sexta-feira, 31 de maio de 2024

Neio Lúcio - Livro Colheita do Bem - Mensagens familiares do Prof. Arthur Joviano / Chico Xavier - Cap. 12 - Amealhar pão espiritual



Neio Lúcio - Livro Colheita do Bem - Mensagens familiares do Prof. Arthur Joviano / Chico Xavier - Cap. 12


Amealhar pão espiritual


15/06/1949

Meus caros filhos, Deus abençoe a vocês todos, conferindo-lhes muita paz ao coração.

Com a minha afetuosa visita de sempre, trago-lhes os meus cumprimentos pela vitória contra a gripe. Felizmente, Wanda venceu galhardamente a crise do resfriado. Tive receio de que a gripe de caráter menos benigno que atacou o grupo, de modo geral, nos impusesse, desta vez, maiores preocupações. Felizmente, a Bondade Divina, por intermédio de Seus emissários, nos auxiliou a todos, permitindo-nos a satisfação de vê-los depressa refeitos, altamente receptivos, no serviço da própria recuperação. Atualmente, a luta da esfera em que evoluímos é muito intensa no sentido de socorro preventivo.

Os remanescentes da guerra última são quais nuvens miasmáticas, espalhando aqui e ali fluidos de enfermidades e desânimo através de entidades aos milhares que vagueiam, quase sem rumo, chumbadas magneticamente ao solo do planeta. Vocês perguntarão pela assistência e têm razão. Assim como a cidade grande possui, invariavelmente, os seus postos avançados de socorro imediato, também, por nossa vez, dispomos de extensos recursos nesse particular, entretanto, apesar de todos os esforços do Plano superior, os obstáculos são grandes contra a generalização do auxílio. Quando a mente mais ou menos evoluída teima em não receber a nossa colaboração, debalde tentaremos impor o nosso concurso fraternal.

Poderão ajuizar sobre o assunto pensando na situação de vocês mesmos. Realmente, possuem vocês, no presente, remédio eficiente e seguro para muitos males, todavia, raros aceitar-lhes-iam a cooperação espontânea. Vocês e nós somos compelidos a amealhar pão espiritual, água viva de revelação e medicamento curativo da alma em reservatórios públicos de ideias, que são as mensagens entregues ao espírito geral para que as almas deles se apropriem quando julguem conveniente a própria adesão ao movimento de melhoria e elevação que lhes diz respeito. Dessa forma, também temos aqui aperfeiçoados serviços de socorro certo e eficaz, entretanto, devemos esperar que a lei se cumpra em cada alma que deseje sinceramente elevar-se.

O que mais impressiona no quadro do mundo moderno não são, porém, as moléstias espetaculares do corpo físico, para as quais sempre podemos recorrer à higiene ou à medicina, em qualquer caso. O que nos confrange a alma é sentir o amadurecimento dos homens para os benefícios da espiritualidade superior e vê-los no sentido coletivo completamente confiados ao conúbio com as forças mesquinhas e destrutivas. O desequilíbrio é enorme!

As enfermidades ocultas do desânimo, da perturbação indefinida, da derrota prematura, da incapacidade imaginária, em vários aspectos de desequilíbrio mental, assolam a vasta e respeitável casa humana e grandes instituições, em nossa Esfera, se arregimentam para prevenir medicação espiritual adequada contra as “epidemias psíquicas” de loucura.

Os desencarnados em posição idêntica ou mais baixa que a do homem comum se movimentam em todas as direções e ameaçam a estabilidade das próprias nações.

O mundo, na expressão representativa da civilização, não pretende afeiçoar-se a semelhante verdade, todavia, o clima na Terra atual, o clima do espírito, é difícil de alimentar os corações mais esclarecidos e mais sensíveis. 

Se o homem, considerado em bloco, entendesse a herança de dor que ele próprio atrai pelo olvido e indiferença diante das leis sublimes que nos regem os destinos, outras seriam as condições do planeta, mas “o lavrador colherá em todo tempo o que houver semeado e pelo plantio a que se devotarem as criaturas as colheitas dos anos próximos serão cada vez mais complexas em motivos de aflições purificadoras”.

Creiam vocês que estamos vivendo grandes dias. Dias de muita gravidade e de muita expectação para quantos já conseguiram se desviar das zonas mais fundas do vale, na direção dos montes. Que Jesus nos proteja e fortaleça, preparando-nos não só as forças da paciência, mas também as fibras para lutar com denodo e serenidade.

Infelizmente, não nos foi possível trazer o nosso amigo Gudesteu aos trabalhos espirituais. n Francamente, ele poderia, sem dúvida, vir a conversar pelo lápis, entretanto, sem perceber, vocês revestiram a ação na fé com carregadas tintas de responsabilidade. Não é com facilidade que devemos abrir a porta para as sugestões mesmo de ordem espiritual que nos visitam, porque, antes de tudo, agora, é preciso saber que qualidade de material estamos fornecendo ao pensamento dos outros.

Não se achando o nosso estimado amigo em condições de escrever, consolando e edificando, de maneira substancial aos entes amados que ficaram, qualquer carta que viesse grafar traria dificuldades em consequência. 

Ah! Se todos pudéssemos e, em muitas circunstâncias, se todos quiséssemos preparar a longa e inevitável viagem, outros aspectos assumiriam entre os homens os inquietantes problemas da morte. 

Sabem vocês hoje, tanto quanto eu, como é difícil dar e receber em matéria de fé raciocinada e vivificante. Agradeçamos as bênçãos que estamos entesourando nas almas. Cada conhecimento novo, cada estudo meditado na revelação divina, cada serviço na crença representa tijolos espirituais na casa do porvir.  

Abençoados sejam vocês que têm sabido conservar o dom da confiança no Altíssimo. Quem confia no Senhor nunca sofre desapontamento, porque o desencanto e a amargura pertencem aos círculos dos homens, simplesmente. Que a Divina Bondade nos auxilie cada vez mais na recepção das oportunidades preciosas de iluminação que temos recebido.

Continuem cuidadosos com o equilíbrio orgânico, sem esquecerem, de pronto, os antigripais. O tempo experimenta grande variabilidade e o instrumento físico de que vocês dispõem é um só, sem possibilidades de substituição apressada. Um corpo é um tesouro que devemos gastar com prudência e veneração para não cairmos em surpresas desagradáveis.

Estive com você, meu caro Rômulo, nas horas de materializações em Juiz de Fora. Mais tarde, falaremos do assunto. Peço a Jesus para que vocês todos desfrutem muita saúde e alegria. A saúde é um vaso de luz e a alegria é um óleo de vida abundante. A luta terrestre exige ambas preciosidades para que se converta em mecanismo de interpretação da Vontade Divina.

