nossa individualidade após a morte. Com efeito, que nos importaria sobreviver ao corpo, se a nossa essência moral houvesse de perder-se no oceano do infinito? As consequências, para nós, seriam as mesmas que se tivéssemos de nos sumir no nada.
Allan Kardec
O Livro dos Espíritos comentado pelo Espírito Miramez
Questão 959 comentada
O instinto do homem, reconhecendo a vida futura, lhe vem do seu conhecimento, antes de vestir-se de carne no mundo terreno. Ele é, pois, instruído no mundo espiritual sobre todas as leis que comandam e regem as vidas e as coisas na Terra, aí existindo e entrando no processo de reencarnação, quantas vezes forem necessárias. O ser humano guarda na consciência todos os transes de vida e morte e, principalmente, de que viverá depois do túmulo. Todos têm intuição disso, desde o índio, até o mais civilizado e, ainda mais, todas as religiões e filosofias espirituais estudam esse assunto, mostrando aos seus seguidores que ninguém morre.
A consciência fala todos os dias; isso é tema comum na acústica da mente. A Doutrina dos Espíritos traz para a humanidade a certeza da continuação da vida depois da morte do corpo, e, para tanto, os que já se foram para a espiritualidade estão voltando, como o fez Jesus, deixando Sua mensagem de vida e meio mais fácil de viver, alcançando a tranqüilidade e aumentando, desse modo, a esperança.
Todo homem conserva vaga lembrança do que viu e sentiu antes de tomar um corpo de carne. Deus não deixa alma alguma sem essa esperança. Todas as nações preocupam-se com o seu futuro e as religiões revestem essa crença com fórmulas que hoje não têm mais razão de ser. Se tudo se aperfeiçoa, quanto mais as coisas espirituais!
Jesus foi luz que eliminou as trevas, mostrando, com a Sua ressurreição, que realmente ninguém morre, aparecendo diversas vezes e se mostrando como era para ser conhecido a todos os Seus seguidores.
Se o Espiritismo é a continuação do Cristianismo, ele faz o mesmo. Pela mediunidade, é mostrada aos que ficaram na Terra, a presença do Espírito por variados meios, de modo que ninguém pode negar a evidência. Pode-se dizer que não existe uma família na face da Terra que já não teve um testemunho de que seus parentes e amigos continuam vivos. Os meios são muitos e eles os usam para dizer que estão mais vivos que antes.
Com o passar dos tempos, a multidão, diante de todos esses fenômenos e outros que deverão surgir, irá perguntar o que fazer para alcançar a felicidade:
Então as multidões o interrogavam, dizendo: Que haveremos, pois, de fazer? (Lucas, 3:10)
Diante desta interrogação, falaremos a todos que sigam a Jesus, que observem o Seu Evangelho e semeiem sementes de alto valor moral; que amem e sejam caridosos em todos os aspectos das necessidades humanas. Se tiveres de fazer uma viagem, deves preparar as malas, levando o suficiente para a tua tranqüilidade. É o que deves fazer: preparar-te moralmente, despertando tuas qualidades valiosas no coração, para a grande viagem que todos devem empreender além do túmulo. Quem não tiver essa segurança, sofrerá duras conseqüências.
A Doutrina dos Espíritos pede às criaturas para estudarem, trabalharem e compreenderem, por todos os meios, a vida, sendo honestas e boas, perdoando as ofensas, esquecendo-as, e amar a Deus em todas as coisas, cultivando a fé e construindo a paz no coração, pela transformação interna, não se esquecendo de Jesus, acompanhando Seus passos.
Miramez
Livro Filosofia Espírita - Volume XIX - João Nunes Maia
Allan Kardec - O Livro dos Espíritos - 2ª Parte - Do mundo espírita ou mundo dos Espíritos - Cap. 9 - Da intervenção dos espíritos no mundo corporal
Possessos
475. Pode alguém por si mesmo afastar os maus Espíritos e libertar-se da dominação deles?
"Sempre é possível, a quem quer que seja, subtrair-se a um jugo, desde que com vontade firme o queira."
Allan Kardec
O Livro dos Espíritos comentado pelo Espírito Miramez
Questão 475 comentada
Para libertar-se da dominação de Espíritos inferiores é indispensável cortar a sintonia que temos com eles. Já dissemos muitas vezes que a obsessão, e mesmo a possessão, é processo de afinidade espiritual do obsediado com o obsessor.
