sábado, 1 de fevereiro de 2020

André Luiz - Livro No Mundo Maior - Chico Xavier - Cap. 11 - Sexo



André Luiz - Livro No Mundo Maior - Chico Xavier - Cap. 11


Sexo


Ainda sob a impressão desagradável colhida do drama de Cecília, acompanhei Calderaro a curioso centro de estudos, onde elevados mentores ministram conhecimentos a companheiros aplicados ao trabalho de assistência na Crosta.

— Não é templo de revelações avançadas informou o instrutor —, mas instituição de socorro eficiente às ideias e empreendimentos dos colaboradores militantes nas oficinas de amparo espiritual; cátedra de amizade, criada para discípulos a quem o esforço perseverante enobrece.

Ante minha indagação de aprendiz, continuou, bondoso:

— Esses amigos reúnem-se uma vez por semana, a fim de ouvirem mensageiros autorizados no tocante a questões que interessam de perto nosso ministério de auxílio aos homens. Estimo teu comparecimento hoje, porquanto o emissário da noite comentará problemas atinentes ao sexo. Uma vez que estudas, nestes dias, os enigmas da loucura, com tempo curto para a realização de experiências diretas, a palestra vem ao encontro de nossos desejos.

Não foi possível maior conversação preliminar.

O Assistente observou que os trabalhos já estariam iniciados; seguimos, por isso, sem maiores delongas. Com efeito, encontramos a assembleia em plena função. Pouco mais de duas centenas de companheiros do nosso Plano ouviam, atenciosos, iluminado condutor de almas.

Sentamo-nos, por nossa vez, respeitosamente à escuta.

O portador da sabedoria, cercado de viva luminosidade, prelecionava sem afetação. Palavra bem timbrada, penetrando-nos o íntimo pela inflexão da sinceridade, falava, simples:

— “No exame das causas da loucura, entre individualidades, sejam encarnadas, sejam ausentes da carne, a ignorância quanto à conduta sexual é dos fatores mais decisivos.

“A incompreensão humana dessa matéria equivale a silenciosa guerra de extermínio e de perturbação, que ultrapassa, de muito, as devastações da peste referidas na história da Humanidade. Vocês sabem que só a epidemia de bubões, no século VI de nossa era, chamada “peste de Justiniano”, eliminou quase cinquenta milhões de pessoas na Europa e na Ásia… Pois esse número expressivo constitui bagatela, comparado com os milhões de almas que as angústias do sexo dilaceram todos os dias. Problema premente este, que já ensandeceu muitos cérebros de escol, não podemos atacá-lo a tiros de verbalismo, de fora para dentro, à moda dos médicos superficiais, que prescrevem longos conselhos aos pacientes, tendo, na maioria das vezes, absoluto desconhecimento da enfermidade.

“Agora, que nos distanciamos das imposições mais rijas da forma, sem nos libertarmos, contudo, dos ascendentes fundamentais de suas leis, que ainda nos subordinam as manifestações, compreendemos que os enigmas do sexo não se reduzem a meros fatores fisiológicos. Não resultam de automatismos nos campos de estrutura celular, quais aqueles que caracterizam os órgãos genitais masculinos e femininos, em verdade substancialmente idênticos, diferençando-se unicamente na expressão de sinalética. A este respeito formulamos conceitos mais avançados. Se aí residem forças procriadoras dominantes, atendendo aos estatutos da natureza terrestre, reguladores da vida física, temos, na inquietação sexual, fenômeno peculiar ao nosso psiquismo, em marcha para superiores zonas da evolução.

“Doloroso é, porém, verificar a desarmonia em que se afundam os homens, com sombrios reflexos nas Esferas imediatas à luta carnal. Inúmeros movimentos libertadores estalaram através dos séculos, no anseio da vida melhor. Guerras sangrentas de povo contra povo, revoluções civis espalhando padecimentos inomináveis, têm sido alimentadas na Terra, no curso do tempo, em nome de princípios regeneradores, segundo os quais se abrem novas conquistas do direito do mundo; no entanto, o cativeiro da ignorância, no campo sexual, continua escravizando milhões de criaturas.

“Inútil é supor que a morte física ofereça solução pacífica aos espíritos em extremo desequilíbrio, que entregam o corpo aos desregramentos passionais. A loucura, em que se debatem, não procede de simples modificações do cérebro: dimana da desassociação dos centros perispiríticos, o que exige longos períodos de reparação.

