quarta-feira, 1 de maio de 2024

Léon Denis - Livro O Problema do Ser, do Destino e da Dor - 3ª Parte - As Potências da Alma - Cap. 23 - O pensamento



Léon Denis - Livro O Problema do Ser, do Destino e da Dor - 3ª Parte - As Potências da Alma - Cap. 23


O pensamento


O pensamento é criador. Assim como o pensamento do Eterno projeta sem cessar no espaço os germens dos seres e dos mundos, assim também o do escritor, do ora­dor, do poeta, do artista, faz brotar incessante flores­cência de idéias, de obras, de concepções, que vão influenciar, impressionar para o bem ou para o mal, se­gundo sua natureza, a multidão humana.

Aqui a missão dos obreiros do pensamento é ao mesmo tempo grande, temível e sagrada. Grande e sagrada, porque o pensamento dissipa as sombras do caminho, resolve os enigmas da vida e traça o caminho da Humanidade; é a sua chama aquece as almas e ilumina os desertos da existência. temível, porque seus efeitos são poderosos tanto para a descida como para a ascensão.

Mais cedo ou mais tarde todo produto do espírito reverte para seu autor com suas conseqüências, acarre­tando-lhe, segundo o caso, o sofrimento, uma diminuição, uma privação de liberdade, ou, então, satisfações íntimas, uma dilatação, uma elevação do ser.

A vida atual é, como se sabe, um simples episódio de nossa longa história, um fragmento da grande cadeia que se desenrola para todos através da imensidade. E constantemente recaem sobre nós, em brumas ou clari­dades, os resultados de nossas obras. A alma humana percorre seu caminho cercada de uma atmosfera brilhan­te ou turva, povoada pelas criações de seu pensamento. isto, na vida do Além, sua glória ou sua vergonha.

Para dar ao pensamento toda a força e amplitude, nada há mais eficaz do que a investigação dos grandes problemas.

Por bem dizer, é preciso sentir com veemência; para saborear as sensações elevadas e profundas, é necessário remontar à nascente de que deriva toda a vida, toda a harmonia, toda a beleza.

O que há de nobre e elevado no domínio da inteli­gência emana de uma causa eterna, viva e pensante. Quanto mais largo é o voo do pensamento para essa causa, tanto mais alto ela paira, tanto mais radiosas também são as claridades entrevistas, mais inebriantes as alegrias sentidas, mais poderosas as forças adquiridas, mais geniais as inspirações! Depois de cada voo, o pensamento torna a descer vivificado, esclarecido para o campo terrestre, a fim de prosseguir a tarefa pela qual continuará a desenvolver-se, porque é o trabalho que faz a inteligência como é a inteligência que faz a beleza, o esplendor da obra acabada.

Eleva teu olhar, ó pensador, ó poeta! Lança teu brado de apelo, de aspiração e prece! Diante do mar de reflexos variáveis, à vista de brancos cimos longínquos ou do infinito estrelado, não passaste nunca horas de êxtase e embriaguez, em que a alma se sente imersa num sonho divino, em que a inspiração chega poderosa como um relâmpago, rápido mensageiro do Céu à Terra?

Escuta bem! Nunca ouviste, no fundo de teu ser, vibrarem as harmonias estranhas e confusas, os rumores do mundo invisível, vozes de sombra que te acalentam pensamento e o preparam para as intuições supremas?

Em todo poeta, artista ou escritor há germens de mediocridade inconsciente, incalculáveis, e que desejam desabrochar; por eles o obreiro do pensamento entra com o manancial inexorável e recebe sua parte de revelação. Esta revelação de estética, apropriada à sua natureza, ao gênero de seu talento, tem ele por missão exprimi-la em obras que farão penetrar na alma das multidões uma vibração das forças divinas, uma radiação das verdades eternas.

É na comunhão frequente e consciente com o mundo dos Espíritos que os gênios do futuro hão de encontrar os elementos de suas obras. Desde hoje, a penetração dos segredos de sua dupla vida vem oferecer ao homem socorros e luzes que as religiões desfalecidas já lhe não podem proporcionar.