O poder da vontade é válido, mas não é somente pela vontade que se pode ficar livre dos Espíritos perseguidores; a razão nos fala que devemos nos livrar desse tipo de companhia mudando o modo de pensar e, certamente, de viver. Os corvos sobrevoam onde o cheiro os atrai; as moscas procuram ambiente que lhes convém; e assim, os homens buscam sempre o ambiente da sua natureza íntima e atraímos Espíritos da nossa mesma faixa de entendimento. Deves fortalecer o poder da vontade, que é o teu dever, porém, deves usar essa vontade forte para o aperfeiçoamento das qualidades espirituais que carregas no coração.
Existem vários tipos de Espíritos; os dominadores são os piores, pois eles emitem forças negativas para nos dominar, de acordo com as suas idéias de escravidão. Compete-nos reagir com as nossas forças igualmente, mas, também nos esforçando para sair da dependência, e isso se opera com a nessa renovação espiritual, modificando as nossas atitudes, a nossa vida.
Pureza mental não é fácil de conquistarmos, todavia, nunca é impossível. Depois que passarmos ao domínio de nós mesmos, nunca mais voltaremos atrás, porque a vida é crescente, buscando o infinito. A nossa alegria é que a felicidade existe e todos poderemos encontrá-la, ficando com ela eternamente, quando a vida se constituirá em um verdadeiro condicionamento de firmeza de princípios, que encontrará afinidade em nosso mundo interior, espraiando-se em toda a extensão infinita interna, acendendo luzes e edificando o amor nas linhas da fraternidade. Se te modificares e te integrares com a caridade, é certo que somente Espíritos da mesma índole aproximar-se-ão do teu coração.
A religião menos procurada no mundo terreno é a mais perfeita: a religião do amor. Ela pode tomar muitos nomes, mas é sempre a mesma, é o sol da Divindade saída dos lábios de Jesus. A Terra, antes de Cristo, conhecia o nome amor, mas, fazia dele um processo de interesse próprio. Depois do Mestre, esse amor tornou-se um brilhante, transmutando-se em todas as virtudes do bem, capaz de levar as criaturas para a verdadeira paz íntima. O amor é a maior expressão de Deus por onde ele vibre.
Desenvolve o poder da vontade, mas saibas usar esse poder da tua mente, colocando os teus sentimentos a serviço da dama mais iluminada da Terra: a caridade, com as suas divisões benfeitoras e fiéis à fraternidade. Tudo que fizeres, faze-o com amor. Ele sempre dá um toque de luz nos impulsos da vida, libertando-te de todas as injúrias que venhas a encontrar nos caminhos do despertamento espiritual.
Para nos livrarmos das más companhias, necessário se faz criemos ambiente para que os bons companheiros possam encontrar em nós afinidades onde vibram seus corações. Meditemos em Jesus, de modo que a Sua presença em nós faça renovar nossos sentimentos, nos indicando o que devemos fazer da vida. A possessão não nos domina completamente; e ficando um resto de luz nas idéias, podemos fazer dela um caminho para o arrependimento.
Busquemos o Evangelho, para que ele possa nos induzir à renovação da vida no coração da própria vida. Jesus nunca fica longe dos Seus tutelados. Ele está estendendo Suas mãos, permanentemente, em procura das nossas. Aceitemos o Seu chamado.
Miramez
Livro Filosofia Espírita - Volume X - João Nunes Maia
André Luiz - Livro Ação e Reação - Chico Xavier - Cap. 17
Dívida expirante
Era agora num hospital, em triste pavilhão de indigentes, a nova lição que Silas nos reservava.
Ganhando o interior, diversos companheiros acolheram-nos, gentis. E, após saudações amigas, um deles, o Atendente Lago, avançou para o mentor de nossos estudos, cientificando:
— Assistente, o nosso Leo parece gastar os derradeiros recursos da resistência…
Silas agradeceu a informação e explicou que vínhamos justamente para colaborar no descanso de que se fazia credor.
E atravessando longa fila de leitos pobres, nos quais enfermos jaziam padecentes, ao pé de alguns desencarnados em trabalho assistencial, estacamos junto de um doente esquálido e angustiado.
À mortiça claridade de pequena lâmpada, destinada à vigília da noite, vimos Leo, que uma tuberculose pulmonar arrastava ao cepo da morte.
Não obstante a dispneia, mostrava o olhar calmo e lúcido, revelando perfeita conformação aos padecimentos que o conduziam ao termo da experiência.
Recomendou-nos Silas observar-lhe o corpo, entretanto, não havia muita particularidade a destacar, porquanto os pulmões quase destruídos, através de sucessivas formações cavitárias, haviam provocado tamanho abatimento orgânico, que o vaso físico sob nossos olhos não era mais que um trapo de carne, agora aberto à multiplicação de bacilos vorazes, aliados a exércitos microbianos de variada espécie, a se apinharem, dominadores, na intimidade dos tecidos, assim como inimigos implacáveis a se lhe apoderarem dos restos, senhoreando todos os postos-chaves da defensiva.