 “Indiscutivelmente, para a maioria dos encarnados, a fase juvenil das forças fisiológicas representa delicado estádio de sensações, em virtude das leis criadoras e conservadoras que regem a família humana; isto, porém, é acidente e não define a realidade substancial. A sede do sexo não se acha no corpo grosseiro, mas na alma, em sua sublime organização.

“Na Esfera da Crosta, distinguem-se homens e mulheres segundo sinais orgânicos, específicos. Entre nós, prepondera ainda o jogo das recordações da existência terrena, em trânsito, como nos achamos, para as regiões mais altas; nestas sabemos, porém, que feminilidade e masculinidade constituem característicos das almas acentuadamente passivas ou francamente ativas.

“Compreendemos, destarte, que na variação de nossas experiências adquirimos, gradativamente, qualidades divinas, como sejam a energia e a ternura, a fortaleza e a humildade, o poder e a delicadeza, a inteligência e o sentimento, a iniciativa e a intuição, a sabedoria e o amor, até lograrmos o supremo equilíbrio em Deus.

“Convictos desta realidade universal, não podemos esquecer que nenhuma exteriorização do instinto sexual na Terra, qualquer que seja a sua forma de expressão, será destruída, senão transmudada no estado de sublimação. As manifestações dos próprios irracionais participam do mesmo impulso ascensional. Nos povos primitivos; a eclosão sexual primava pela posse absoluta. A personalidade integralmente ativa do homem dominava a personalidade totalmente passiva da mulher.

“O trabalho paciente dos milênios transformou, todavia, essas relações. A mulher-mãe e o homem-pai deram acesso a novos sopros de renovação do espírito. Com bases nas experiências sexuais, a tribo converteu-se na família, a taba metamorfoseou-se no lar, a defesa armada cedeu ao direito, a floresta selvagem transformou-se na lavoura pacífica, a heterogeneidade dos impulsos nas imensas extensões de território abriu campo à comunhão dos ideais na pátria progressista, a barbárie ergueu-se em civilização, os processos rudes da atração transubstanciaram-se nos anseios artísticos que dignificam o ser, o grito elevou-se ao cântico; e, estimulada pela força criadora do sexo, a coletividade humana avança, vagarosamente embora, para o supremo alvo do divino amor. Da espontânea manifestação brutal dos sentidos menos elevados a alma transita para gloriosa iniciação.

“Desejo, posse, simpatia, carinho, devotamento, renúncia, sacrifício, constituem aspectos dessa jornada sublimadora. Por vezes, a criatura demora-se anos, séculos, existências diversas de uma estação a outra. Raras individualidades conseguem manter-se no posto da simpatia, com o equilíbrio indispensável. Muito poucas atravessam a província da posse sem duelos cruéis com os monstros do egoísmo e do ciúme, aos quais se entregam desvairadamente. Reduzido número percorre os departamentos do carinho sem se algemarem, por largo trecho, aos gnomos do exclusivismo. E, às vezes, só após milênios de provas cruciantes e purificadoras, consegue a alma alcançar o zênite luminoso do sacrifício para a suprema libertação, no rumo de novos ciclos de unificação com a Divindade.

“O êxtase do santo foi, um dia, mero impulso, como o diamante lapidado — gota celeste eleita para refletir a claridade divina — viveu na aluvião, ignorado entre seixos brutos. Claro está que, assim como se submete o diamante ao disco do lapidário, para atingir o pedestal da beleza, assim também o instinto sexual, para coroar-se com as glórias do êxtase, há que dobrar-se aos imperativos da responsabilidade, às exigências da disciplina, aos ditames da renúncia.

“Estas conclusões, contudo, não nos devem induzir a programas de santificação compulsória no mundo carnal. Nenhum homem conseguiria negar a fase da evolução em que se encontra. Não podemos exigir que o hotentote inculto envergue a beca de um catedrático e se ponha, de um dia para outro, a ensinar o Direito Romano. Irrisório seria, pois, reclamar do homem de evolução mediana a conduta do santo. A Natureza, representação da Inesgotável Bondade, é mãe benigna que oferece trabalho e socorro a todos os filhos da Criação. Sua determinação de amparar-nos é sempre tanto mais forte, quanto mais decidido é o nosso propósito de progredir na direção do Bem Supremo.