Que o Senhor nos abençoe e ilumine cada vez mais. E reunindo-os num grande e carinhoso abraço, sou o papai muito amigo de sempre,


Neio Lúcio
(Arthur Joviano)












Emmanuel - Livro Há Dois Mil Anos… - Chico Xavier - 1ª Parte - Cap. 7 - As pregações do Tiberíade



Emmanuel - Livro Há Dois Mil Anos… - Chico Xavier - 1ª Parte - Cap. 7


As pregações do Tiberíade


Alguns dias haviam decorrido sobre os fatos que acabamos de narrar.

Em Cafarnaum, não somente o cenário, mas também os atores, guardavam a mesma fisionomia.

Compelido pela atitude irrevogável e enérgica do senador, Sulpício Tarquínius regressara a Jerusalém,  obedecendo às ordens de Pilatos que, por sua vez, recebera a notificação de Públio Lêntulus, referente à dispensa do lictor.

Não devemos esquecer que Públio permanecia na Palestina com poderes amplos, na qualidade de emissário de César e do Senado, a quem todas as autoridades da província, inclusive o governador, eram obrigados a acatar com especial atenção e máximo respeito.

O procurador da Judeia não se esquecera, portanto, de substituir Sulpício, do melhor modo possível, buscando conhecer, com interesse, os motivos do seu afastamento, assunto que o senador solucionou com o mais largo espírito de superioridade, do ponto de vista político. Pilatos coadjuvou, com a melhor boa vontade, o serviço de pesquisa, quanto ao paradeiro do pequeno Márcus, movimentando funcionários de sua inteira confiança, e vindo pessoalmente a Cafarnaum, a fim de conhecer na sua intimidade as diligências efetuadas.

O senador recebeu-lhe a visita com as mais altas mostras de consideração e aceitou-lhe a cooperação, sinceramente confortado, em vista de os acontecimentos desmentirem, perante o seu foro íntimo, as caluniosas acusações de que era vítima a esposa.

Sua vida doméstica, porém, sofrera as mais profundas alterações. Não sabia mais viver aquelas horas de colóquio feliz com a esposa, da qual o separava um véu de dúvidas amargas e infinitas. Várias vezes tentou, improficuamente, readquirir a antiga confiança e a sua espontaneidade afetiva.

Rugas de pesar vincaram-lhe então o semblante, ordinariamente altivo e orgulhoso, esfumando-lhe os traços fisionômicos num nevoeiro de preocupações angustiosas.

Todos os seus íntimos, inclusive a esposa, atribuíam ao desaparecimento do filhinho tão singular metamorfose.

Nas horas habituais das refeições, notava-se-lhe o esforço para desanuviar a fisionomia. Dirigia-se, então, à mulher ou respondia as suas perguntas carinhosas com monossílabos apressados, acentuando as palavras com laconismo incompreensível.

Sofrendo amargamente com aquela situação, Lívia apresentava-se cada vez mais abatida, tentando em vão decifrar o motivo de tantas provações e infortúnios.

Muitas vezes procurou sondar o espírito de Públio, de modo a levar-lhe um pouco de carinho e consolação, mas ele evitava as expansões afetuosas, com pretextos decisivos. Quase que lhe aparecia tão somente no triclínio e, feita a refeição costumeira, retirava-se, abruptamente, para o grande salão do arquivo, onde passava todas as suas horas de inquietadoras meditações.

De Márcus, nenhuma notícia havia, que lhe proporcionasse a mais ligeira sombra de esperança.

Por uma formosa manhã da Galileia, vamos encontrar Lívia em palestra íntima com a serva dedicada e amiga fiel, a quem replica nestes termos, depois de carinhosamente inquirida, acerca do seu estado de saúde:

— Sinto-me bem mal, minha boa Ana!… À noite, o coração bate-me descompassadamente e, hora-a-hora, vejo crescer-me no íntimo dolorosa impressão de amargura. Não poderia, bem definir meu estado, ainda que o quisesse… O desaparecimento do pequeno enche-me a alma de lúgubres presságios, multiplicando o peso das minhas aflições maternas quando não posso vislumbrar, nem de leve, a causa de tamanhos padecimentos…

E agora é, sobretudo, o estado de Públio o que mais me acabrunha. Ele foi sempre um homem puro, leal e generoso; mas, de algum tempo a esta parte, noto-lhe singulares diferenças no temperamento, agravando-se-lhe os sintomas doentios com maior intensidade, após o incompreensível desaparecimento do nosso filhinho.

A mim se me figura que ele vem sofrendo os mais fortes distúrbios sentimentais, com sérios prejuízos para a saúde…

— Bem vejo, senhora, quanto sofreis! — aventou a serva carinhosa. — Sei que sou uma criatura humilde e sem nenhum valor, mas pedirei a Deus que vos proteja incessantemente, restabelecendo a paz do vosso coração.

— Criatura humilde e sem valor? — diz a pobre senhora, buscando demonstrar-lhe o grau de sua estima sincera. — Não digas isso, mesmo porque não sou dessas almas que aferem o valor de cada um pelas posições que desfruta ou pelas honras que recebe.

Filha única de pais que me legaram considerável fortuna, cidadã romana, com as prerrogativas de mulher de um senador, vês quanto sofro nos trabalhos amargos deste mundo.

Os títulos que o berço me outorgou não conseguiram eliminar as provações que o destino também me trouxe, com a mocidade e a fortuna fácil.

Reconhece, pois, que, sendo eu patrícia e tu uma serva, não possuímos um coração diverso, mas sim o melhor sentimento de fraternidade, que nos abre a porta de uma compreensão carinhosa, a valer por asilo suave nos dias tristes da vida.

De mim para comigo, sempre supus, contrariamente à educação recebida, que todas as criaturas são irmãs, filhas de uma origem comum, sem conseguir atinar com as linhas divisórias entre aqueles que possuem muitos haveres e muitos títulos e os que nada possuem neste mundo além do coração, onde costumo localizar os valores de cada um, nesta vida.

— Senhora — exclamou a serva, tocada da mais grata surpresa —, vossas palavras me comovem, não somente por partirem dos vossos lábios, dos quais me habituei a ouvir-vos sempre com carinho e veneração, mas também porque o profeta de Nazaret nos tem dito a mesma coisa em suas prédicas.

— Jesus?!… — perguntou Lívia, de olhos brilhantes, como se aquela referência lhe lembrasse uma fonte de consolação, da qual se houvesse momentaneamente esquecido.

— Sim, minha senhora, e por falar nele, porque não buscardes um pouco de conforto nas suas divinas palavras? Juro-vos que as suas expressões, sábias e amorosas, vos consolariam no meio de todos os pesares, proporcionando-vos sensação de vida nova!… Se quisésseis, eu poderia conduzir-vos a casa de Simão, discretamente, a fim de receberdes o benefício de suas lições carinhosas. Receberíeis, assim, a alegria da sua bênção, sem vos expordes às críticas alheias, nutrindo o vosso coração dos seus luminosos ensinamentos.