Achava-se Leo, desse modo, no veículo denso, à maneira de um homem irremediavelmente condenado à expulsão da sua própria casa.
Todos os sintomas da morte patenteavam-se, iniludíveis.
O coração fatigado assemelhava-se a motor exausto, incapaz de liquidar os problemas da circulação sanguínea, e todos os implementos da aparelhagem respiratória esmoreciam, desnorteados, sob inexorável asfixia.
Leo, moribundo, era um viajante habilitado à grande romagem, tão somente à espera do sinal de partida.
Ainda assim, estava sereno e portava-se com bravura.
Tão acentuada se lhe evidenciava a acuidade mental, que quase nos percebia a presença.
Silas, que lhe acariciava a fronte com a destra generosa, disse-nos, atencioso:
— Já que vieram para anotar um processo de dívida expirante, podem algo perguntar ao companheiro, cuja memória se revela, tanto quanto possível, consciente e vigilante.
— Ouvir-nos-á, porém? — inquiriu Hilário, entre surpreso e compungido.
— Não com os tímpanos da carne, contudo, assinalar-nos-á qualquer indagação em espírito — esclareceu o Assistente, afetuoso.
Dominado de intensa simpatia, inclinei-me sobre o irmão em rude prova, atraído pela fé que lhe abrilhantava as pupilas e, abraçando-o, indaguei, em voz alta:
— Leo amigo, reconhece-se você no limiar da vida verdadeira? Sabe que deixará o corpo em breves horas?
O interpelado, crendo raciocinar por si mesmo, registrou-me a inquirição, palavra por palavra, qual se lhe fossem transmitidas ao cérebro por fios invisíveis. E, como se conversasse a sós consigo, falou pensando:
— Oh! sim, a morte!… Sei que, provavelmente esta noite, chegarei ao justo fim…
Desdobrando o nosso diálogo, acrescentei:
— Não tem receio?
— Nada posso temer… — refletiu muito calmo.
E, movendo os olhos com esforço, buscou fitar na alva parede da enfermaria uma pequena escultura do Cristo crucificado, refletindo de si para consigo:
— Nada posso recear, em companhia do Cristo, meu Salvador… Ele também foi vilipendiado e esquecido… Terá vomitado sangue na cruz do martírio, Ele que era puro, varado pelas chagas da ingratidão… Por que não me resignar à cruz do meu leito, suportando, sem reclamar, as golfadas de sangue que de quando em quando me anunciam a morte, eu que sou pecador necessitado da complacência divina?!…
— Você é católico romano?
— Sim…
Meditei na sublimidade do sentimento cristão, vivo e sincero, seja qual for a escola religiosa em que se exprima, e prossegui, afagando-lhe o peito opresso:
— Nesta hora de tanta significação para o seu caminho, sinto a ausência de seus familiares humanos…
— Ah! meus familiares… meus afetos… — respondeu, falando mentalmente — meus pais teriam sido no mundo os meus únicos amigos… No entanto, demandaram o túmulo, quando eu era simplesmente um jovem enfermo… Separado de minha mãe, vi-me entregue aos desajustes orgânicos… Logo após, meu irmão Henrique não hesitou em declarar-me incapaz… Por direito à herança, cabiam-lhe grandes bens, contudo, prevalecendo-se do meu infortúnio o mano obteve da Justiça, com meu próprio assentimento, a documentação com que se fazia meu tutor… Bastou, porém, a consecução dessa medida, para que se transformasse para mim num verdugo cruel… Apossou-se-me de todos os recursos… Internou-me num hospício, em que amarguei longos anos de isolamento… Sofri muito… Alimentei-me com o pão recheado de fel, destinado pelo mundo aos que lhe penetram as portas como réprobos do berço, porque o desequilíbrio mental me perseguia desde a idade mais tenra… Quando algo melhorado, fui constrangido a deixar o manicômio. Recorri-lhe à porta, mas expulsou-me sem compaixão… Fiquei apavorado, vencido… Ó meu Deus, como escarnecer assim de um irmão doente e infeliz? Debalde impetrei socorro à Justiça. Legalmente, Henrique era o único senhor dos haveres de nossa casa… Envergonhado, busquei outros climas… Tentei o trabalho digno, mas apenas obtive, em meu favor, a profissão de vigia noturno, passando a rondar vasto edifício comercial, amparado por um homem caridoso, condoído de minha fome… O frio da noite, porém, encontrava-me ao desabrigo e, a breve tempo, adquiri uma febre insidiosa que passou a devorar-me devagarinho… Não sei quanto tempo estive, assim, chumbado a indefinível desânimo… Certa feita, caí fatigado sobre a poça de sangue que se me derramava da boca e criaturas piedosas me angariaram o leito em que me refugio…
— E que opinião mantém você, acerca de Henrique? Lembra-se dele com mágoa?
