Miramez - Livro Iniciação à Viagem Astral - Lancellin / João Nunes Maia
Prefácio
A palavra iniciação lembra-nos, de imediato, os grandes iniciados. Faz-nos recordar e visualizar os grandes homens que legaram traços de luz para a humanidade através da conduta do dia a dia. A força do exemplo é como que uma energia circulante, capaz de acordar os cépticos e fazer andar os que dormem; levantar os caídos pela desilusão e alegrar os tristes. A concha evolutiva em que estamos presos torna difícil realizar o empenho do coração em ingressar nas hostes dos benfeitores maiores da espiritualidade; requer, de todos nós, tempo e um esforço maior em todas as direções que conhecemos, em se tratando de educação, disciplina e amor.
Querer alistar-se nessa escola de grandeza espiritual é a pretensão de muitos, todavia, poucos conseguem respirar em meio a tantas contradições, com o mesmo sorriso de alegria, por estar subindo verticalmente, sonhando na Terra com a libertação.
O iniciado, nos dias em que vivemos no calendário da Terra, deve procurar ser um super-homem, aquele que se expressa com sensatez na sequência dos dias, exemplificando as virtudes anunciadas pelos Maiores e projetando outros meios de concordâncias para o equilíbrio da vida e dos corpos que a Criação lhe empresta para evoluir no campo imenso da existência.
O iniciado nos segredos da natureza e no complexo estupendo, onde o amor se divide para ser entendido pelos homens, encontra a solução ou a explicação para tudo o que ocorre no mundo externo e interno em que vive. Ele começa a conhecer os caminhos por onde deve trilhar, com o máximo de cuidado e equilíbrio.
O aluno do Bem já purificou a sua mente de maneira que não é dado a pensamentos negativos, por ser conhecedor dos desastres que as ideias pesadas lhe causam, no macro e no micro universo que se interligam e que registram todos os seus sentimentos, devolvendo para o seu uso, o que neles foi escrito com o lápis da vida.
A caridade verdadeira deve ocupar as duas esferas de vida: se doas um pão, não te esqueças da palavra de estímulo a quem recebe, sobre os meios de adquirir o seu sustento, sem permitir que tuas palavras possam parecer ofensivas. Se és refinado em provérbios que educam e instruem as criaturas, não te demores em compridas teorias; alcança sem delongas o objetivo e esforça-te para viver o que falas aos outros.
Se a vaidade te incomoda, querendo mostrar tudo que fazes de bom aos semelhantes, não te demores muito tempo nesse ambiente falso e inverte o interesse, vendo o que de melhor os outros estão fazendo. Educa-te por dentro, que a atmosfera de fora executará as mudanças externas. Toda subida pede conhecimento e todo conhecimento requer amor.
O corpo físico e os corpos sutis que o interpenetram são instrumentos que esperam da alma pensamentos puros, para orquestração elevada, sensibilizando todos os sentidos em refinadas melodias, onde a harmonia se assenta como base a sustentar a tranquilidade imperturbável.
Não deves iludir-te com facilidade apropriada aos incautos e aos néscios, buscando por a mão no salário a que fizeste jus; o desprendimento é fato nobre, que alegra aos anjos, mas, para ser verdadeiro, deve acompanhar a conduta moral nos contatos que muitas vezes surgirão em tua existência.
A iniciação não é somente conhecer; o conhecimento completo está na prática. O aluno de medicina escuta nas aulas o verbo fluente do mestre mas, depois, vai ao pé do leito confirmar o que ouviu.
Se gostas somente de teoria e te sentes bem nisso, não prossigas com esta leitura: fecha este livro e vai sonhar, até alguém bater de novo à tua porta. Precisamos de mãos esclarecidas que operem sem murmúrios. Existem escolas filosóficas que dão as diretrizes para que seus seguidores atinjam a libertação, esquecendo-se, entretanto, da dosagem dos ensinamentos, o que leva seus discípulos ao fanatismo e ao proselitismo.
Onde fica o equilíbrio indispensável à solidez do trabalho? E a sensatez que direciona esse trabalho no sentido da evolução? Toda prática espiritual, todo desenvolvimento psíquico, busca por sintonia o silêncio.
O iniciado deve procurar ser um homem perfeito em todos os aspectos da vida que, se ofendido, não ofende: esquece. Se maltratado, não revida; ajuda a todos em seu caminho.
Começa examinando hoje mesmo o que tens feito na vida e da vida que Deus te deu.
O que tiver que ser consertado, conserta logo. Se não tens força para tal, continua alimentando ideias de melhorar que os Céus operarão em ti com mais intensidade. A primeira coisa a fazer é limpar-te de hábitos e vícios, que são manifestações de inferioridade.
Coloca a tua mente na universidade de Deus, os teus ouvidos na escola do bem ouvir e a tua boca sob uma educação intensiva.
Nunca deixes faltar atividades para as tuas horas de folga, nem percas tempo na vida que passa; faze algo de bom, para que isso fique registrado na memória da vida, que não se esquece de nada. Dá o primeiro passo. E nas horas difíceis, assim como nos momentos felizes, não te esqueças da prece, companheira constante daquele que está no caminho da iniciação.
Bittencourt Sampaio - Livro Palavras Sublimes - Espíritos Diversos / Chico Xavier - Cap. 3
Nos “Ais” do Apocalipse
Não é debalde que se vos tem anunciado das Alturas serem chegados os tempos preditos pelo Cordeiro divino para o estabelecimento da verdade entre os homens. Os séculos passaram, no seu escoar incessante, sobre a personalidade de Jesus Cristo; todavia, não conseguiram empanar as suas promessas que se cumprirão integralmente, como outrora se cumpriram, com a sua vinda ao mundo, as profecias dos elevados Espíritos que escreveram com os seus sacrifícios a história de Israel.
Tocais a época em que a luz espiritual se derramará sobre as trevas da carne e das impurezas; mas luz que nascerá de choques tremendos, obedecendo à lei natural que presidiu aos cataclismos inconcebíveis, que varreram da face do planeta, em seus períodos primários, as causas de desorganização para que se efetivasse a aglutinação de todos os elementos aptos a receber em seu seio os primeiros organismos humanos.
Como vós outros, é nas sagradas promessas do passado que bebemos as inspirações do futuro e sem nos aventurarmos imprudentemente pelo terreno das afirmações categóricas, que implicariam desconhecermos o nosso dever de submissão aos sábios e irrevogáveis decretos do Altíssimo, podemos afiançar que a transformação moral da humanidade se processa de há muito e de há muito uma ativa colaboração dos Espaços Infinitos se vem fazendo sentir nos destinos da humanidade, com o elevado objetivo de norteá-la para o verdadeiro conhecimento da vida.
O Cristianismo, em suas origens simples e puras, iniciou um ciclo de progresso espiritual no planeta e o século XX, com as suas concepções de liberdade, dentro da razão e da ciência, assinala a transação entre a morte do mundo material e o nascimento de uma nova era.