Lívia pensou intensamente naquele alvitre, que se lhe figurava providência salvadora, respondendo, por fim:

— Os sofrimentos da vida muitas vezes me têm dilacerado o coração, renovando os meus raciocínios acerca dos princípios que me foram ensinados desde o berço, e é por isso que, acolhendo a tua ideia, acho de meu dever procurar a Jesus publicamente, como o fazem outras mulheres destes lugares.

Era minha intenção procurá-lo antes do nosso regresso a Roma, para lhe manifestar meu reconhecimento pela cura de Flávia, fato que me deixou profundamente impressionada, mas que não nos foi possível comentar, em razão da atitude hostil de meu marido; agora, novamente desamparada, no estuar das minhas dores, recorrerei ao profeta por obter um lenitivo ao coração opresso e torturado.

Mulher de um homem que, por força da sua carreira política, ocupa agora o mais alto cargo nesta província, irei a Jesus como criatura deserdada da sorte, em busca de amparo e consolação.

— Senhora, e vosso esposo? — perguntou Ana, antevendo as consequências daquela atitude.

— Procurarei cientificá-lo da minha resolução; mas, se Públio esquivar-se, ainda uma vez, à minha presença para um entendimento mais íntimo, irei mesmo sem ouvi-lo, com respeito ao assunto. Vestirei os trajes humildes desta região de criaturas simples, irei a Cafarnaum, hospedando-me com os teus parentes, nas horas necessárias, e, no momento das práticas, quero ouvir a palavra do Messias, de coração contrito e alma compadecida pelos infortúnios dos meus semelhantes…

Sinto-me profundamente insulada nestes últimos dias e tenho necessidade de conforto espiritual para o meu coração combalido nas provas ásperas.

— Senhora, Deus abençoe os vossos bons propósitos. Em Cafarnaum, os meus parentes são muito pobres e muito humildes, mas vossa figura está ali no santuário da gratidão de todos, bastando uma palavra vossa para que se ponham à vossa disposição, como escravos.

— Para mim não existe fortuna que se iguale a essa, da paz e do sentimento.

Não procurarei o profeta para solicitar-lhe atenções especiais, porque basta a sua caridade, no caso de minha filha, hoje sadia e forte, graças à sua piedade de justo, mas tão somente para buscar conforto ao meu coração dilacerado.

Pressinto que, em lhe ouvindo as exortações carinhosas e amigas, alcançarei energias novas para enfrentar as provações mais amargas e rudes.

Sei que ele me conhecerá nos trajes pobres da Galileia; todavia, na sua intuição divinatória, compreenderá que, dentro do peito da romana, pulsa um coração amargurado e infeliz.

As duas combinaram, então, ir juntas a cidade, na tarde do primeiro sábado.

Embalde, procurou Lívia uma oportunidade para solicitar a ambicionada permissão do marido, a favor da sua pretensão. Inúmeras vezes buscou, improficuamente, sondar o espírito de Públio, cuja frieza lhe afugentava a coragem para a necessária consulta.

Ela, porém, havia resolvido procurar o Mestre, de qualquer maneira. Abandonada numa região em que somente o marido podia compreende-la integralmente, dentro da sua esfera de educação, e rudemente provada nas fibras mais sensíveis da sua alma feminina, de esposa e mãe, a pobre senhora assim deliberou com pleno assentimento da sua consciência honesta e pura.

Talhou uma roupa nova, de conformidade com os usos galileus, de maneira a não se fazer notada na multidão comum nas prédicas do lago, e, cientificando a Comênio da necessidade que tinha de sair naquele dia, a fim de que o marido fosse avisado à hora do jantar, dirigiu-se, na data previamente determinada, pelos caminhos que já conhecemos, em companhia da serva de confiança.

Na residência humilde de pescadores, onde se abrigavam os familiares de Ana, Lívia sentiu-se envolvida em radiosas vibrações de serenidade, amiga e doce. Era como se o seu coração desalentado encontrasse uma claridade nova naquele ambiente de pobreza, de humildade e ternura.

A figura patriarcal do velho Simeão, de Samaria, porém, destacava-se a seus olhos entre todos os que a receberam com as mais elevadas demonstrações de carinhosa bondade. Do seu olhar profundo e das cãs veneráveis emanavam as doces irradiações da maravilhosa simplicidade do antigo povo hebreu, e a sua palavra, ungida de fé, sabia tocar os corações nas cordas mais sensíveis, quando narrava as ações prodigiosas do Messias de Nazaret.

Lívia, acolhida por todos com simpatia franca, parecia devassar um mundo novo, até então desconhecido na sua existência. Confortava-lhe, sobremaneira, a expressão de sinceridade e candura, daquela vida simples e humilde, sem atavios nem artifícios sociais, mas também sem preconceitos nem fingimentos perniciosos.

À tardinha, confundida com os pobres e os doentes que iam receber as bênçãos do Senhor, vamos encontrá-la de coração aliviado e sereno, esperando o momento ditoso de ouvir do Mestre uma palavra de amor e consolação.

O crepúsculo de um dia claro e quente emprestava um reflexo de luz dourada a todas as coisas e a todos os contornos suaves da paisagem. Encrespavam-se as águas mansas do Tiberíade ao sopro carinhoso dos favônios da tarde, que se impregnavam do perfume das flores e das árvores. Brisas frescas eliminavam o calor ambiente, espalhando sensações agradáveis de vida livre, no seio robusto e farto da Natureza.

Afinal, todos os olhares se dirigiam para um ponto escuro que se desenhava no espelho cristalino das águas, muito ao longe, no horizonte.

Era a barca de Simão, que trazia o Mestre para as dissertações costumeiras.

Um sorriso de ansiedade e de esperança clareou, então, todos aqueles semblantes que o aguardavam, no desconforto de seus sofrimentos.

Lívia reparou aquela turba que, por sua vez, também lhe notara a estranha presença. Operários humildes, pescadores rudes, mães numerosas em cujos rostos macerados se podiam ler as histórias amargas dos incríveis padecimentos, criaturas da plebe anônima e sofredora, mulheres adúlteras, publicanos gozadores da vida, enfermos desesperados e crianças numerosas, que traziam consigo os estigmas do mais doloroso desamparo.

Conservava-se Lívia ao lado do velho Simeão, cuja expressão fisionômica de firmeza e doçura inspirava o mais profundo respeito aos que se lhe aproximavam; e quantos lhe notavam o delicado perfil romano, enfiada na simplicidade do traje galileu, presumiam na sua figura alguma jovem de Samaria da Judeia, que tivesse vindo igualmente de longe, atraída pela fama do Messias.