Qual se mergulhasse a memória em ondas de enternecimento e saudade, Leo deixou que as lágrimas se lhe entornassem dos olhos, em dolorosa quietude mental.
Em seguida, monologou por dentro:
— Pobre Henrique!… Não deverei, antes, lastimá-lo? Acaso, não deverá ele igualmente morrer? de que lhe terá valido a apropriação indébita se será também um dia alijado do corpo? por que me reportaria a perdão, se ele é mais infeliz que eu mesmo?
E, tornando a pousar os olhos na figura do Cristo, continuou:
— Jesus, escarnecido e espancado, esqueceu ofensas e deserções… Içado à cruz, não clamou contra os amigos que o haviam lançado à humilhação e ao sofrimento… Não teve uma palavra de censura para os truculentos algozes… Ao invés de incriminá-los, pedira ao Pai Celeste amorosa proteção para todos… E Jesus foi o Embaixador de Deus entre os homens… Com que direito julgarei, assim, meu próprio irmão, se eu, alma necessitada de luz, não posso penetrar os Divinos Juízos da Providência?
Aquietara-se Leo em pranto, buscando internar a mente no templo de amor da prece.
A humildade a que se recolhia tocava-me o coração.
Ergui-me de olhos úmidos.
Para sondar-lhe a grandeza dalma, não seria preciso alongar o interrogatório.
Hilário, que se mostrava comovido até às lágrimas, desistiu de qualquer consulta, apenas inquirindo ao Assistente se o agonizante estava reencarnado sob os auspícios da Mansão, ao que Silas informou, prestativo:
— Sim, Leo vive tutelado por nossa, casa. Aliás, temos algumas centenas de criaturas que, não obstante materializadas na carne, permanecem ligadas à nossa instituição pelas raízes dos débitos a que se prendem, geralmente todas elas em estágios difíceis de regeneração, porque delinquentes em reajuste. Renascem no mundo sob a guarda de nosso estabelecimento socorrista, mas naturalmente ainda enleadas, de certo modo, aos parceiros do pretérito, com cuja influência tomam contato, consolidando as qualidades morais de que necessitam, através dos conflitos interiores que podemos classificar como sendo a forja da tentação.
— Como é belo apreciar o amor paternal de Deus que a tudo atende no lugar próprio!… — clamou Hilário.
— Sem dúvida — considerou Silas, sensatamente —, a Lei de Deus determina o progresso e a dignidade para todos. Sabem vocês que, via de regra, os desencarnados que se asilam na Mansão constituem grande ajuntamento de criminosos e viciados…
E, modificando a inflexão de voz, acrescentou:
—… como eu mesmo. Ali recebemos atenção e carinho, assistência e bondade, reeducando-nos, às vezes, por muitos anos… Contudo, é imperioso observar que, recolhendo a generosidade dos benfeitores e instrutores que nos garantem aquele pouso de amor, apenas acumulamos débitos com a proteção imerecida, compromissos esses que precisamos resgatar, igualmente em serviço ao próximo. Todavia, a fim de que nos habilitemos para as tarefas do bem genuíno, é imprescindível purgar a nossa condição inferior, agravada na culpa, porquanto o conhecimento elevado, adquirido em nossa organização, vale mais como teoria nobilitante, que nos cabe substancializar na prática correspondente, para que se incorpore, em definitivo, ao nosso patrimônio moral. Eis por que, depois do aprendizado breve ou longo em nosso instituto, somos novamente internados na esfera da carne e, aí, é óbvio que, apesar de protegidos por nossos mentores, deveremos sofrer a aproximação dos antigos comparsas de nossos delitos, para demonstrar aproveitamento e assimilação do amparo recebido.
Ao nosso lado, porém, Leo contava os derradeiros minutos no veículo denso e notamos que o Assistente não desejava ausentar-se do caso dele, para que lhe guardássemos a lição.
Talvez por isso mesmo, Silas ministrou-lhe energias novas ao peito exausto, através de passes balsamizantes, falando-nos em seguida:
— Vocês ouviram as alegações mentais do companheiro que se despede…
Hilário, que ardia de curiosidade, tanto quanto eu faminto de novas elucidações, indagou, reverente:
— Em que ponto será lícito considerar a presente desencarnação de Leo como débito expirante?