É claro que nem todos os homens se apercebem da verdade evangélica, porém, apáticos ou indiferentes, serão tocados pela vibração que fará estremecer todas as almas e estalar de ansiedade os corações.
Chegaram os tempos em que a verdade será dita de cima dos telhados e, sem retórica, serão as dores as portadoras das suas mensagens, porque o “homem velho” reagirá contra o “homem novo”.
A guerra se desencadeará, porém, um tombará na noite caliginosa da ignorância, com as suas armas fratricidas, e o outro surgirá na alvorada do Evangelho de Amor. Contudo, aos tempos novos, cujos eflúvios de paz podeis prelibar, quantas flagelações e dores expiatórias não custarão!
Instituições veneradas, sistemas filosóficos, organizações políticas desaparecerão no abismo que tragará todos os fatores do estacionamento e da esterilidade entre os homens, e os corações serão lavados com lágrimas, purificando-se nessas abluções divinas.
A luta será gigantesca; vereis homem contra homem, nação contra nação. A guerra, esse pavoroso gênio do extermínio, alargará todas as suas possibilidades de destruição e suas vozes aterradoras anunciarão outros flagelos, decorrentes da sua ação corrosiva, mas necessária. Então, a humanidade se lembrará daquela voz austera e doce que lhe exprobrava: “Ó Jerusalém, Jerusalém, quanta vez eu te quis abrigar, como a galinha aos seus pintinhos!”
Tais acontecimentos serão atestado de um trabalho de seleção que se fará entre todos os elementos espirituais do orbe terráqueo e o homem, amedrontado, assistirá aos funerais de toda uma civilização que, tendo nas veias do seu vasto organismo o sangue metálico, o ouro corruptor dos seus anseios de espiritualidade, conservador dos instintos animalizados, sangue viciado pelo vírus de um egoísmo sem limites, morrerá intoxicada pelos excessos e pelos desvarios a que se entregou desenfreadamente.
A confusão se consumará e o mundo verá a morte das facções teocráticas, porque todos os templos materiais serão destruídos, todos os sistemas de falsa democracia desaparecerão no vórtice de reações fantásticas, que abalarão as coletividades tomadas de pavor.
Uma onda de destruição pairará sobre a Terra; mas no período das grandes dores uma voz ecoará branda e severa, compassiva e energética para coordenar o princípio do novo ciclo de evolução planetária.
A escória espiritual constituída pelos cegos e surdos voluntários será exilada como raça de seres decaídos, porque não mais a sede maldita de ouro predominará entre os homens e um fraternismo cristão se implantará sob uma só bandeira de paz.
Os Espíritos prepostos a essa grande obra de alevantamento moral do planeta já se acham a postos, entre as sombras da carne, para amparar os fracos e libertar os oprimidos, na realização das promessas evangélicas e para sustentar as almas combalidas nos “ais” do Apocalipse.
Nos Espaços, elaboram-se grandiosos projetos, todavia, na execução dos planos divinos estão eliminadas as noções de tempo e de espaço. Por esse motivo, os que podem descortinar algo do futuro se acham isentos da ideia estreita de pátria e personalidade, e de forma alguma circunscreverão suas palavras. Para os homens, falarão de modo que parecerá vago, mas essa suposição nasce de uma interpretação falsa, porquanto aqueles se acham possuídos da real concepção do Universo e da fraternidade de todas as almas.
O que vos afirmo é que, como no princípio o Verbo estava com Deus, a Terra se formou, tem vivido e viverá com o Verbo, que está com Deus até a consumação dos evos.
O Verbo é a verdade e toda verdade que se tem manifestado no mundo, e que aí se há de manifestar, será a sua voz interpretada pelos corações que com ele se identificam.
Jesus presidiu e presidirá a todas as transformações do planeta e o que se faz mister é que vos identifiqueis com ele. Para esse trabalho superior e dignificante, tendes o Evangelho, sinopse de todos os compêndios do aperfeiçoamento espiritual.
Orai e vigiai, mas, sobretudo, amai muito. Aguardai sem desânimo e sem impaciência a hora que se aproxima. Sede os verdadeiros trabalhadores da seara divina.
Existe formada uma caravana de bons obreiros desde os primórdios do trabalho de evangelização do mundo. Essa caravana jamais se dissolveu e tem aumentado com a incorporação de muitos Espíritos de boa vontade. Integrai-lhe as fileiras.
Reconhecereis os seus membros não através de suas palavras, mas através dos seus atos. Eles não trazem ouro nem prata, porém constituem focos de virtudes espirituais. Não são filhos do século, mas sim da luz e se lhes pode aplicar a palavra do Mestre aos apóstolos bem-amados: “Eu vos envio como ovelhas ao meio dos lobos”.
Esperai, pois, com humildade e pureza, e trazei o vosso coração como um tabernáculo sagrado, onde seja depositada a centelha que restabelecerá a verdade. Nunca vos detenhais nas palavras; procurai descobrir o espírito, a essência de todas as coisas.
Lembrai-vos de que a cada um será dado segundo as suas obras. E que o Espírito da Verdade se derrame sobre todos os corações, amenizando todos os sofrimentos e estabelecendo o reinado da verdadeira paz sobre a Terra.
Bittencourt Sampaio
Reformador — 16 de março de 1934.
Francisco Leite de Bittencourt Sampaio nasceu em Sergipe, na cidade de Laranjeiras, em 11 de fevereiro de 1834, vindo a desencarnar no Rio de Janeiro em 10 de outubro de 1895. Foi magistrado, político, jornalista, poeta e médium receitista no Grupo Confúcio, na capital carioca. Fundou a Sociedade de Estudos Espíritas Deus, Cristo e Caridade em 1876.
Um Anjo da Guarda - Revista Espírita - Allan Kardec, Ano III, Maio de 1860 - Ditados Espontâneos - I
Remorso e arrependimento
Estou contente por ver que vos reunis pela mesma fé e pelo amor de Deus Todo-Poderoso, nosso divino Senhor. Possa ele guiar-vos sempre no bom caminho e cumular-vos com seus benefícios, o que fará se vos tornardes dignos.
Amai-vos sempre uns aos outros, como irmãos; prestai-vos mútuo auxílio, e que o amor do próximo não vos seja uma palavra vazia de sentido.
Lembrai-vos de que a caridade é a mais bela das virtudes, e que, de todas, é a mais agradável a Deus; não só dessa caridade que dá um óbolo aos infelizes, mas a que vos leva a ter compaixão das misérias de nossos irmãos; que vos faz partilhar suas dores morais, aliviar o fardo que os oprime, a fim de lhes tornar a dor menos viva e a vida mais fácil.