Em todos os domínios, a ideia espírita vai fecundar o pensamento em atividade.

A Ciência dever-lhe-á a renovação completa de suas teorias e métodos. Dever-lhe-á a descoberta de forças incalculáveis e a conquista do universo oculto. 

A Filo­sofia obterá um conhecimento mais extenso e preciso da personalidade humana. Esta, no transe e na exterioriza­ção, é como uma cripta que se abre, cheia de coisas estra­nhas e onde está escondida a chave do mistério do ser.

As religiões do futuro hão de encontrar no Espiritismo as provas da sobrevivência e as regras da vida no Além, ao mesmo tempo que o princípio de uma união das duas humanidades, visível e invisível, em sua ascensão para o Pai comum.

A Arte, em todas as suas formas, descobrirá nele mananciais inexauríveis de inspiração e emoção.

O homem do povo, nas horas de cansaço, beberá nele a coragem moral. Compreenderá que a alma pode desen­volver-se tanto pela lide humilde como pela obra majes­tosa e que não se deve desprezar dever algum; que a inveja é irmã do ódio e que, muitas vezes, o ser é menos feliz no luxo que na mediocridade. O poderoso aprenderá nele a bondade com o sentimento da solidariedade que a todos liga através de nossas vidas e pode obrigar-nos voltar pequenos para adquirirmos as virtudes modes­tas. O céptico achará nele a fé; o desanimado as espe­ranças duradouras e as resoluções viris; todos os que sofrem encontrarão a ideia profunda de que uma lei de justiça preside a todas as coisas, de que não há, em nenhum domínio, efeito sem causa, parto sem dor, vitó­ria sem combate, triunfo sem rudes esforços, mas que, acima de tudo, reina uma perfeita e majestosa sanção e que ninguém está abandonado por Deus, de que é uma parcela.

Assim, vagarosamente se operará a renovação da Humanidade, tão nova ainda, tão ignorante de si mesma, mas cujos desejos se dirigem pouco a pouco para a com­preensão de sua tarefa e de seu fim, ao mesmo tempo que se alarga seu campo de exploração e a perspectiva de um futuro ilimitado. E em breve eis que ela avançará mais consciente de si mesma e de sua força, consciente de seu magnífico destino. A cada passo que transpõe, vendo e querendo mais, sentindo brilhar e avivar-se o foco que arde em si, vê também as trevas recuarem, fun­direm-se, resolverem-se os sombrios enigmas do mundo e iluminar-se o caminho com um raio poderoso.

Com as sombras, desvanecem-se pouco a pouco os preconceitos, os vãos terrores; as contradições aparentes do Universo dissipam-se; faz-se a harmonia nas almas nas coisas. Então, a confiança e a alegria penetram­-lhe e o homem sente desenvolver-se-lhe o pensamento e o coração. E de novo avança pelo caminho das idades para o termo de sua obra; mas, esta não tem termo. Porque, de cada vez que a Humanidade se eleva para um novo ideal, julga ter alcançado o ideal supremo, quando, na realidade, só atingiu a crença ou o sistema correspondente ao seu grau de evolução. Mas, de cada vez também, de seus impulsos e de seus triunfos decorrem­-lhe felicidades e forças novas, e ela encontra a recom­pensa de seus labores e angústias no próprio labor, na alegria de viver e progredir, que é a lei dos seres, comunhão mais íntima com o Universo, numa posse mais completa do Bem e do Belo.

Os, poetas, vós, cujo número au­menta todos os dias, cujas produções se multiplicam e sobem como a maré, belas muitas vezes pela forma, mas fracas no fundo, superficiais e materiais, quanto talento não gastais com coisas medíocres! Quantos esforços des­perdiçados e postos ao serviço de paixões nocivas, de volúpias inferiores e interesses vis!