“Não desejamos, portanto, preconizar no mundo normas rigoristas de virtude artificial, nem favorecer qualquer regime de relações inconscientes. Nossa bandeira é, sobretudo, a do entendimento fraternal. Trabalhemos para que a luz da compreensão se faça entre os nossos amigos encarnados, a fim de que as angústias afetivas não arrojem tantas vítimas à voragem da morte, intoxicadas de criminosas paixões.

 “Devidos à incompreensão sexual, incontáveis crimes campeiam na Terra, determinando estranhos e perigosos processos de loucura, em toda parte.

“De quando em quando, uma que outra vítima procura os hospitais de alienados, submete-se ao tratamento médico, como o operário que traz à oficina de consertos seu instrumento danificado; nos hospícios encontramos, porém, tão somente aqueles que desgalgaram até ao fundo do abismo, amargurados e vencidos. Milhões de irmãos nossos se conservam semiloucos nos lares ou nas instituições; são os companheiros incapazes do devotamento e da renúncia, a submergirem, pouco a pouco, no caliginoso tijuco das alucinações… De mente desvairada, fixa no socavão da subconsciência, perdem-se no campo dos automatismos inferiores, obstinando-se no conservarem deprimentes estados psíquicos. O ciúme, a insatisfação, o desentendimento, a incontinência e a leviandade alastram terríveis fenômenos de desequilíbrio.

“Inquietantes quadros mentais se pintam na Terra, compelindo-nos a estafante serviço socorrista, de modo a limitar o círculo de infortúnio e de pavor dos que se lançam, incautos, a temerárias aventuras do sentimento animalizado.

“Não solucionaremos tão complexo problema do mundo simplesmente à força de intervenção médica, embora seja admirável a contribuição da Ciência no terreno dos efeitos, sem atingir, contudo, a intimidade das causas. A personalidade não é obra da usina interna das glândulas, mas produto da química mental.

“A endocrinologia poderá fazer muito com uma injeção de hormônios, à guisa de pronto-socorro às coletividades celulares, mas não sanará lesões do pensamento. A genética, mais hoje, mais amanhã, poderá interferir nas câmaras secretas da vida humana, perturbando a harmonia dos cromossomos, no sentido de impor o sexo ao embrião; todavia, não atingirá a zona mais alta da mente feminina ou masculina, que manterá característicos próprios, independentemente da forma exterior ou das convenções estatuídas. A medicina inventará mil modos de auxiliar o corpo atingido em seu equilíbrio interno; por essa tarefa edificante, ela nos merecerá sempre sincera admiração e fervente amor; entretanto, compete a nós outros praticar a medicina da alma, que ampare o Espírito enleado nas sombras…

“É mister acender, em derredor de nossos irmãos encarnados na Terra, a luz da compaixão fraterna, traçando caminhos definidos à responsabilidade individual. Haja mais amor ante os vales da demência do instinto, e as derrocadas cederão lugar a experiências santificantes.

“Como fazer valer o abençoado serviço do médico à vítima da angústia sexual, se tem a defrontá-lo, vibrante, a hostilidade da família? como salvar doentes da alma, numa instituição de benemerência, se o organismo social esmaga os enfermos com todo o peso de sua opinião e de sua autoridade? Naturalmente, constituiria pieguice rogar à sociologia a transformação imediata de seus códigos, ou impor à sociedade humana certas normas de tolerância, incompatíveis com as suas necessidades de defesa. Mas podemos manter louvável serviço de compreensão mais ampla, melhorar as disposições dos nossos amigos encarnados na Crosta do Mundo e despertá-los lentamente para a solução que nos interessa a todos.

“O amor espiritualizado, filho da renúncia cristã, é a chave capaz de abrir as portas do abismo para onde rolaram e rolam milhares de criaturas, todos os dias.

“Distribuamos a bênção do entendimento entre os homens; estendamos mão forte a todos os Espíritos que se encontram prisioneiros do distúrbio das sensações, fazendo-lhes sentir que as oficinas do trabalho renovador permanecem abertas a todos os filhos de Deus, aperfeiçoando-lhes os sentimentos, sublimando-lhes os impulsos, dilatando-lhes a capacidade espiritual.