Recordai-vos de que o arrependimento sincero obtém o perdão de todas as faltas, tamanha é a bondade de Deus. O remorso nada tem em comum com o arrependimento; o remorso, meus irmãos, já é o prelúdio do castigo. O arrependimento, a caridade, a fé, vos conduzirão às felicidades reservadas aos bons Espíritos.
Ides ouvir a palavra de um Espírito superior, bem-amado de Deus. Recolhei-vos e abri o coração às lições que ele vos dará.
Joanna de Ângelis - Livro Psicologia da Gratidão - Divaldo P. Franco - Cap. 5
A gratidão como roteiro de vida
Transitando por níveis diferentes de discernimento e de lucidez, a conquista da consciência constitui o grande desafio existencial. Pode-se afirmar, sem dúvida, que essa conquista pode ser transformada no sentido, no significado que se deve buscar, proposto por Jung, substituindo a ilusão da felicidade transitória, fugidia, qual se fosse uma delicada miragem que a realidade dilui ao contato direto quando se encontra praticamente ao alcance...
Em razão dos diferentes estágios de consciência fisiológica (comer, dormir, reproduzir-se) ou psicológica (comer, dormir, reproduzir-se e também pensar e agir com discernimento e segurança ético-moral), o sentimento de gratidão apresenta-se também sob a injunção da capacidade de compreender e de sentir o valor da existência terrena.
Em algumas culturas modernas, ainda existe o conceito machista e primário de que a gratidão é um sentimento feminino, não passando de uma emoção específica da mulher, que não deve ser cultivada pelo homem.
Nesse contexto, quando um homem expressa gratidão, dizem, ei-lo em conflito de sexualidade com predominância da anima no comportamento.
O homem, dentro dessa teoria ultrapassada, deve caracterizar-se pela força, entenda-se brutalidade, vigor de sentimentos e quase total ausência das emoções superiores da ternura, da bondade, da abnegação, sendo o sacrifício mais um gesto estoico e másculo do que a superior entrega ao ideal, ao sentido de viver.
Em consequência, essa natural manifestação da emotividade rica de amor é recalcada e desprezada, gerando culpa inconsciente pela instalação do seu oposto, que é a ingratidão.
Numa linguagem poética, a flor e o fruto, o lenho e a sombra são a gratidão da planta à bênção da vida.
A linfa generosa e refrescante é a gratidão da nascente reconhecida ao existir.
O grão que se permite triturar é a gratidão que nele se encontra para se transformar em pão e em dádiva de manutenção da vida.
Tudo em a natureza quanto é belo, nobre, fecundo e estético constitui a sua gratidão por fazer parte do espetáculo da vida.
Porque pensa e sente, o ser humano é constituído pelas emoções que, na fase primária, são agressivo-defensivas e, à medida que logra evoluir, transformam-se em reconhecimento e retribuição. Não se trata de uma devolução equivalente ao que foi recebido, como um pagamento pelo que se lhe ofereceu, mas uma emanação de alegria, de reconforto, pelo fruído e conseguido.
Todo crescimento pessoal de natureza cultural, moral e espiritual deságua inevitavelmente no sentimento da gratidão, da oferta, da participação no conjunto, tornando-se o indivíduo igualmente útil e valioso.
A gratidão individual é uma nota harmônica a contribuir para a sinfonia universal, ampliando-se e tornando--se um sentimento coletivo que proporciona o equilíbrio social e espiritual da Humanidade.
Pensa-se muito em gratidão como instrumento de afeição, o que é correto, no entanto é muito maior o seu significado que deve transformar-se numa forma de viver-se, de entregar-se ao processo de crescimento interior, de realização do progresso.
Não basta, porém, desejar-se a gratidão como flor espontânea que medra em determinados momentos e logo emurchece.
Ela deve ser treinada, conforme já consideramos anteriormente, exercida como forma de comportamento, externando-se em todas as situações geradoras de alegria e de satisfação.
Normalmente, os portadores de transtornos de conduta, os psicóticos e todos aqueles que padecem de psicopatologias fazem-se ingratos, perdem o contato com a realidade dos sentimentos, e volvem ao primarismo egoísta e soberbo das atitudes negativas. É claro que as enfermidades desse porte, como resultado de problemas no arquipélago das neurocomunicações, apresentam carência de serotonina, de noradrenalina, de dopamina, amortecendo-lhes as emoções superiores e castrando as comunicações da afetividade. Tal ocorrência, no entanto, está atrelada ao estágio evolutivo do paciente, às suas construções mentais quando esteve saudável, aos mecanismos de ansiedade e de desconfiança, de fácil irritabilidade e enfado.
O exercício, portanto, da afeição que se gratula e se expressa de maneira gentil, enriquece a emotividade superior, empobrece o egoísmo e desenvolve o Self que se libera de algumas das imposições do ego, facilitando a comunicação no eixo entre ambos...
Nem sempre, porém, o indivíduo sente a gratidão, por motivos variados: infância infeliz, família turbulenta e difícil, relacionamentos malsucedidos, solidão, complexo de inferioridade ou de superioridade que embrutecem os sentimentos, desenvolvendo as ferramentas de autodefesa.
Isso não deve constituir motivo de preocupação. A simples constatação de que não se sente gratidão já é um forma de compreendê-la, de percebê-la em manifestação inicial. A medida que as emoções se expandem e o interrelacionamento pessoal faculta a ampliação do convívio com outras pessoas, aparecem os pródromos do bem viver, da comunhão fraternal, do desinteresse imediatista em oposição às condutas doentias, surgindo espontaneamente o reconhecimento de amor e de ternura à vida e a tudo quanto existe.
Não havendo pessoa alguma que se possa apresentar como autossuficiente, portanto desvinculada de outrem, que não necessite do contributo das demais pessoas individualmente assim como da sociedade em geral, é inevitável que a busca de companhia, o descobrimento dos valores que existem nos outros, a grandeza moral de que muitos dão mostras excelentes despertem o sentimento de gratidão como retribuição mínima ao contexto social no qual se vive.
A psicoterapia da gratidão, preventiva aos males e curadora de conflitos, está presente em todas as obras relevantes da Humanidade, seja naquelas de natureza filosófica ou religiosa, seja nos comportamentos dos grandes construtores da sociedade, mártires ou santos, pensadores ou místicos, legisladores ou profetas... Isso porque ninguém consegue vincular-se a um ideal de engrandecimento pessoal e humanitário sem arrastar outros pela emoção do seu exemplo e da sua bondade para as fileiras da sua trajetória.
O sentimento da gratidão tem natureza psicológica e de imediato aciona o gatilho, sendo transformada em emoção e sensação orgânica.
Quando se experimenta o sabor da gratidão, aumenta-se o desejo de mais servir e melhor contribuir em favor do grupo social em que cada qual se encontra e da Humanidade em geral.
E inevitável, portanto, a presença da gratidão no cerne das vidas humanas.