Quando vastos e magníficos horizontes se desdo­bram, quando o livro maravilhoso do Universo e da alma se abre de par em par diante de vós e o Gênio do pensa­mento vos convida para nobres tarefas, para obras cheias de seiva, fecundas para o adiantamento da Humanidade, vós vos comprazeis bastas vezes com estudos pueris e estéreis, com trabalhos em que a consciência se estiola, em que a inteligência se abate e definha no culto exage­rado dos sentidos e dos instintos impuros.

Quem de vós dirá a epopeia da alma lutando pela conquista de seus destinos no ciclo imenso das idades e dos mundos, suas dores e alegrias, suas quedas e levan­tamentos, a descida aos abismos da vida, o bater de asas para a luz, as imolações, os holocaustos que são um res­gate, as missões redentoras, a participação cada vez maior das concepções divinas!

Quem dirá também as poderosas harmonias do Uni­verso, harpa gigantesca vibrando ao pensamento de Deus, o canto dos mundos, o ritmo eterno que embala a gênese dos astros e das humanidades! Ou, então, a lenta elabo­ração, a dolorosa gestação da consciência através dos estádios inferiores, a construção laboriosa de uma indi­vidualidade, de um ser moral!

Quem dirá a conquista da vida, cada vez mais com­pleta, mais ampla, mais serena, mais iluminada pelos raios do Alto, a marcha, de cimo em cimo, em busca da felicidade, do poder e do puro amor? Quem cantará a obra do homem, lutador imortal, erguendo, através de suas dúvidas, dilaceramentos, angústias e lágrimas o edi­fício harmônico e sublime de sua personalidade pensante e consciente ? Sempre para a frente, para mais longe e para mais alto! Responderão: Não sabemos. E perguntam: Quem nos ensinará essas coisas?

Quem? As vozes interiores e as vozes do Além. Aprendei a abrir, a folhear, a ler o livro oculto em vós, o livro das metamorfoses do ser. Ele vos dirá o que fostes e o que sereis, ensinar-vos-á o maior dos mistérios, a criação do "eu" pelo esforço constante, a ação sobe­rana que, no pensamento silencioso, faz germinar a obra e, segundo vossas aptidões, vosso gênero de talento, far-vos-á pintar as telas mais encantadoras, esculpir as mais ideais formas, compor as sinfonias mais harmonio­sas, escrever as páginas mais brilhantes, realizar os mais belos poemas.

Tudo está aí, em vós, em roda de vós. Tudo fala, tudo vibra, o visível e o invisível, tudo canta e celebra a glória de viver, a ebriedade de pensar, de criar, de associar-se à obra universal. Esplendores dos mares e do céu estrelado, majestade dos cimos, perfumes das flores­tas, melodias da terra e do espaço, vozes do invisível que falam no silêncio da noite, vozes da consciência, eco da voz divina, tudo é ensino e revelação para quem sabe ver, escutar, compreender, pensar, agir!

Depois, acima de tudo, a Visão Suprema, a visão sem formas, o Pensamento incriado, verdade total, harmonia final das essências e das leis que, desde o fundo de nosso ser até a estrela mais distante, liga tudo e todos em sua unidade resplandecente. A cadeia de vida, que se eleva e desenrola no Infinito, escada das potências espirituais que levam a Deus os apelos do homem pela oração e trazem ao homem as respostas de Deus pela inspiração.

Agora, uma última pergunta. Por que é que, no meio do imenso labor e da abundante produção intelectual que caracterizam nossa época, se encontram tão poucas obras viris e concepções geniais? Porque deixamos de ver as coisas divinas com os olhos da alma! Porque deixamos de crer e amar!

Remontemos, pois, às origens celestes e eternas; é o único remédio para nossa anemia moral. Dirijamos pensamento para as coisas solenes e profundas. Ilumi­ne-se e complete-se a Ciência com as intuições da consciência e as faculdades superiores do espírito. O Espiri­tualismo moderno a auxiliará.


Léon Denis














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