A barca de Simão acostara brandamente à margem, ensejando a que o Mestre se dirigisse ao local costumeiro de suas lições divinas. Sua fisionomia parecia transfigurada em resplendente beleza. Os cabelos, como de costume, caíam-lhe aos ombros, à moda dos nazarenos, esvoaçando levemente aos ósculos cariciosos dos ventos brandos da tarde.

A esposa do senador não pôde mais despregar os olhos deslumbrados, daquela figura simples e maravilhosa.

Começara o Mestre um sermão de beleza inconfundível e suas palavras pareciam tocar os espíritos mais empedernidos, figurando-se que os ensinamentos ressoavam nas devesas de toda a Galileia, ecoando pelo mundo inteiro, previamente modelados para caminhar no mundo com a própria eternidade.

“Bem aventurados os humildes de espírito, porque a eles pertencerá o reino de meu Pai que esta nos Céus!…

“Bem aventurados os pacíficos, porque possuirão a Terra!…

“Bem aventurados os sedentos de justiça, porque serão saciados!…

“Bem aventurados os que sofrem e choram, porque serão consolados nas alegrias eternas do reino de Deus!…” (Mateus)

E a sua palavra enérgica e branda disse da misericórdia do Pai Celestial; dos bens terrestres e celestes; do valor das inquietações e angústias humanas, acrescentando que viera ao mundo não para os mais ricos e mais felizes, mas para consolar os mais pobres e deserdados da sorte.

A assembleia heterogênea escutava-o embevecida nos seus transportes de esperança e gozo espiritual.

Uma luz serena e cariciosa parecia vir do Hebron, clarificando a paisagem em tonalidade de opalas e safiras eterizadas.

A hora ia adiantada e alguns apóstolos do Senhor resolveram trazer alguns pães aos mais necessitados de alimento. Dois grandes cestos de merenda frugal foram trazidos, mas os ouvintes eram em demasia numerosos. Jesus, porém, abençoou-lhes o conteúdo e, como num suave milagre, a escassa provisão foi partida em pequenos pedaços, que foram religiosamente distribuídos por centenas de pessoas.

Lívia recebeu igualmente a sua parte e, ao ingeri-la, sentiu um sabor diferente, como se houvera sorvido um remédio apto a lhe curar todos os males da alma e do corpo, porque uma tranquilidade lhe anestesiou o coração flagelado e desiludido. Comovida até às lágrimas, viu que o Mestre atendia, caridosamente, a numerosas mulheres, entre as quais muitas, segundo o conhecimento do povo de Cafarnaum, eram de vida dissoluta e criminosa.

O velho Simeão quis também aproximar-se do Senhor naquela hora memorável da sua passagem pelo planeta. Lívia acompanhou-o automaticamente, e, em poucos minutos, achavam-se ambos diante do Mestre, que os acolheu com o seu generoso e profundo sorriso.

— Senhor — exclamou, respeitosamente o ancião de Samaria —, que deverei fazer para entrar, um dia, no vosso Reino?

— Em verdade te digo — replicou-lhe Jesus, carinhosamente — que muitos virão do Ocidente e do Oriente, procurando as portas do Céu, mas somente encontrarão o Reino de Deus e de sua justiça aqueles que amarem profundamente, acima de todas as coisas da Terra, o nosso Pai que está nos Céus, amando o próximo como a si mesmos.

E espraiando o olhar compassivo e misericordioso por sobre a assembleia vasta, continuou com doçura:

— Muitos, também, dos que foram aqui chamados, serão escolhidos para o grande sacrifício que se aproxima!… Esses me encontrarão no Reino celestial, porque as suas renúncias hão de ser o sal da Terra e o sol de um novo dia!…

— Senhor — aventurou o ancião, com os olhos rasos de lágrimas —, tudo faria eu por ser um dos vossos escolhidos!…

Mas, Jesus, fitando fixamente o patriarca de Samaria, murmurou com infinita ternura:

— Simeão, vai em paz e não tenhas pressa, porque, em verdade, aceitarei o teu sacrifício no momento oportuno…

E estendendo o raio de luz dos seus olhos até à figura de Lívia, que lhe devorava as palavras com a sede ardente da sua atenção, exclamou com as claridades proféticas de suas exortações:

— Quanto a ti, regozija-te em Nosso Pai, porque as minhas palavras e ensinamentos te tocaram para sempre o coração. Vai e não descreias, por que tempo virá em que saberei aceitar as tuas abnegações santificantes!

Essas palavras foram ditas numa tal atitude, que a esposa do senador não teve dificuldade em lhes apreender o sentido profundo, para um futuro distante.

Aos poucos, dispersou-se a grande assembleia dos pobres, dos enfermos e dos aflitos.

Era noite quando Lívia e Ana regressaram à casa solarenga, confortadas pelas graças recebidas das mãos caridosas do Messias.

Profunda sensação de alívio e conforto inundava-lhes a alma.

Penetrando, porém, nos seus aposentos, Lívia encontrou de frente a figura enérgica do marido, que deixava transparecer na fisionomia carregada os mais intensos sinais de irritação, como acontecia, nos momentos de seu mais ríspido mau humor. Ela notou-lhe a exacerbação de ânimo, mas, ao contrário de outras vezes, parecia inteiramente preparada para vencer as mais tremendas lutas do coração, porque, com serenidade imperturbável, o encarou face-a-face, enfrentando-lhe o olhar suspeitoso. Afigurava-se-lhe que a flor de eterna paz espiritual lhe desabrochara no íntimo, ao suave calor das palavras do Cristo, porquanto lhe parecia haver atingido o terreno, até então desconhecido, de serenidade estranha e superior.

Depois de fitá-la de alto a baixo com o seu olhar duro e inquiridor, exclamou Públio, mal sopitando a cólera incompreensível:

— Então, que é isso? Que poderosas razões levariam a senhora a ausentar-se de casa em horas tão impróprias para as mães de família?

— Públio — respondeu com humildade, estranhando aquele tratamento cerimonioso —, por mais que buscasse comunicar-te minha resolução de sair na tarde de hoje, fugiste sempre de minha presença, esquivando-te à minha consulta e eu necessitava procurar o Messias de Nazaret, de modo a acalmar meu coração desventurado…

— E precisavas de disfarce para encontrar o profeta do povo? — atalhou o senador, com ironia.

É a primeira vez que noto uma patrícia usando tais artifícios para consolar o coração. Vai a tanto, assim, o seu menosprezo pelas nossas mais sagradas tradições familiares?