Nosso interlocutor fixou expressivo gesto e informou:
— Decerto, não me reportarei à conta integral de nosso amigo, perante a Lei. Não disponho pessoalmente de recursos informativos para relacionar-lhe as dívidas e créditos no tempo. Referir-me-ei, por isso, tão somente à culpa que o atormentava, quando ingressou em nossa casa, segundo os apontamentos que lá poderemos compulsar.
O agonizante agora, de nervos asserenados pelo socorro magnético, parecia quase ouvir-nos.
Sustentando-lhe a fronte suarenta, Silas, atencioso, prosseguiu, depois de leve pausa:
— Leo enfileirou mentalmente para nós as amargas recordações dos dias recentes que tem vivido, detendo-se particularmente na enfermidade que o martiriza desde o berço, nos tormentos do hospício e na dureza de um irmão que o sentenciou à extrema penúria… Vejamos, porém, a razão das dores com que pune a si mesmo e porque mereceu a felicidade de ressarcir para sempre o débito particular, agora na pauta de nosso estudo… Em princípios do século passado, era ele filho dileto de abastados fidalgos citadinos que, desencarnados muito cedo, lhe confiaram o próprio irmão doente, o jovem Fernando, cuja existência fora marcada por incurável idiotia. Ernesto, no entanto — pois era esse o nome de nosso Leo, na existência última —, tão logo se viu sem a presença dos genitores, deu-se pressa em alijar o irmão do seu convívio, cioso do governo total sobre a avantajada fortuna, de que ambos se faziam herdeiros. Além disso, moço habituado aos saraus do seu tempo, estimava as recepções esmeradas, nas quais o palacete da família descerrava as portas brasonadas às relações elegantes, e, orgulhoso da paisagem doméstica, envergonhava-se de ombrear com o irmão, por ele proibido de comparecer aos seus ágapes sociais. Todavia, porque Fernando, mentecapto, não lhe atendesse às ordens, em razão da incapacidade de apreendê-las, providenciou gradeada prisão, ao fundo da residência, onde o rapaz enfermo foi excluído da comunidade familiar. Encarcerado e sozinho, desfrutando apenas a intimidade de alguns escravos, Fernando passou a viver engaiolado, qual se fora infeliz animal. Enquanto isso, Ernesto, casado, dava largas aos caprichos da mulher, em extensas viagens de recreio, nas quais desperdiçava seus bens, em jogatinas e extravagâncias. Depois de algum tempo, esgotado nas finanças de que podia dispor, apenas conseguiria reequilibrar-se por morte do mano irresponsável; no entanto, o jovem mentalmente enfermo dava mostras de grande fortaleza física, não obstante certa bronquite crônica que muito o incomodava. Observando-lhe o desequilíbrio respiratório, Ernesto planejou levá-lo a moléstia mais grave, na esperança de remetê-lo com rapidez ao sepulcro, recomendando aos servos que o libertassem, todas as noites, num grande pátio, em que Fernando repousasse ao relento. O moço, porém, denotava enorme resistência e, embora sofresse consecutivas crises de sua moléstia, assim exposto à intempérie, durante quase dois anos superou valorosamente a provação a que fora submetido. Entrementes, padecia Ernesto o cerco de angústia econômica sempre mais grave, que somente o quinhão amoedado de Fernando, entregue ao comando de velhos amigos, conforme a vontade paterna, poderia solucionar. Em razão disso, envilecido pela fome de ouro, certa noite liberou dois escravos delinquentes, algemados em seu domicílio, sob a condição de se exilarem para terras distantes e, após vê-los partir, sob o nevoeiro da madrugada, buscou o leito do irmão, enterrando-lhe um punhal no peito inerme… Na manhã seguinte, ante o choro dos servos, a lhe mostrarem o cadáver, fê-los admitir que os cativos fujões teriam sido os autores do crime e, inocentando-se com astúcia, entrou na posse dos bens que pertenciam ao morto, com plena aprovação dos magistrados terrestres. Foi assim que, apesar de regalada existência na carne, ao aportar no além-túmulo atravessou extensa faixa de expiações. Fernando, o irmão desditoso, com absoluta magnanimidade esqueceu-lhe as ofensas; no entanto, vergastado pelos remorsos, Ernesto entrou em comunhão com impassíveis agentes da sombra, que o fizeram presa de inomináveis torturas, por se ,recusar a segui-los nas práticas infernais. Conservando no imo dalma a lembrança da vítima, através da percussão mental do arrependimento sobre os centros perispiríticos, enlouqueceu de dor, vagueando por vários lustros, em tenebrosas paisagens, até que, recolhido à nossa instituição, foi convenientemente tratado para o reajuste preciso. Não obstante recuperado, porém, as reminiscências do crime absorviam-lhe o espírito de tal sorte que, para o retorno à marcha evolutiva normal, implorou o regresso à carne, a fim de experimentar a mesma vergonha, a mesma penúria e as mesmas provas por ele infligidas ao irmão indefeso, pacificando, desse modo, a consciência intranquila. Amparado em seus propósitos de resgate por eminentes instrutores, tornou ao campo físico, carreando na própria alma os desequilíbrios que assimilou além do sepulcro, com os quais renasceu alienado mental, como o próprio Fernando no passado recente, tendo amargado, na posição de Leo, todos os infortúnios por ele impostos ao irmão debilitado e infeliz. Ressurgiu, dessa forma, na esfera carnal, desditoso e doente. Cedo conheceu a orfandade, foi colhido de surpresa pela secura e vilania de um irmão insensato que o ilhou no ambiente sombrio de um manicômio e, para não faltar particularidade alguma ao quadro expiatório, padeceu como guarda-noturno o frio e os temporais a que expusera a vítima indefesa… Entretanto, pela humildade e paciência com que tem sabido aceitar os golpes reparadores, conquistou a felicidade de encerrar em definitivo o débito a que nos reportamos.