Manoel Philomeno de Miranda - Livro Sexo e Obsessão - Divaldo P. Franco - Cap. 24
Despedidas
Madre Clara de Jesus não ocultava a satisfação ante o efeito da conferência de esclarecimento e o convite aos membros da Instituição que dirigia, face à necessidade de cumprimento do dever e da responsabilidade que lhes dizia respeito.
Acompanhamos o médium Ricardo, que agora se iria dedicar ao diálogo com as pessoas selecionadas pelo Atendimento fraterno, para o esclarecimento e o socorro que necessitavam. Embora houvesse proferido uma conferência sob a direção da Mentora, não apresentava qualquer sinal de cansaço físico ou mental, antes, pelo contrário, estava com imensa disposição íntima de servir e de atender os nautas que tombaram na travessia das ondas do encapelado oceano da existência ou que se encontravam em grave situação de risco. O sorriso jovial ornava-lhe os lábios e todo ele irradiava simpatia e bondade. Assim se deve atender às criaturas necessitadas, necessitados que, de alguma forma, somos todos nós ante os Celeiros de Bênçãos da Divindade.
A movimentação na Casa era grande, particularmente por Entidades espirituais, à medida que diminuía a presença das pessoas físicas, que retornaram ao ninho doméstico, exceção feita aos que continuavam no labor. Irmão Anacleto, que nos acompanhara à sala de atendimento espiritual em que se encontrava Ricardo, deu-me um sinal para que voltássemos ao recinto onde se procediam aos experimentos mediúnicos e que nos servira de laboratório para o programa que nos trouxera à Terra.
Informou-nos que, logo mais, deveriam ser encerrados os labores pertinentes ao programa de assistência ao padre Mauro, e que desencadeara todo o processo de atendimento a outros Espíritos que se lhe vinculavam.
Esclareceu-nos que aguardaria o encerramento total das atividades humanas na Instituição que nos albergava, a fim de estarem presentes o médium Ricardo e outros amigos que participaram dos labores abençoados, agora em fase final, enquanto o futuro se encarregaria de dar curso ao desdobramento das ações iluminativas a que todos se vinculavam.
Permaneci com Dilermando, o companheiro discreto e quase silencioso que viera conosco, que também se encontrava emocionado ante as ocorrências felizes de que participara.
E enquanto aguardávamos o momento próprio para as despedidas e o encerramento do labor, resolvemos considerar o problema das perseguições que procedem de ambos os lados da Vida contra os espíritas.
– Penso de maneira segura – informou-me o amigo – que inúmeros espíritas atuais são muitos dos cristãos de ontem que se emaranharam em cipoais de desequilíbrio e de malversação de valores morais. Convidados ao Cristianismo através dos tempos, deixaram-se consumir pelas perplexidades e destrambelhes emocionais, resultantes dos instintos e do estado de primarismo em que ainda se encontravam. Assumiram compromissos com a Mensagem de Jesus e, ao invés de utilizá-la para dignificar as criaturas, tomaram-na como mecanismo de autopromoção e de vitória sobre os outros, criando situações muito embaraçosas para si mesmos. Não poucos buscaram os monastérios, conventos e o sacerdócio para melhor servirem, e, atormentados, estabeleceram critérios infelizes e leis arbitrárias para usurpar o poder temporal, que deixaram quando o corpo sucumbiu. Assumiram Paróquias e Ordens, Instituições e Entidades nas quais se consideravam inatingíveis, mas a morte não os poupou, arrebatando-os iludidos e enfermos, para posterior despertar no mundo espiritual em estado lastimável... Por nimiedade do amor de Jesus, foram recambiados ao corpo, com oportunidade de reencontrar a Mensagem que defraudaram, agora renovadora e lógica, a fim de se recuperarem dos gravames e servirem com abnegação, conseguindo a paz que atiraram fora.
“Ainda equivocados, vivendo o ressumar de memórias do passado, após o deslumbramento inicial com a lição espírita que buscaram assimilar, vêm tentando repetir os mesmos descalabros do pretérito, encarcerando-a em fórmulas e em métodos pessoais, a fim de se manterem acima dos demais, ou fazem-se intolerantes, exigentes, críticos contumazes uns dos outros, tornando-se, nas Sociedades Espíritas que dirigem, verdadeiros e arbitrários donos das Instituições, que pretendem sobrepor às demais, como ocorreu nas antigas Paróquias em que se comprometeram...
“Inevitavelmente, aqueles que lhes foram vítimas e que os não perdoaram, inspiram-nos à repetição da insensatez, tentam afastá-los do culto do dever, e quando são abnegados, insistindo no bem proceder e no desincumbir-se com fidelidade dos compromissos, agridem-nos, perseguem-nos, tentam obsediá-los, gerando clima insustentável à sua volta.”
Aquietou-se um pouco, repassou o olhar pela sala onde já se encontravam alguns convidados do irmão Anacleto, e prosseguiu:
– Não me cabe julgamento pejorativo ou depreciativo, mas uma análise em torno do que venho observando em determinados arraiais do Movimento Espírita, quando alguns amigos que deveriam pautar a conduta pela cordura e bondade, pelo devotamento e pela fraternidade, se afastam dessas diretrizes para se tornarem verdadeiros déspotas em relação àqueles que exigem se lhes submetam, ou opinam com ênfase de donos da verdade, exigindo sempre direitos e licenças que negam aos demais. São intolerantes em excesso, acusadores impiedosos, maledicentes contumazes e vivem sempre atormentados pelo mau humor, nesse estado emocional, não obstante divulgando a Doutrina da felicidade e da alegria de viver. É paradoxal que assim se comportem.
“Não é, portanto, de estranhar, que estejam sempre assessorados espiritualmente por Entidades vulgares, pois que se recusam ao conforto da oração, que consideram equipamento dispensável, perversas umas e vingadoras outras, com as quais sintonizam, já que não participam das atividades mediúnicas, que consideram ultrapassadas, e quando o fazem estão ainda buscando o que denominam como fatos de laboratório, tornando-se títeres das suas manobras infelizes.
“Normalmente compadeço-me desses companheiros que permanecem equivocados, divulgando as notícias do Mundo espiritual, em que parecem não acreditar, já que se comportam de maneira inadequada em torno da imortalidade da alma e da justiça das reencarnações. É como se ignorassem que irão despertar com o patrimônio acumulado e as conquistas realizadas, não se podendo furtar à presença da consciência que, então desperta, apresentará os fatos de maneira vigorosa, exigindo reparação, nesse momento impossível, abrindo espaço para a consciência de culpa, suplicando retorno à Terra imediatamente, o que já não será tão fácil de conseguir... Invariavelmente oro por esses amigos e confrades, tentando, não poucas vezes, despertá-los para a realidade que o Espiritismo lhes apresenta e convidando-os à renovação íntima, à humildade, à caridade, à misericórdia em relação ao seu próximo. A desencarnação desses irmãos é sempre dolorosa, porque, em muitas ocasiões, dão-se conta da ocorrência e gostariam de mudar, não havendo mais tempo para consegui-lo.