— Supus não me ficasse bem fazer-me notada na multidão das pessoas pobres e infelizes que procuram a Jesus nas margens do lago, e, identificando-me com os sofredores, não presumi desacatar nossos costumes familiares, mas, sim, acreditei agir em favor do nosso nome, considerando a circunstância de ocupares, no momento, nesta província a mais alta expressão política do Império.

— A menos que esteja disfarçando algum outro sentimento, como dissimula a posição social com a indumentária, muito errou procurando o Messias nesses trajes, porque, afinal, estou investido de poderes para requisitar a presença de qualquer pessoa da região em minha casa!

— Mas Jesus — revidou Lívia, corajosamente — deve estar para nós muito acima dos poderes humanos, que sabemos tão precários, por vezes. Acho que a cura da nossa filhinha, diante da qual todos os nossos recursos foram impotentes, é o bastante para faze-lo credor da nossa gratidão imperecível.

— Ignorava que a sua organização mental fosse tão frágil em face dos sucessos do Mestre de Nazaret, aqui em Cafarnaum — continuou o senador, asperamente.

A cura de nossa filha? Como assegurar uma coisa que a sua argumentação pessoal não pode provar com dados positivos? E ainda que esse homem, revestido de forças divinas para o espírito simples e ignorante dos pescadores galileus, tivesse operado essa cura com a sua intervenção sobrenatural, vindo a este mundo da parte dos deuses, poderíamos chamar-lhe impiedoso e cruel, sarando uma menina enferma de tantos anos e permitindo que os gênios do mal e da perversidade nos arrebatassem o filhinho sadio e carinhoso, em cuja fronte colocava a minha ternura de pai todo um futuro brilhante e promissor!

— Cala-te, Públio! — revidou ela, tomada de uma força superior que lhe conservava toda a serenidade do coração. — Recorda-te que os deuses podem humilhar-nos, com dureza, a vaidade e o orgulho absurdos… Se Jesus de Nazaret nos curou a filhinha bem-amada, que apertávamos nos braços frágeis contra os poderes imensos da morte, podia permitir que fôssemos tocados no mais sagrado sentimento de nossa alma, com o incompreensível desaparecimento do nosso Márcus, para que nos sentíssemos inclinados à piedade e à comiseração pelos nossos semelhantes!…

— A senhora se compromete com essa demasiada tolerância, que vai ao absurdo da fraternização com os escravos — disse Públio, com rispidez e austera severidade.

Tal atitude de sua parte me fez pensar, seriamente, que a sua personalidade mudou no decurso deste ano, porque as suas ideias, longe do nível social da sede do Império, baixaram ao terreno dos sentimentos mais relaxados, em face da compostura que se exige da mulher de um senador, ou da matrona romana.

Lívia ouvira, angustiadamente, as palavras injustificáveis do marido. Nunca o vira tão irritado, em todo o transcurso da vida conjugal; mas, verificara, em si própria, uma renovação singular, como se o pão rústico, abençoado pelo Mestre, lhe transfigurasse as mais recônditas fibras da consciência. Seus olhos se enchiam de lágrimas, não por um orgulho ferido ou pela ingratidão que aquelas admoestações injustas revelavam, mas com profunda compaixão do esposo, que não a compreendia, e adivinhando a dolorosa tempestade que lhe fustigava o coração generoso, porém arbitrário, no plano de suas resoluções. Serena e silenciosa, não se justificou perante as severas reprimendas.

Foi quando, então, compreendendo que aquele atrito não deveria prosseguir, dirigiu-se o senador para a porta de saída do apartamento, abrindo-a com estrépito, a exclamar:

— Jamais fiz uma viagem tão penosa e tão infeliz! Gênios malditos parecem presidir às minhas atividades na Palestina, porque se curei uma filha perdi um filhinho no desconhecido e começo a perder a mulher no abismo das irreflexões e da incoerência; e acabarei, também, perdendo-me para sempre.

Dizendo-o, bateu a porta com toda a força dos seus movimentos instintivos, encaminhando-se ao gabinete, enquanto a esposa, de coração genuflexo, dirigia o pensamento para aquele Jesus carinhoso e terno, que viera ao mundo para salvar todos os pecadores. Lágrimas dolorosas fluíam-lhe dos olhos, fixos ainda na paisagem do lago de Genesaré, aonde parecia haver regressado em espírito, novamente. Lá estava o Mestre, em atitudes doces de prece, cravando nas estrelas do céu os olhos fulgurantes.

Figurou-se-lhe que Jesus também lhe notara a presença naquela hora sombria da noite, porque desviara o olhar fúlgido do firmamento constelado e estendia-lhe os braços compassivos e misericordiosos, exclamando com infinita doçura:

— Filha, deixa que chorem os teus olhos as imperfeições da alma que o Nosso Pai destinou para gêmea da tua!… Não esperes deste mundo mais que lágrimas e padecimentos, porque é na dor que os corações se lucificam para o Céu… Um momento chegará em que te sentirás no acume das aflições, mas não duvides da minha misericórdia, porque no momento oportuno, quando todos te desprezarem, eu te chamarei ao meu Reino de divinas esperanças, onde poderás aguardar teu esposo, no curso incessante dos séculos!…

Pareceu-lhe que o Mestre continuaria a embalar-lhe o coração com suaves e carinhosas promessas de bem-aventurança, mas um ruído qualquer a separara daquela visão de luz e de felicidade indefiníveis.

Quebrara-se o quadro da sua preocupação espiritual, como se feito de tenuíssimas filigranas.

Todavia, a esposa do senador compreendeu que não fora vítima de uma perturbação alucinatória, e guardou, com amor, no âmago do coração, as doces palavras do Messias. E, enquanto despia os trajes galileus, a fim de retomar o curso de suas obrigações domésticas, de alma límpida e consolada, parecia, ainda, lobrigar o vulto sereno e amado do Senhor, nas eminências verdejantes das margens do Tiberíade, através da neblina suave, que lhe embaciava os olhos úmidos de pranto.


Emmanuel




Fonte: Bíblia do Caminho † Testamento Xavieriano


ÁUDIO:

Emmanuel : Há Dois Mil Anos
Paz e Amor






Minissérie em formato de Radionovela

O conhecido romance Há 2000 anos, de Emmanuel, psicografado por Francisco Cândido Xavier (1910-2002), um dos maiores best-sellers da literatura espiritualista, narra a saga de Publius Lentulus, nobre romano, cuja esposa Lívia renuncia ao luxo, à ostentação e às antigas crenças para entregar seu espírito a uma nova fé e lutar intensamente pela causa de Jesus, o Cristo de Deus.

A radionovela é uma iniciativa do escritor Paiva Netto e nela estão reunidos os melhores dubladores das superproduções de Hollywood, sob a direção do ator e diretor de TV Paulo Figueiredo.