Porque emudecesse o orientador, preocupado em atender ao agonizante, então banhado pelo suor característico da morte, Hilário indagou:
— Assistente, como entender que o nosso companheiro está liquidando a dívida a que se refere?
— Pois não veem? — observou Silas, admirado. E, indicando a grande hemoptise que começava, ajuntou:
— Qual Fernando, que desencarnou com o tórax perfurado por lâmina assassina, Leo igualmente se despede do corpo com os pulmões em frangalhos. Contudo, pelo procedimento correto que adotou perante a Lei, atravessa o mesmo suplício, mas no leito, sem escândalos destrutivos, embora esteja vertendo o próprio sangue pela boca, tal qual sucedeu ao mano espezinhado e vencido. Cumpre-se o aresto da Justiça, apenas com a diferença de que, em vez do gládio de ferro, temos aqui batalhões de bacilos assassinos…
Talvez porque nos visse o assombro, ante a lição, ocupado embora na assistência ao moribundo, rematou com grave tom de voz:
— Quando a nossa dor não gera novas dores e nossa aflição não cria aflições naqueles que nos rodeiam, nossa dívida está em processo de encerramento. Muitas vezes, o leito de angústia entre os homens é o altar bendito em que conseguimos extinguir compromissos ominosos, pagando nossas contas, sem que o nosso resgate a ninguém mais prejudique. Quando o enfermo sabe acatar os Celestes Desígnios, entre a conformação e a humildade, traz consigo o sinal da dívida expirante…
Silas, contudo, não pôde continuar.
Leo, em oração, debatia-se nos estertores da morte.
O Assistente enlaçou-o, com carinhoso enternecimento e exorou o Amparo Divino, como se o doente desventurado lhe fosse um filho do coração.
Envolvido nas irradiações suaves da prece, Leo adormeceu, diante de nossas lágrimas.
Porque perguntássemos quanto ao motivo pelo qual não o arrebataríamos, de imediato, ao vaso cadavérico, para transportá-lo conosco à Mansão, o Assistente informou-nos, conciso:
— Não dispomos de autoridade para desligá-lo do corpo. Semelhante responsabilidade não nos compete.
E, comunicando aos vigilantes que missionários da libertação viriam, em breves horas, em socorro do companheiro que descansava, meditativo e emocionado propôs-nos regressar à Mansão.
Emmanuel - Livro Paz e Renovação - Espíritos Diversos / Chico Xavier - Cap. 38
Agradeçamos a Deus
Necessário conservar o coração agradecido a Deus para que as aflições não nos deteriorem os sentimentos.
Para isso, é forçoso procurar o lado melhor das cousas e ocorrências, a outra face das pessoas e circunstâncias.
Em muitos episódios da nossa caminhada na Terra, porque a provação nos visite, afundamo-nos em desânimo, todavia, em nos apercebendo com segurança quanto à significação disso, compreendemos para logo que a provação é alavanca psicológica, sem a qual não solucionaríamos as dificuldades alheias.
Certas afeições, no mundo, nos abandonam em caminho, amarfanhando-nos o Espírito, no entanto, que seria de nós se determinados laços possessivos nos detivessem o coração, indefinidamente?
Empeços materiais persistem conosco, por tempo enorme, contudo, acabamos notando que sem eles, quase sempre, ser-nos-ia impraticável a consolidação do equilíbrio espiritual.
A decepção trazida por um amigo é razão para grande sofrimento, entretanto, a pouco e pouco, reconhecemos que a decepção, no fundo, não existe, de vez que a ruptura de certas relações se traduz por transitório desnível, através do qual se rompem hoje tarefas abraçadas em comum para se refazerem, de futuro, em novas condições de harmonia e de rendimento no bem de todos.