“Que lhe parece?”
Convidado diretamente ao assunto, não tergiversei em anuir ao pensamento do querido amigo, dizendo-lhe: – Não há muito, publicamos um livro [1] abordando um tema equivalente, em torno da desencarnação de alguns espíritas que não estavam preparados para o retorno.
“O conhecimento do Espiritismo aumenta a responsabilidade do indivíduo, porque dá-lhe os instrumentos hábeis para a transformação íntima para melhor, demonstrando-lhe a continuidade da vida após a morte física e os resultados que advêm da conduta mantida antes da desencarnação. Dessa maneira, a Doutrina tem por meta libertar o ser humano da ignorância e do mal, abrindo espaços para a instalação do bem e do conhecimento que felicita, ao tempo que impulsiona à ação dignificadora, através da qual é possível a paz com a própria consciência. Não basta saber, torna-se imprescindível aplicar de maneira útil o conhecimento que possa auxiliar o próprio como o progresso da sociedade.
Reflexionei um pouco, arrematando ideias, e continuei:
– Também penso que a maioria de nós, os espíritas, encarnados ou desencarnados, transitamos tanto pela Igreja de Roma como por aquelas que se originaram na Reforma Luterana, nas quais deveríamos dignificar a mensagem de Jesus, havendo agido de maneira totalmente contrária. Utilizamo-nos da expansão da fé católica, assim como da protestante, para impor as nossas paixões pessoais e perseguir aqueles que tinham o direito e a liberdade de pensar diferente, acusando-os de hereges ou de adversários da fé, apenas para conseguirmos mais poder, que o túmulo consumiu. Não pequeno número de Espíritos, ao inverso, ali encontraram a oportunidade de crescimento e de iluminação, deixando marcas sublimes na História, vivendo incomparáveis lições de beleza, renúncia e amor, com que conquistaram a Humanidade. Aqueles que tombaram nos delitos foram vítimas de si mesmos, das suas arbitrárias posturas e falácias que nos enovelaram ao despotismo e à loucura que projetaram para o seu futuro espiritual efeitos dolorosos que hoje carpimos e sofremos, embora desejando realmente servir e acertar.
“Acredito também, que os companheiros mais empedernidos e exigentes, ainda enganados quanto à função do Espiritismo, que tem por meta prioritária iluminar aquele que lhe adere às proposituras, antes que cuidar de salvar os outros, são fracassados religiosos que se destacaram na Cúria ou na paróquia, no templo de fé que dirigiram e retornam com a ilusão de que ainda se encontram dominando as mesmas. Somente o tempo, esse trabalhador infatigável, para fazê-los despertar sob os camartelos do sofrimento purificador que a todos nos alcança.
“Merecendo-nos, todos eles, o melhor carinho e respeito, apenas lamentamos o fato de não se estarem beneficiando realmente da Doutrina Espírita, que é o Sol da Nova Era. Bem-aventurado, portanto, todo aquele que, tomando da charrua não olha para trás, conforme o ensinamento do Mestre. Envolvamo-los, a todos, em paz e confiança em Deus, aguardando o momento do despertar de cada um, qual ocorreu conosco mesmos, agora conscientes das responsabilidades que abraçamos em lúcido aproveitamento do tempo que urge...”
No silêncio, que se fez natural, comecei a repassar mentalmente a recente experiência terrena, quando, militando no Movimento Espírita, pude vivenciar as observações apresentadas pelo caro Dilermando. Aqueles eram dias heroicos, que denomino os dias das catacumbas, quando a adoção da Doutrina constituía um verdadeiro desafio às denominadas regras da sociedade, devendo-se pagar um alto preço de renúncia, de silêncio e de abnegação... Mesmo naqueles já distantes dias, em número reduzido que éramos, ao invés de uma legítima união grassava entre nós o escalracho destruidor e perigoso, as suspeitas e acusações infundadas, exigindo serenidade e amor em relação aos irmãos invigilantes. É o ônus que o ser humano paga pela honra de abraçar ideais de enobrecimento e de dignificação espiritual.
Hoje, mudaram, sim, os tempos, sob um aspecto, já não se sofrendo pública discriminação nem perseguição ostensiva, quando se abraça o Espiritismo, no entanto prosseguem os mesmos desafios, e torna-se indispensável a contribuição do testemunho, da fidelidade, por parte daqueles que, tocados pelo Espírito do Cristo e fascinados pela mensagem espírita, adotam a fé racional e pura que os comove e arrebata. Ainda, durante muito tempo, serão necessários os exemplos de coragem e de abnegação em todos os segmentos sociais e áreas do pensamento, por parte dos heróis e dos idealistas, para que as mensagens nobres se implantem nos corações humanos e transformem a sociedade que necessita de diretriz e de segurança para alcançar o objetivo da harmonia e do equilíbrio, da justiça e da paz.
As horas haviam-se passado com celeridade, e quase não me dera conta, face ao mergulho nas reflexões íntimas.
Fui despertado para a realidade, quando o irmão Anacleto esclareceu que ali estavam alguns dos membros do projeto a que nos afeiçoáramos nos últimos dias, tornando-se necessária a adoção de medidas finais para o cometimento.
Madre Clara de Jesus trouxera o médium Ricardo, mediante o parcial desprendimento do corpo físico; Dona Martina se apresentava com o filho, exteriorizando grande alegria, enquanto o jovem padre Mauro expressava confiança em Deus, com o semblante asserenado após as tempestades que sofrera, também se encontrava o amigo Felipe e a nossa caravana.
Pairavam no ar doces harmonias e expectativas de paz. O irmão Anacleto tomou a palavra, e, sinceramente emocionado, agradeceu à veneranda Mentora da Instituição que nos servira de ninho de repouso e de oficina de trabalho. Suas palavras eram ungidas de vibrações de reconhecimento que nos tocavam profundamente o coração. A nobre Entidade sorriu, generosa, e disse-lhe:
– Esta é a Casa de Jesus na Terra, à semelhança de muitas outras, que está aberta para o bem e a caridade sem fronteiras, sem discriminação de crenças ou de ideais, desde que todos voltados para a verdade e para o progresso da Sociedade. Honrados pela oportunidade do serviço, somos nós aqueles que agradecemos, reconhecidos ao Mestre Infatigável que nos tem guiado, e ao Pai Excelso que nos ama. Constituir-nos-á sempre uma bênção poder receber os trabalhadores da última hora na tarefa do amor incondicional. Tenham aqui a continuação do seu lar, sempre aberto para todos os corações.
