terça-feira, 12 de outubro de 2021

J. Herculano Pires - Livro O Homem Novo - Cap. 8 - O homem novo




J. Herculano Pires - Livro O Homem Novo - Cap. 8


O homem novo


Para construir um mundo novo precisamos de um homem novo. O mundo está cheio de erros e injustiças porque é a soma dos erros e injustiças dos homens. Todos sabemos que temos de morrer, mas só nos preocupamos com o viver passageiro da Terra. Por isso, a humanidade desencarnada que nos rodeia é ainda mais sofredora e miserável que a encarnada a que pertencemos. "As filas de doentes que eu atendia na vida terrena - diz a mensagem de um espírito - continuam deste lado."

Muita gente estranha que nas sessões espíritas se manifestem tantos espíritos sofredores. Seria de estranhar se apenas de manifestassem espíritos felizes. Basta olharmos ao nosso redor - e também para dentro de nós mesmos - para vermos de que barro é feita a criatura humana em nosso planeta.

Fala-se muito de fraude e mistificação no Espiritismo, como se ambas não estivessem em toda parte, onde quer que exista uma criatura humana. Espíritos e médiuns que fraudam são nossos companheiros de plano evolutivo, nossas colegas de fraudes cotidianas.

O Espiritismo está na Terra, em cumprimento à promessa evangélica de Consolador, para consolar os aflitos e oferecer a verdade aos que anseiam por ela. Sua missão é transformar o homem para que o mundo se transforme. Há muita gente querendo fazer o contrário: mudar o mundo para mudar o homem. O Espiritismo ensina que a transformação é conjunta e recíproca, mas tem que começar do homem. Enquanto o homem não melhora, o mundo não se transforma.

Inútil, pois, apelar para modificações superficiais. Temos de insistir na mudança essencial de nós mesmos.

O homem novo que nos dará um mundo novo é tão velho quanto os ensinos espirituais do mais remoto passado, renovados pelo Evangelho e revividos pelo Espiritismo. Sem amor não há justiça e sem verdade não escaparemos à fraude, à mistificação, à mentira, à traição. O trabalho espírita é a continuação natural e histórica do trabalho cristão que modificou o mundo antigo. Nossa luta é o bom combate do apóstolo Paulo: despertar as consciências e libertar o homem do egoísmo, da vaidade e da ganância.

"Os anos não nos dão experiência nem sabedora - dizia o vagabundo de Knut Hamsun - mas nos deixam os cabelos horrorosamente grisalhos." É o que vemos no final desse poema bucólico da Noruega que é "Um Vagabundo Toca na Surdina". Knut Hamsun era individualista e sobretudo um lírico do individualismo. Mas o homem que se abre para o altruísmo sabe que as verdades do indivíduo são geralmente moedas falsas, de circulação restrita. A verdade maior - ou verdadeira - é a que nasce do contexto social, da usina das relações, onde o indivíduo se forma pelo contato com os outros.

Os anos não trazem apenas os cabelos brancos - trazem também a experiência, mestra da vida, e com ela a sabedoria. É no dia a dia da existência que o homem vai modelando aos poucos a sua própria argila, o barro plástico de que Deus formou o seu corpo na Terra. Cada idade, afirmou Léon Denis, tem o seu próprio encanto, a sua própria beleza. É belo ser jovem e temerário, mas talvez seja mais belo ser velho e prudente, iluminado por uma visão da vida que não se fecha no círculo estreito das paixões ilusórias. O homem amadurece com o passar dos anos.

A vida tem as suas estações, já diziam os romanos. À semelhança do ano, ela se divide nas quatro estações da existência que são: a primavera da infância e da adolescência, o verão da mocidade e outono da madureza e o inverno da velhice. Mas também à semelhança dos anos, as vidas se encadeiam no processo da existência, de maneira que as estações se renovam em cada encarnação.

Viver, para o individualismo, é atravessar os anos de uma existência. Mas viver, para o altruísta, é atravessar as existências palingenésicas, as vidas sucessivas, em direção à sabedoria. O branquear dos cabelos não é mais do que o início das nevadas do inverno. Mas após cada inverno voltará de novo a primavera.

A importância dos anos é, portanto, a mesma das léguas numa caminhada em direção ao futuro. Cada novo ano que surge é para nós, os caminheiros da evolução, uma nova oportunidade de progresso que se abre no horizonte. Entremos no ano novo com a decisão de aproveitá-lo em todos os seus recursos. Não desprezemos a riqueza dos seus minutos, das suas horas, dos seus dias, dos seus meses. Cada um desses fragmentos do ano constitui uma parte da herança de Deus que nos caberá no futuro.


J. Herculano Pires





VÍDEO:

HERCULANO PIRES - Um convite para o futuro
J. Herculano Pires





Filme do cineasta Edson Audi sobre a vida, a obra e o pensamento de J. Herculano Pires (1914 – 1979), o maior filósofo espírita e principal tradutor de Allan Kardec para o português. Inclui depoimentos de Audálio Dantas, Dora Incontri, Germana Garilli, Herculano Ferraz Pires, Júlia Nezu, Maria Virgínia, Marilia Pires Ward, Heloisa Pires, Paulo Henrique de Figueiredo, Sérgio Aleixo, Wilson Garcia.

José Herculano Pires manteve, durante muitos anos, no jornal “Diário de São Paulo”, órgão dos Diários e Emissoras Associados, uma coluna de crônicas espíritas, na qual abordava temas de interesse geral relacionados com a doutrina codificada por Allan Kardec.  Assinava-as com o pseudônimo de Irmão Saulo.

Destacamos algumas crônicas interessantes do autor, publicadas entre os anos 1969/1970.

Jornalista, filósofo, escritor e professor, Herculano Pires alcançou grande conceito dentro e fora do movimento espírita. Sua produção literária ultrapassa aos oitenta títulos; alguns deles constituem-se verdadeiras obras filosóficas

Herculano dedicou a maior parte de sua existência em favor da Doutrina Espírita, seja buscando interpretá-la com fidelidade, seja defendendo-a dos ataques dos adversários.




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