Joanna de Ângelis - Livro Jesus e Vida - Divaldo P. Franco - Cap. 6 - Relacionamentos



Joanna de Ângelis - Livro Jesus e Vida - Divaldo P. Franco - Cap. 6


Relacionamentos


O ser humano é um animal biopsicossocial, dirigido pelo instinto gregário, necessitado da convivência com outrem da mesma espécie, a fim de desenvolver os conteúdos inerentes à sua evolução.

Quando isolado, tende a vivenciar conflitos e perturbações físicas, emocionais e psíquicas, às vezes, irreversíveis.

O calor dos relacionamentos oferece-lhe vitalidade e desenvolve-lhe a confiança nos investimentos da afetividade e de outros sentimentos nobres, contribuindo para a autorrealização nos objetivos a que se vincula.

Os relacionamentos nem sempre se desenvolvem no clima que deveria ser ideal, isto é, de reciprocidade, de respeito e amizade.

Assim sucede, porque o egoísmo e as paixões primitivas dificultam-lhe as manifestações de equilíbrio e de discernimento na pauta da convivência com outrem em particular, e com as demais pessoas em geral.

Destacando-se o temperamento rebelde, fruto das heranças ancestrais de predominância da força bruta sobre os sentimentos dignificantes, o indivíduo que deseja a bênção do relacionamento, ao invés de preocupar-se com o seu significado, aquilo que pode e gostaria de oferecer, deseja, apenas, auferir os benefícios retirados do outro, sem a contribuição pessoal da afetividade, da cooperação.

Todo relacionamento exige reciprocidade para ser exitoso, a fim de ensejar bem-estar, intercâmbio de vibrações harmônicas, alegria de viver.

Os primeiros relacionamentos têm lugar no regaço materno, quando se manifestam as primeiras expressões da afetividade do adulto em relação à criança. É nessa fase que se desenvolvem as sementes do amor divino adormecidas no cerne do ser, aguardando o adubo da ternura, o calor do amparo, a chuva das carícias, os cuidados vigilantes da preservação da vida...

À medida que se fortalecem os laços da família em relação à criança, expande-se-lhe o campo de relacionamento, ensejando-lhe melhor entendimento em torno da vida, que é feita de fatores conjugados em reciprocidade de contribuição, graças à qual é possível o prosseguimento existencial.

Logo depois, surgem os pródromos do relacionamento social na escola - seja no ciclo maternal, infantil, de alfabetização, fundamental... - fortalecendo ou não a segurança no apoio da amizade, conforme as respostas da convivência com os adultos, os educadores, as demais pessoas...

Entre os animais irracionais, com algumas exceções, os pais orientam os filhos em relação ao grupo, na busca da alimentação, da preservação da prole, da espécie, na demarcação da área que lhe pertence, após o que, deixa-os por conta própria, quando já se encontram em condições de sobrevivência.

Em face do instinto de preservação da vida, o fenômeno dá-se por automatismo, imprimindo, pela repetição, nos hábitos dos descendentes, os recursos que os preservarão, auxiliando-os no crescimento e sobrevivência em relação aos predadores e aos fatores circunstanciais e ambientais.

O ser humano, que pensa, nem sempre age conforme aprendeu, permitindo-se desorientar, vivenciando condutas agressivas e infelizes, destruindo os relacionamentos indispensáveis à existência feliz.

Em qualquer relacionamento em que te encontres, cuida de ser leal e honesto, não te utilizando de recursos desprezíveis, mesmo que objetivem resultados que supões serem construtivos. O erro, a intenção malévola não podem contribuir de maneira saudável, porque as suas são estruturas deficientes e enfermiças. O mal jamais operará em favor do bem, porque a sua é uma contribuição destrutiva.

Somente a verdade, mesmo que amarga e muitas vezes afligente, preserva saudáveis os relacionamentos.

A amizade é fator essencial, em qualquer tipo de relacionamento, por caracterizar-se pelo desinteresse pessoal, imediatista, ao influxo da disposição da convivência enriquecedora.

Nessa conjuntura, ninguém se apresenta mais importante, evitando-se sempre a exaltação do ego, que é fator dissolvente de todo empreendimento edificante.

À medida que se estreitam os laços da amizade, podem surgir outras expressões de afetividade, tornando o relacionamento mais complexo e mais profundo, muitas vezes culminando na identificação de propósitos e ideais, que se consolida em matrimônio, abrindo espaço para a constituição da família.

Nos relacionamentos sociais, lamentavelmente, quase sempre predominam a mentira, a bajulação em referência aos poderosos, submissão e falsidade, que logo se convertem em traição e abandono, assim que os ventos dos interesses mudam de direção.

A sociedade, no entanto, merece contribuição enriquecedora, distante dos habituais comportamentos sórdidos, nos quais a intriga e a mentira adquirem cidadania, em detrimento da fidelidade e do respeito, cada qual tentando alcançar mais alto patamar na escada da insensatez.

Essa conduta mórbida expande-se na direção dos relacionamentos comerciais, políticos, artísticos, culturais de toda expressão, porquanto é o indivíduo com os seus próprios recursos que se transfere de uma para outra condição no grupo em que se movimenta. Se a sua é uma conduta enfermiça, naturalmente que a impõe onde se encontre, produzindo equilíbrio ou desordem. Se, no entanto, é portadora de recursos educativos, significando elevação de princípios, por certo contribuirá para a preservação da convivência responsável e benéfica.

O indivíduo, desse modo, é sempre o agente do sucesso ou do desastre na área dos relacionamentos.

A fraternidade constitui, então, o passo mais feliz no processo das relações entre as criaturas humanas, porquanto impulsiona à afeição como se fora biológica, portanto, destituída de paixões individualistas, trabalhando em favor do mesmo clã, do grupo doméstico.

É certo que, nem sempre, no lar, encontram-se espíritos afins, que sejam capazes de trabalhar em comunhão de pensamento e de ideal, muitas vezes, lutando encarniçadamente, devorados pelos ódios ancestrais, que procedem das condutas infelizes de outras existências, agora em processo de recuperação. Entretanto, é na família que se consolidam os sentimentos e se ampliam os tesouros da verdadeira afeição.

Os relacionamentos sexuais, que têm destaque nos grupos humanos, como fundamentais para a vida, são mais frutos do instinto do que mesmo dos sentimentos. Aparentemente surgem como impulsos de falso amor, com paixão abrasadora, que arrasta a comportamentos precipitados e a uniões sem estrutura moral, econômica ou mesmo afetiva.

Logo passam os impulsos defluentes do desejo asselvajado, porque não se submetem ao controle da razão, e desaparecem os relacionamentos, transformando-se, não poucas vezes, em lutas e ódios devoradores.