O bisturi do cirurgião é suscetível de inquietar-nos a vida mas retira de nós aquilo que pode induzir-nos à morte prematura.
Saibamos agradecer ao Senhor os dons de que fomos aquinhoados.
Dor é aviso, obstáculo é medida de resistência, desilusão é reajuste, contratempo é lição. Se sabemos aceitá-los, transformam-se-nos sempre em dispositivos para a obtenção da felicidade maior.
Isso ocorre, porque, na maioria das ocasiões, os desapontamentos nada mais são que oportunidades a fim de que as nossas emoções se façam respostas na órbita de nossos deveres ou para que os nossos raciocínios se recoloquem na direção de Deus.
Chico Xavier - Livro O médium dos pés descalços - Carlos A. Baccelli - Cap. 71
A vinda de Jesus a Terra
Muita coisa que Chico nos contava não está nos livros, ou seja, os amigos espirituais não abordaram nas obras de sua lavra.
O fato é que Chico sabia muito mais que os livros nos transmitiram. Infelizmente, ele regressou à pátria espiritual sem encontrar receptividade para efetuar maior semeadura de conhecimento entre nós.
Numa oportunidade, ele nos disse que era para Jesus ter nascido entre os druidas, nas Gálias. Todavia, o plano inicial para a sua vinda à Terra teve que ser alterado.
É que pressentindo a sua encarnação as falanges das trevas se movimentaram e na tentativa de impedir que ele viesse inspiraram o imperador romano Júlio César a invadir e conquistar as Gálias.
- E vocês sabem, - disse-nos – quando um povo dominava outro, os homens adultos eram mortos e os conquistadores ficavam com as suas mulheres... Então, o patrimônio genético do povo das Gálias, que, há séculos, vinha sendo preparado para receber os mensageiros do Cristo, e ele mesmo, mais tarde sofreu profunda desarmonia.
- Os planos, então, tiveram que ser modificados e Jesus, que nasceria nas Gálias, foi nascer na Galileia, que é diminutivo de Gália! Vejam os seus cabelos longos, à nazarena, se não eram parecidos com os cabelos de um francês – os dele e os dos apóstolos também?
Fazendo uma pausa, arrematou:
- O mesmo ia acontecendo com Allan Kardec e todos aqueles espíritos que vieram fazer o movimento do iluminismo... Foi por tal motivo que o Plano Espiritual inspirou Joana D’arc para que a França não fosse subjugada pela Inglaterra, pois, caso contrário, mais uma vez, a história se repetiria... Se os ingleses tivessem conquistado a França, na chamada “Guerra dos cem anos”, os planos para a codificação da Doutrina teriam ficado comprometidos. Joana D’arc preservou o patrimônio genético do povo francês, possibilitando a reencarnação daqueles espíritos, inclusive a de Allan Kardec!
Joanna de Ângelis - Livro Florações Evangélicas - Divaldo P. Franco - Cap. 47
Marco divisório
"Ninguém, tendo posto a mão ao arado e olhando para trás, é apto para o reino de Deus". (Lucas 9:62)
"Meus amigos, agradecei a Deus o haver permitido que pudésseis gozar a luz do Espiritismo". Paulo - (O Evangelho Segundo o Espiritismo, Capítulo 15º - Item 10, § 2)
Houve na Roma antiga um templo dedicado a Jano, que durante um milênio somente fechou as suas portas nove vezes, correspondentes aos períodos em que a República esteve em paz.
O deus singular era representado com duas faces, o que o tornou conhecido como bifronte, atributo conseguido de Saturno, a quem favorecera, e que o dotara com a capacidade de penetrar o passado e o futuro, conforme narra a mitologia, ao se referir ao mais antigo rei do Lácio conhecido,
Utilizamo-nos da lenda para considerar a visão cristã como possuidora da possibilidade de examinar o passado e o futuro, ensejando valiosas meditações.
Em Saulo, o jovem atormentado, que se fizera sicário, dormitava aquele Paulo que, abrasado por Jesus, se tornou o arauto da Boa Nova por todas as terras da antiguidade.
Em Jeziel, o israelita pulcro e sofrido, se encontrava em potencial o- nobre Estevão, que se faria o excelso mártir da Mensagem nascente, abrindo os braços de encorajamento na direção do futuro.
Em Madalena, a mulher obsidiada e trôpega nas aspirações morais, vivia enclausurada a impoluta faculdade de amar até o sacrifício, doando-se à Causa do Cristo com abnegação dificilmente encontrada.