Dona Martina e Mauro acercaram-se, beijaram a mão do Benfeitor, e a doce genitora disse:
– Sei que muitas lutas aguardam pelo filho bem-amado no processo de restabelecimento interior e de renovação espiritual. No entanto, confiado no Senhor da Vida e na bondade dos Guias espirituais, ele há de alcançar a paz de que necessita para ser feliz. Deus o abençoe, nobre Mentor!
O irmão Anacleto sorriu e passou-lhe a mão sobre a cabeça, por sua vez beijando também a sua destra.
Mauro, sensibilizado até às lágrimas, não pôde traduzir as emoções. Foi o Guia espiritual quem lhe disse:
– Avance em paz, meu filho. Os caminhos da libertação multiplicam-se por toda parte. Jesus, porém, é o Caminho de segurança. Trilhe por ele, certo da vitória final. Não se deixe atormentar pelo que cometeu de errado, antes se inspire na alegria do bem que pode fazer em favor de si mesmo e daqueles a quem, por acaso, haja prejudicado. O Sol aparece após as sombras sempre novo e iridescente. A caridade será o seu celeiro de bênçãos, que você poderá multiplicar ao infinito. Não tenha medo e entregue-se com ardor ao dever. A altitude de uma alma é medida pela sua atitude perante a vida. Ascenda no rumo da Grande Luz, e alcançará a altitude máxima utilizando-se das atitudes saudáveis e nobres.
Sem mais delongas, o Mensageiro explicou:
– Aqui chegamos, há poucos dias, com um grave compromisso em pauta, que a misericórdia de Deus nos permitiu concluir com os melhores propósitos para o futuro. Todos aqueles que se encontravam envolvidos no programa de ação receberam o atendimento adequado e têm diante de si os descortines do futuro, que lhes cabem conquistar. Nunca lhes faltarão o socorro no momento próprio, nem as forças para o prosseguimento das realizações em marcha. O Senhor nunca nos abandona, e da mesma forma como nos tem assistido até hoje, oferece-nos o Seu auxílio para amanhã. Fitando o horizonte iluminado, avancemos todos da treva na direção do fulcro luminoso.
Impedimentos, problemas e dificuldades fazem parte do processo de crescimento espiritual de todos nós, nunca devendo provocar-nos receio ou desvario. São eles que nos ajudam no desenvolvimento dos preciosos recursos que nos jazem adormecidos, esperando os estímulos próprios para se apresentarem. Portanto, agradeçamos-lhes a presença em nosso caminho e não nos detenhamos, quando venham a surgir, mesmo que de forma ameaçadora. Quem receia a luta e se detém a pensar demoradamente nela, já perdeu excelente oportunidade de avanço. Nem a intemperança, a precipitação, muito menos o excesso de cuidados para o combate ou o acúmulo de reflexões para a luta. Oportunidade é bênção que deve ser aproveitada com sabedoria.
“Aproxima-se o momento de retornar aos quefazeres habituais em outra Esfera de ação, porém sob o comando do Mestre Jesus. Agradecemos a todos que cooperaram conosco, oferecendo-nos apoio e bondade, serviço e companheirismo.”
Demonstrando emoção acentuada, na qual transpareciam a felicidade e o anseio por mais servir, o Mentor orou:
Mestre Incomparável!
Ensinaste-nos que tudo quanto pedíssemos ao Pai orando, Ele nos atenderia.
Pedimos e fomos atendidos. Agora, quando encerramos o compromisso que nos confiaste, tudo eram expectativas, embora a certeza dos resultados opimos.
Confiados no Teu auxílio, não receamos enfrentar o mal nas Trevas, nem nos afligimos ante as ameaças dos maus, que ainda não travaram contato contigo.
Investiste em nós, e apesar de sermos servos imperfeitos, procuramos corresponder à confiança, não obstante, reconhecemos, pudéssemos haver sido melhores servidores, conseguindo desobrigar-nos com respeito e devotamento do dever que nos foi conferido.
Os irmãos equivocados receberam o nosso melhor carinho, sem qualquer reproche, conforme Tu fazias, e agora estão sendo encaminhados para novos tentames no futuro corpo físico ou no prosseguimento da reencarnação em que alguns se encontram.
Em tudo, foi possível realizar o melhor, porque não Te afastaste de nós em momento algum, inspirando-nos e orientando-nos em todos os passos.
Agora, quando a tarefa que nos coube, se encerra, desejamos louvar-Te e agradecer-Te, suplicando-Te que prossigas amparando-nos nos programas do porvir, porque somente Tu possuis o poder, a glória e a vida eterna.
Despede-nos, pois, Amigo Excelso, abençoando-nos.
Quando silenciou, todos tínhamos os olhos orvalhados de lágrimas que não se atreviam a escorrer pela face.
Despedimo-nos dos amigos queridos, e, após repassarmos os olhos pelo recinto onde coletamos muitas dádivas e aprendemos inolvidáveis lições, saímos na direção da porta principal acolitados pela Mentora e o seu médium, mais alguns outros amigos, e rumamos para a nossa Comunidade espiritual.
Olhando a Terra, que diminuía a distância, na proporção que avançávamos, podia ver a luz do Sol no outro hemisfério dando-lhe uma forma e um curioso aspecto lunar. Ali, no planeta querido, estavam as nossas aspirações futuras, permaneciam muitos afetos que a morte não diluíra e aguardavam em forma de expectativas para as nossas possibilidades de retorno futuro para o autoaprimoramento espiritual.
André Luiz - Livro Nos Domínios da Mediunidade - Chico Xavier - Cap. 29 - Instrutor Áulus
Anotações em serviço
De retorno ao lar de Áulus, ocorreu-me auscultar-lhe a opinião com respeito a diversos problemas, sempre vivos ao redor de quantos se dedicam ao estudo de questões mediúnicas, na atualidade terrestre.
Em companhia do orientador, havíamos tocado de relance, mas seguramente, palpitante material, que nos facultara excelente curso educativo.
Examináramos, de perto, entre encarnados e desencarnados, a assimilação de correntes mentais, a psicofonia, a possessão, o desdobramento, a clarividência, a clariaudiência, as forças curativas, a telepatia, a psicometria e a materialização, além de alguns dos temas de importância central da mediunidade, como sejam o poder da prece a fixação mental, a emersão do subconsciente, a licantropia, a obsessão, a fascinação, a lei de causa e efeito, o desdobramento no leito de morte e as energias viciadas, tudo isso sem necessidade de recurso a complicações terminológicas.