Considerando a necessidade dos relacionamentos saudáveis, Jesus, o Psicoterapeuta por Excelência, propôs o amor entre as criaturas humanas em todas e quaisquer circunstâncias, porquanto o amor é essencial para a construção da sociedade terrestre.

O amor é a expressão divina que verte do Alto em tudo quanto existe, trabalhando pela felicidade espiritual da Terra, através das criaturas que hospeda na forma física.

Ama, portanto, e relaciona-te com tudo e com todos, sem receio, oferecendo o que possuas de melhor, dessa maneira fruindo de paz e nunca te sentindo a sós...

Mandato mediúnico Asseverou com propriedade o apóstolo Paulo que há diversidade de dons, mas o espírito é o mesmo (Co 15:4-10), graças aos quais se manifestam os fenômenos que procedem de Deus, através da palavra de sabedoria, da escrita, da profecia, das línguas, das curas, tudo como manifestação do espírito.

Posteriormente, por ocasião da Codificação do Espiritismo, Allan Kardec, estudando as faculdades mediúnicas, demonstrou que elas se apresentam com variedade e polimorfia.

Mesmo quando se trata de uma expressão que a tipifica em todos os indivíduos, ei-la que varia de qualidade conforme o instrumento pelo qual se manifesta.

E compreensível que assim ocorra, considerando-se que, na área da inteligência, diversas são as suas manifestações, tais como a de natureza cognitiva, emocional e espiritual. Nada obstante, em cada uma delas ocorrem especificidades que são peculiares às experiências de cada ser humano em decorrência das suas transatas reencarnações, das conquistas ou prejuízos adquiridos.

Se tomar-se como exemplo a cognitiva, ou de natureza intelectual, constata-se que o seu portador pode ser um excelente matemático, e ter muita dificuldade para outras doutrinas, como as filosóficas, históricas, geográficas ou vice-versa.

Depreende-se que se trata de uma aptidão especial compatível com o desenvolvimento cultural ínsito em cada pessoa, que demonstra maior ou menor facilidade para determinado aspecto do conhecimento com o qual já teve ou não contato em existência anterior.

Apresentando-se a faculdade mediúnica de maneira ostensiva ou natural, os fenômenos ocorrem de acordo com a pauta das necessidades evolutivas de cada medianeiro, razão pela qual não existem duas inteligências iguais, da mesma forma que não existem dois médiuns portadores do mesmo nível de registros das ocorrências espirituais.

Se, por um lado, as manifestações ostensivas melhor confirmam a procedência espiritual das ocorrências, mais cuidados requer, de modo que não se transforme em motivo de aflições e de desaires.

Constituindo-se um delicado instrumento com imensas possibilidades para produzir os fenômenos, estes se tornam contínuos e expressivos, cuja qualidade nem sempre é de procedência superior, considerando-se os espíritos que os desencadeiam.

Sendo mais fácil a sintonia do médium com os seres espirituais do seu mesmo nível evolutivo, e estando assessorado por aqueloutros que se lhe vinculam pelos impositivos das reencarnações anteriores, a fase inicial das manifestações é quase sempre turbulenta, aflitiva, quando não ocorrem, nesse período, os tormentosos transtornos obsessivos.

À medida que o estudo, a reflexão, o conhecimento da faculdade favorecem-lhe o bom uso, altera-se-lhe a face perturbadora, tornando-se veículo dos operosos seareiros do amor e da caridade, que a utilizam para os fins nobilitantes a que se destina.

A faculdade natural é mais sutil, propiciando lento e bem cuidado aprimoramento, graças ao qual as expressões fenomênicas tornam-se evidentes e confortadoras.

Apresente-se, desse modo, o fenômeno mediúnico em qualquer aspecto que o caracterize, o comportamento moral saudável do médium, o exercício das virtudes e dos sentimentos dignos do dever cumprido com abnegação, contribuem para o feliz desempenho do compromisso que foi firmado no Grande Lar, antes da atual conjuntura reencarnacionista.

Daí o declararmos abertamente que quem quer que blasone de os obter (fenômenos) à vontade não pode deixar de ser ignorante ou impostor. Daí vem que o verdadeiro Espiritismo jamais se ilará em espetáculo, nem subirá ao tablado das feiras, afirmou com ênfase Allan Kardec. (O Livro dos Médiuns. 28. ed. FEB. Cap. III, item 31)

É procedente a declaração do preclaro Codificador, considerando que os espíritos sérios não se permitem o ridículo nem se fazem instrumento de divertimento para as massas ociosas e insensatas.

O fenômeno ocorre em qualquer lugar, compatível, no entanto, com os valores morais daqueles que lhe participam da apresentação.

Encontramo-lo tanto no banquete de Baltazar, rei da Babilônia, prenunciando os últimos dias do grande império, quanto na sarça ardente do monte Sinai onde Moisés recebeu o Decálogo.

Sempre esteve presente no burlesco de todas as épocas, através de idiotas e de saltimbancos que lhe foram objeto de manifestações, ruidosas umas, apavorantes outras, todas, porém, de qualidade inferior.

De maneira equivalente esteve no Tabor e em inúmeros lugares através dos tempos, traduzindo o triunfo da imortalidade e a glória da vida imperecível.

A mediunidade é faculdade neutra, apresentando-se tanto através de pessoas dignas como estúrdias. Os fenômenos que produz resultam sempre das qualidades morais dos seus portadores.

É compreensível, portanto, que o mandato mediúnico revista-se de elevação e de inteireza espiritual em todo aquele que deseja viver com sabedoria, especialmente quando se encontra comprometido com a atividade espírita.

Nunca deve o médium permitir-se a sistemática sintonia com as entidades de conduta vulgar, objetivando distrair e agradar o público, tão ocioso quanto irresponsável, sempre disposto ao campeonato da frivolidade.

Jamais esquecer-se de que a mediunidade deve ser considerada como um instrumento santo e que santamente deve ser utilizada.

Não bastam as justificativas de que são nobres os fins perseguidos, utilizando-se, porém, de meios atentatórios aos compromissos doutrinários, embora os recursos angariados se destinem a atividades dignificantes.

A mediunidade é ponte através da qual os imortais retornam à convivência com as criaturas reencarnadas, advertindo-as, confortando-as, preparando-as para a sobrevivência à morte.

Canalizar-lhe as energias de maneira sábia e elevada, constitui dever impostergável de todo aquele que, médium ostensivo ou natural, seja portador de uma ou de várias facetas mediúnicas.

Torna-te veraz, e os fenômenos por teu intermédio serão autênticos.

Faze-te responsável e sério, e as ocorrências mediúnicas a que deres origem merecerão credibilidade e consideração.

Vive conforme recomendam os espíritos nobres, e aqueles que participam das tuas experiências mediúnicas se esforçarão para viver condignamente.