Em Simão, temeroso e reticente, vibrava o apóstolo Pedro, que se entregaria à fé rutilante, após o sacrifício de Jesus, de modo a selar com sangue a audácia de porfiar fiel até o fim, na expansão do Reino de Deus entre as criaturas de Roma.
Em Joana de Cusa, a matrona romana, se agitava a discípula fiel que doaria a vida às labaredas pela honra de ser fiel ao Mestre.
Era como se o passado de dificuldades e viciações argamassasse o futuro com o cimento divino do amor, transformando-se em base de sustentação aos grandes investimentos da luz na direção do Infinito.
No passado, queixas, lamentos, enfermidades, dissensões.
No futuro, esperanças, gratidão, saúde e paz.
Ontem, óbice, desânimo, perturbação, agonia.
Amanhã, aptidão, alento, ordem, serenidade.
Antes, o espírito alquebrado e o coração ralado de dores e ansiedades incontáveis.
Depois, o ser renovado pela mente voltada ao dever e os sentimentos cantando júbilos.
A Doutrina Cristã é o templo da fé aberto perenemente, facultando a paz e acolhendo o amor.
E o Espiritismo que no-la traz de volta, na atualidade, é o grande hoje, marco divisório dos tempos que separam o antes e o depois do encontro com Jesus.
Por essa forma, se as tuas aspirações superiores ainda não se converteram em flores de alegria e as ásperas batalhas teimam por manter-te nos embates duradouros não desfaleças.
O passado de sombras para ser vencido necessita de ser retificado e os abusos agasalhados demoradamente requerem disciplina espartana para serem superados.
Importa considerar que já não és o que eras, nem sentes o que sentias, embora, não poucas vezes, o assédio do hábito te atormente as pausas de equilíbrio.
Examina o passado para verificação do que te compete refazer, mas não te fixes nele.
Prepara o futuro através de atitudes corretas mas não te angusties pela chegada dele.
Vence a hora de cada hora, realizando o que possas, através de como possas, lidando infatigável na república do espírito em atribulação.
Os acontecimentos vividos são experiências para as realizações a viver.
Jesus é o teu divisor de águas.
Kardec é o condutor do teu amanhã. Eleva-te ao Mestre através do Seu apóstolo moderno e fecha às paixões o templo da tua alma, em caráter definitivo, aspirando à glória do Mundo Maior que a todos nos espera.
Meimei - Livro Cartas do Coração - Espíritos Diversos / Chico Xavier - 1ª Parte - Cap. 68
No caminho
Plantemos flores onde repontem, ameaçadores, espinheiros agrestes.
Lancemos a mensagem do bem, onde o mal procura envolver situações, criaturas e coisas, estabelecendo aflições inúteis.
Estendamos os recursos da amizade leal, onde a discórdia tente consolidar o escuro domínio que lhe é próprio.
Auxiliemos com o nosso concurso irmão, onde a leviandade desajuda.
Façamos da solidariedade a bandeira de nossa marcha permanente para diante, dentro da nossa sede de progresso, porque, em verdade, somente a compreensão, a tolerância e a fraternidade, com o perdão e o amor por normas inalteráveis de serviço, conseguem efetivamente amparar, lenir, soerguer e salvar.
Meimei - Livro Sentinelas da Alma - Chico Xavier - Cap. 5
Agradeçamos
Sabemos que a nossa mente, para evoluir, sofre processos de transformação por vezes violentos e rudes, qual acontece à terra necessitada de amanho para produzir.
Nos círculos da natureza, observamos o arado, vergastando o solo e ferindo-o, e se a grande massa rochosa aparece, de improviso, impedindo o esforço do lavrador, notamos que a dinamite comparece, estilhaçando os obstáculos…
Assim também nossa inteligência não se modifica sem a visitação da dificuldade.
A lâmina dos problemas inquietantes como que nos tortura, dia a dia, constrangendo-nos à compreensão mais justa da vida e se o endurecimento espiritual é a nota de nossas reações, ante a passagem da máquina renovadora do sofrimento, surgem os impactos diretos da provação sobre a nossa experiência pessoal, desintegrando-nos antigas cristalizações no egoísmo e no orgulho.
Ofereçamos o coração ao Divino Cultivador que é Jesus.
Digne-se o Mestre Divino fazer de nossa existência o que lhe aprouver.
Os golpes sublimes da Vontade Superior sobre os nossos desejos serão recursos do máximo proveito para o nosso próprio futuro.
Se a dor nos procura, em forma de incompreensão do meio ou na máscara de tristes desilusões terrestres, abençoemo-la, acentuando a nossa fé viva em Nosso Senhor e continuemos servindo ao próximo, na medida de nossas possibilidades, porque a dor é realmente a Sábia Instrutora, capaz de elevar-nos da Terra para os Céus.