Não obstante nosso respeito à ciência humana, indagávamos intimamente por que motivo tanto embaraço verbalístico em sucessos comuns a todos, quando a simplificação seria bem mais interessante. Os metapsiquistas chamavam “criptestesia” à sensibilidade oculta, críptica, e batizaram o conhecimento de fatos sem o concurso dos sentidos carnais com a palavra “metagnomia”… Dividiam os médiuns (sujets, na terminologia de alguns investigadores) em duas categorias, os de “faculdades psicológicas inabituais” e os de “faculdades mecânico-físico-químicas”… E por aí afora…
Por que não aplainar tais dificuldades de expressão? Afinal — refletia eu —, a mediunidade, na essência, consulta o interesse da Humanidade inteira…
Acalentava tais pensamentos, quando Áulus, observando-me, por certo, a crítica meditada, considerou:
— A mediunidade, indubitavelmente, é patrimônio comum a todos, entretanto, cada homem e cada grupo de homens no mundo registram-lhe a evidência a seu modo. De nossa parte, é possível abordá-la com a simplicidade evangélica, baseados nos ensinamentos claros do Mestre, que esteve em contato incessante com as potências invisíveis ao homem vulgar, curando obsidiados, levantando enfermos, conversando com os grandes instrutores materializados no Tabor, ouvindo os mensageiros celestiais em Getsemani e voltando Ele próprio a comunicar-se com os discípulos, depois da morte na cruz, entretanto, a ciência terrestre, por agora, não pode analisá-la sem o rigor da experimentação.
O Assistente fez ligeira pausa e prosseguiu:
— Não importa que os aspectos da verdade recebam vários nomes, conforme a índole dos estudiosos. Vale a sinceridade com que nos devotamos ao bem. O laborioso esforço da Ciência é tão sagrado quanto o heroísmo da fé. A inteligência, com a balança e com a retorta, também vive para servir ao Senhor. Esmerilhando os fenômenos mediúnicos e catalogando-os, chegará ao registro das vibrações psíquicas, garantindo a dignidade da Religião na Era Nova…
Não desejava, porém, situar a conversação nos domínios científicos. Nosso aprendizado atingia o marco final. Aquela era a última noite em que podíamos desfrutar a sábia companhia do orientador e propunha-me ouvi-lo quanto à mediunidade em si.
Por essa razão, provoquei o diálogo que passarei a desdobrar.
— É justo que a Ciência não examine o campo mediúnico por nosso prisma — aleguei. — A lógica e a experimentação positiva caminham por estradas muito diferentes daquelas que conhecemos no itinerário da intuição. No entanto, nas próprias correntes do Espiritualismo, vemos a mediunidade atormentada pelas mais diversas interpretações…
— Que pretende você dizer, André? — falou o instrutor, com brandura.
— Lembro-me daqueles irmãos que acoimam os médiuns de insanos e loucos, aconselhando a segregação dos estudantes da verdade em templos de iniciação, a deliberada distância dos sofredores e dos ignorantes que contamos no mundo por legiões inumeráveis…
— Ah! sim, o santuário de iniciação religiosa, qualquer que ele seja, é para nós venerável como posto avançado de distribuição da luz espiritual; entretanto, os que fogem dentro dele à lei da cooperação, isolam-se na torre de marfim do orgulho que lhes é próprio fixando-se em discussões brilhantes e estéreis. Tais companheiros assemelham-se a viajantes agrupados em perigosa ilha de repouso, enquanto os nautas corajosos do bem suam e sofrem na descoberta de rotas seguras para o continente da fraternidade e da paz. Descansam sob o arvoredo, confortados pela caça abundante e pela água refrescante, pesquisando a grandeza do céu ou filosofando sem proveito, mas sempre chega um dia em que a maré brava lhes invade o provisório domicílio, arrebatando-os ao mar alto, para que recomecem a experiência que lhes é necessária.
— Muitos estudiosos da nossa Esfera de realização no mundo asseveram que será lícito cultivar tão somente o convívio com os gênios superiores da Espiritualidade, relegando as manifestações mediúnicas vulgares à fossa da obsessão e da enfermidade, que, na opinião deles, devem ser entregues a si mesmas, sem qualquer atenção de nossa parte.
— Isso é comodismo sob o rótulo de cultura. Não podemos negar que a obsessão seja moléstia da mente, contudo, poderá a Medicina curar alguém à força de usar o esquecimento do dever que lhe cabe? Os gênios realmente superiores da Espiritualidade jamais abandonam os sofredores e os pequeninos. À maneira do Sol que clareia o palácio e a furna, com o mesmo silencioso devotamento auxiliam a todos, em nome da Providência.
— Há companheiros no Espiritualismo que não suportam qualquer manifestação primitivista no terreno mediúnico. Se o médium não lhes corresponde à exigência, revelando-se em acanhado círculo de compreensão ou competência, afastam-se dele, agastadiços, categorizando por fraude ou mistificação valiosas expressões da fenomenologia.
Áulus sorriu e comentou:
— Serão esses, provavelmente, os campeões do menor esforço. Ignoram que o sábio não dispensou a alfabetização no começo da existência e, decerto, amaldiçoam a criancinha que não saiba ler. Semelhantes amigos, André, olvidaram o socorro que receberam da escola primária e, solicitando facilidades, à maneira do morfinômano que reclama entorpecentes, viciam-se em atitudes deploráveis à frente da vida, de vez que tudo exigem para si, desrespeitando a obrigação de ajudar aos que ainda se encontram na retaguarda.
— Há quem diga que o Espiritismo age erradamente, abrigando os desequilibrados e os enfermos, porque, com isso, oferece a impressão de uma Doutrina que, à força de ombrear com a loucura para socorrê-la, vai convertendo seus templos de oração em vastos refúgios de alienados mentais.
— Simples disparate dos que desertam do serviço ao próximo. A Medicina não sofre qualquer diminuição por prestar auxílio aos enfermos. Honrada pelos hospitais em que atua, engrandece-se à medida que se agiganta na obra assistencial aos doentes. O Espiritismo não pode responsabilizar-se pelos desequilíbrios que lhe pedem amparo, tanto quanto não podemos imputar ao médico a autoria dos males que lhe requisitam a intervenção. Aliás, temos nele o benfeitor da mediunidade torturada e da mente doentia, propiciando-lhes o bálsamo e o esclarecimento indispensáveis ao reajuste. É muito fácil inventar teorias que nos exonerem do dever de servir, e muito difícil aplicar os princípios, superiores que esposamos, utilizando-nos, para isso, de nossa cabeça e de nossas próprias mãos. Se a recuperação do mundo e de nós mesmos estivesse circunscrita a lindas palavras, o Cristo, que nos constitui o padrão de todos os dias, não precisaria ter vindo ao encontro dos necessitados da Terra. Bastaria enviasse proclamações angélicas à Humanidade, sem padecer-lhe, de perto, a incompreensão e os problemas. Felizmente, porém, os espiritualistas conscientes e sensatos estão aprendendo que o nosso escopo é reviver o Evangelho em suas bases simples e puras e que o Senhor não nos concede o tesouro da fé apenas para que possamos crer e falar, mas também para que estejamos habilitados a estender o bem, começando de nós mesmos.