Exercita a caridade e a renúncia, ajudando-te e ao teu próximo, e os bons espíritos te elegerão para instrumento do seu ministério de iluminação humana.

Jesus, na condição de Médium de Deus, viveu integralmente tudo quanto nos ensinou a todos, a fim de buscarmos a glória celestial. 


Joanna de Ângelis 
















terça-feira, 28 de maio de 2024

Lancellin - Livro Iniciação Viagem Astral - João Nunes Maia - Cap. 2 - A Alma em preparo



Lancellin - Livro Iniciação Viagem Astral - João Nunes Maia - Cap. 2


A Alma em preparo


Considere-se feliz aquele que entendeu os princípios da fraternidade e sentiu que é indispensável a educação em todos os sentidos da existência, quer seja física, quer seja espiritual. A educação mostra o que somos àqueles com quem estamos falando ou a quem estivermos ouvindo.

Esse adestramento é fruto da disciplina, aquela constante em nossa vida; o nosso dever maior, como estudantes da Verdade, é o amanho das qualidades espirituais que o Senhor depositou no cofre dos nossos corações. Quem percebe o tesouro que pode ter no curso da vida, junto aos seus companheiros de jornada, e na vivência do lar, não se esquece do cultivo das virtudes mencionadas por Jesus no Seu Evangelho, que expressa a Sua magnânima vida e grandeza espiritual.

O discípulo da sabedoria universal, que já despertou para a luz da Verdade, não pode esmorecer na lavoura empreendida; se já selecionou as sementes, não deve olhar para trás: que lance as sementes no solo preparado e espere o seu devido crescimento. Quando o poço está pronto, a água aparece.

A máxima "sê como o sândalo, que perfuma o machado que o fere" nos mostra o perdão na sua mais pura feição, ensinando numa simples frase, para que possamos aplicá-la no nosso dia-a-dia, lutando contra o homem velho, para que dominem os valores espirituais no homem novo, acendendo luzes e ampliando sabedoria em todas as áreas, mesmo onde prevaleçam os sentimentos contrários.

É bom que não te esqueças dos obstáculos; eles aparecerão na extensão de todos os caminhos, onde a honestidade for o clima e a fé, o sustentáculo.

Quando te empenhas em um trabalho e tudo corre com a facilidade que desejas, tem cuidado! As trevas comumente perseguem os empreendimentos onde os frutos são saborosos. Não reclames das dificuldades. Procura, com todo zelo, superá-las com humildade e alegria nunca deixando os pensamentos negativos povoarem a tua mente, porque eles podem turvar as tuas altas aspirações, desviando-as para regiões onde predomina a improdutividade.

Compete a ti mesmo discernir e raciocinar, com a ajuda do coração e empenhado na prece, para não deixar de fazer as coisas certas, abandonando aquelas que se afastam dos princípios cristãos. As primeiras trazem a glória e as segundas emprestam tristezas ao teu mundo íntimo, o que, por vezes, te custará tempo indefinido para os reparos devidos.

Quando o discípulo está pronto, o mestre aparece. Não se turbe, portanto, o teu coração ante a demora da luz no caminho a percorrer; o verdadeiro mestre mora na consciência e Paulo de Tarso já tinha conhecimento dessa verdade, que o levou a dizer com inspiração O Cristo em nós é motivo de glória. 

O Apóstolo dos Gentios teve que conhecer o Cristo externamente, para que Ele nascesse em seu coração, onde poderia permanecer eternamente. Não existe outro caminho melhor e de tão alto valor para as criaturas e o Cristo em nós nos guiará para os verdadeiros caminhos, onde encontraremos a felicidade, porque nos libertará de todas as imperfeições. 

Se queres entrar em preparo, começa hoje, agora, e permanece até o fim, sem esmorecer diante dos simples obstáculos que deverão aparecer para o teu próprio bem, servindo de testes às qualidades já afloradas. 

Se ainda alimentas o ódio a alguém que, por invigilância, te feriu; conservas a maledicência, destilando magnetismo inferior pela língua; te esqueceste de perdoar os ofensores que te caluniaram; gastas o teu maior tempo, doado por Deus, em baixas conversações; desconheces o valor grandioso da caridade; não acreditas no amor que nos salva a todos; desconheces a terapia espiritual do trabalho honesto e abusas do tempo; tens preguiça de estudar e não gostas de aprender; não acreditas na oração e criticas os que a praticam; és avesso à fraternidade e o egoísmo domina os teus atos, convém que nem penses em desdobramento consciente, nem na sua prática. Fica, por enquanto, nos sonhos, até resolveres despertar e empreender esforços para granjear a tua melhoria. 

Tudo o que é bom, meu irmão, deve ter o traço do merecimento, e todo merecimento é filho do esforço próprio. 

Este livro irá te trazer algum sofrimento, porque ele induz a uma vida nova, contrariando a sequência em que provavelmente vives, e os teus corpos dinâmicos, que servem de instrumento para o Espírito imortal, poderão entrar em estado de rejeição e te causar danos demorados. Entretanto, se tiveres a fé do tamanho de um grão de mostarda, no dizer do Evangelho, vencerás. 


Lancellin















segunda-feira, 27 de maio de 2024

Bezerra de Menezes - Livro Paz e Libertação - Espíritos Diversos / Chico Xavier - Cap. 18 - Meditação



Bezerra de Menezes - Livro Paz e Libertação - Espíritos Diversos / Chico Xavier - Cap. 18


Meditação


Não basta rogar ajuda para si.

É indispensável o auxílio aos outros.

Não vale a revelação de humildade na indefinida repetição dos pedidos de socorro.

É preciso não reincidirmos nas faltas.

Não há grande mérito em solicitarmos perdão diariamente.

É necessário desculparmos com sinceridade as ofensas alheias.

Não há segurança definitiva para nós se apenas fazemos luz na residência dos vizinhos.

É imprescindível acendê-la no próprio coração.

Não nos sintamos garantidos pela certeza de ensinarmos o bem a outrem.

É imperioso cultivá-lo por nossa vez.

Não é serviço completo a ministração da verdade construtiva ao próximo.

Preparemos o coração para ouvi-la de outros lábios, com referência às nossas próprias necessidades, sem irritação e sem revolta.

Não é integral a medicação para as vísceras enfermas.

É indispensável que não haja ódio e desespero no coração.

Não adianta o auxílio do Plano Superior, quando o homem não se preocupa em retê-lo.

Antes de tudo, é preciso purificar o vaso humano para que se não perca a essência divina.

Não basta suplicar a intercessão dos bons.

Convençamo-nos de que a nossa renovação para o bem, com Jesus, é sagrado impositivo da vida.

Não basta restaurar simplesmente o corpo físico.

É inadiável o dever de buscarmos a cura espiritual para a vida eterna.


Bezerra de Menezes