— Há igualmente quem afirme que em todos os processos da obsessão funciona, implacável, a lei de causa e efeito, e que, por isso, não vale interferir em favor da mediunidade atormentada…
— Mera argumentação do egoísmo bem nutrido. Isso seria o mesmo que abandonar os doentes, sob o pretexto de que são devedores perante a Lei. Todos lutamos por ressarcir compromissos do pretérito, compreendendo que não há dor sem justificação; e se sabemos que só o amor puro e o serviço incessante são capazes de garantir-nos a redenção, uns à frente dos outros, como desprezar o companheiro que sofre, em nome de princípios a cujo funcionamento estamos submetidos por nossa vez? Hoje, é o vizinho que amarga as consequências de certas ações efetuadas a distância, amanhã seremos nós a colher os resultados de gestos que nos desabonavam o passado e que agora nos afligem o presente. Se falece a cooperação entre as vítimas do espinheiro, decerto será muito mais longa e difícil para cada um a tarefa salvadora.
— Não faltam igualmente os que supõem não devamos atender a qualquer problema de mediunidade complexa, porque, dizem eles, cada criatura deve procurar a verdade por si. Admitem que as religiões não passam de muletas e que a ninguém assiste a faculdade de socorrer-se de instrutores em assuntos da própria orientação.
Áulus esboçou um gesto de bom humor e redarguiu:
— Isso seria suprimir a escola e vilipendiar o amor imanente na Criação Inteira. A religião digna, qualquer que seja o templo em que se expresse, é um santuário de educação da alma, em seu gradativo desenvolvimento para a imortalidade. Imaginemos um país imenso, em que milhões de crianças fossem relegadas ao abandono pelos pais e mestres, sob a alegação de que lhes cabe o dever de procurar a virtude e a sabedoria por si, furtando-se-lhes toda espécie de apoio moral e cultural… Imaginemos um campo enorme superlotado de enfermos, aos quais eminentes médicos recomendassem procurar a saúde por si mesmos, confiando-se à própria sorte… Onde estaria a lógica de semelhantes medidas? A interdependência mora na base de todos os fenômenos da vida. O forte é tutor do fraco. O sábio responsabilizar-se-á pelo ignorante. A criancinha na Terra não prescinde do concurso dos pais.
O instrutor fez ligeiro intervalo e prosseguiu:
— É preciso considerar que nem todos possuem idêntica idade espiritual e que a Humanidade Terrestre, em sua feição de conjunto, ainda se encontra tão longe da angelitude quanto a agressiva animalidade ainda está distante da razão perfeitamente humana. É muito cedo para que o homem se arrogue o direito de apelar para a Verdade Total… Por agora, é imprescindível trabalhe intensivamente, com devoção ardente e profunda ao bem, para atingir mais amplo discernimento das realidades fragmentárias ou provisórias que o cercam na vida física e, considerada a questão nesse aspecto, estejamos convictos de que a ausência de escolas do espírito ou a supressão dos instrutores constituiriam a multiplicação dos hospícios e o rebaixamento do nível moral, porque sem o apelo à dignificação da individualidade, em processo de crescimento mental e de sublimação no tempo, não poderíamos contar senão com a estagnação nas linhas inferiores da experiência.
Havíamos, contudo, atingido o fim da viagem.
O lar-santuário em que o Assistente residia levantava-se, agora, ao nosso olhar.
— Trabalhemos com bom ânimo — disse-nos ainda o orientador —; o tempo conjugado com o serviço no bem é o alicerce de nossa vitória.
No dia imediato, Áulus deveria partir no rumo de elevada missão a distância. Por isso, prometeu-nos o abraço de adeus para a manhã seguinte.
Hammed - Livro Os Prazeres da Alma - Francisco do Espírito Santo Neto - Cap. 22
Humildade
Na época de Jesus Cristo, os fariseus – elite religiosa judaica, que vivia na estrita observância das escrituras mosaicas e da tradição oral – e da mesma forma, no tempo de Buda, os brâmanes – sacerdotes que consolidaram sua hegemonia social juntamente com o sistema de castas -, tanto uns como outros foram acusados de formalistas e hipócritas. Eram reconhecidos por suas ricas e pomposas vestimentas e por não viverem de acordo com o que pregavam.
Todas as almas veneráveis da humanidade possuíam e possuem plena consciência de que falar de humildade não torna ninguém humilde. Realmente, a humildade nada tem a ver com a presença ou ausência de bens materiais, mas com a forma de comportamento íntimo.
Na atualidade, ainda se associa humildade com inferioridade, submissão e pobreza; no entanto, ela está relacionada com distinção, gentileza, lucidez, graciosidade e simplicidade. Entre todas as virtudes, somente a humildade não realça a si mesma, porque o verdadeiro humilde não acredita que o seja.
O humilde examina e pondera o orgulhoso porque um dia também o foi; o arrogante, porém, como ainda não conquistou a humildade, não sabe apreciar e valorizar a simplicidade. Aliás, só quem tem plena consciência do seu valor pessoal é que não precisa se exaltar; quem não tem exibe, de maneira ousada e insolente, sua capacidade, poder, prestígio ou cultura.
Os indivíduos humildes realçam a simplicidade das coisas, dada a facilidade surpreendente de apreender e organizar os dados de uma situação. Eles penetram na essência das coisas, pois desenvolveram a habilidade de “fazer a mente silenciar”. É no “silêncio mental” que os ciclos habituais ou condicionados das regras e normas preconceituosas cessam, que os padrões de pensamentos inadequados são interrompidos, para que haja a internalização da inteligência universal em nós.
Em algumas correntes do budismo, há uma equivocada interpretação do nirvana. Elas tomam como verdade a crença de que a meta espiritual do homem é alcançar um estado de completa quietude, que o levará à supressão do desejo e da consciência individual. Na realidade, o termo nirvana, quando entendido em sua significação mais profunda, deve ser traduzido como “a união definitiva da criatura com o Criador”, nunca como sinônimo de estático silêncio interior, onde impera o “não-ser”.
Os humildes aprenderam, com a introspecção, a fazer de si mesmos um “canal ou espaço transcendente”, por onde flui silenciosamente a inteligência universal.
Quando o eminente educador Allan Kardec questiona os Espíritos Superiores: “Qual a fonte da inteligência?”, eles respondem: “Já o dissemos: a inteligência universal”.
A inteligência Universal é o instrumento pelo qual retomamos a conexão com a Causa Primeira. Ela não está confinada a nenhuma religião; ao contrário, é acessível a todos os seres, contudo só se deixa penetrar por aqueles que têm “simplicidade de coração e humildade de espírito”. Por meio de seus recursos infinitos, recebemos as mais sublimes contribuições – psicológicas, filosóficas, artísticas, científicas, religiosas -, alargando a compreensão da vida dentro e fora de nós mesmos.
Hammed
Fonte: Os Prazeres da Alma-pdf
VÍDEO:
Cap. 22 - Humildade - Os prazeres da alma - Hammed