“Lembremos aos corações desalentados que tal é o sexo em face do amor, quais são os olhos para a visão, e o cérebro para o pensamento: não mais do que aparelhamento de exteriorização. Erro lamentável é supor que só a perfeita normalidade sexual, consoante as respeitáveis convenções humanas, possa servir de templo às manifestações afetivas. O campo do amor é infinito em sua essência e manifestação. Insta fugir às aberrações e aos excessos; contudo, é imperioso reconhecer que todos os seres nasceram no Universo para amar e serem amados. Por vezes, vigoram para muitos deles, temporariamente, os imperativos da prova benéfica, os deveres do estatuto expiatório, as exigências do serviço especializado, em que estudantes, devedores e missionários se obrigam a longas fases de fome e sede do coração. Isso, porém, não representa obstáculo ao amor. Jesus não partilhou o matrimônio normal na Terra, e, no entanto, a família de seu coração cresce com os dias; suas forças não geraram formas passageiras nos Círculos carnais, e, contudo, suas energias fecundantes renovaram a civilização, transformando-lhe o curso, prosseguindo, até hoje, no aprimoramento do mundo. Simbologia sublime transparece da conduta do Mestre que, desse modo, se inclinou para os vencidos da convenção humana, solitários e humilhados, fazendo-lhes ver que é possível cooperar na extensão do Infinito Bem, amando e abnegando-se, com exclusão do egoísmo e do propósito inferior de serem amados, segundo os caprichos próprios.

“A construção da felicidade real não depende do instinto satisfeito. A permuta de células sexuais entre os seres encarnados, garantindo a continuidade das formas físicas em processo evolucionário, é apenas um aspecto das multiformes permutas de amor. Importa reconhecer que o intercâmbio de forças simpáticas, de fluidos combinados, de vibrações sintonizadas entre almas que se amam, paira acima de qualquer exteriorização tangível de afeto, sustentando obras imperecíveis de vida e de luz, nas ilimitadas Esferas do Universo.

“Desenvolvamos, pois, carinhosa assistência aos que desesperam no mundo, sentindo-se na transitória condição de deserdados. Ensinemo-los a libertar a mente das malhas do instinto, abrindo-lhes caminho aos ideais do amor santificante, recordando-lhes que fixar o pensamento no sexo torturado, com desprezo dos demais departamentos da realização espiritual, através do cosmo orgânico, é estacionar, inutilmente, no trilho evolutivo; é entregar-se, inerme, à influência de perigosos monstros da imaginação, quais o despeito e a inveja, o desespero e a amargura, que abrem ruinosas chagas na alma e que cominam ao exclusivismo, pena que pode avultar até à loucura e à inconsciência. Convidemo-los a rasgar horizontes mais longes no coração. O amor encontrará sempre mundos novos. E para que tais descobertas se coroem de luz divina, bastará à criatura o abandono da ociosidade, que por si mesma combaterá a nefanda ignorância. Dentro de cada um de nós esplende, sem desmaio, a claridade libertadora, no pensamento de renovação para o bem comum que devemos cultivar e intensificar em cada dia da vida.

“O cativeiro nos tormentos do sexo não é problema que possa ser solucionado por literatos ou médicos a agir no campo exterior: é questão da alma, que demanda processo individual de cura, e sobre esta só o Espírito resolverá no tribunal da própria consciência. É inegável que todo auxílio externo é valioso e respeitável, mas cumpre-nos reconhecer que os escravos das perturbações do campo sensorial só por si mesmos serão liberados, isto é, pela dilatação do entendimento, pela compreensão dos sofrimentos alheios e das dificuldades próprias, pela aplicação, enfim, do “amai-vos uns aos outros”, assim na doutrinação, como no imo da alma, com as melhores energias do cérebro e com os melhores sentimentos do coração.”

Notei que a preleção terminara em meio ao respeito geral.

A palavra do mensageiro fascinara-me. Aquelas noções de sexologia eram novas para mim. Não eram repetições de compêndios descritivos, não eram fruto de frias observações de cientistas e escritores, preocupados em armar ao efeito com palavras balofas. Nasciam do verbo inflamado de amor fraternal de um orientador dedicado às necessidades de seus irmãos ainda frágeis e menos felizes.

Fizera-se, em torno, certa movimentação. Compreendi que os presentes poderiam formular perguntas relativas ao tema da noite, e, com efeito, fizeram-se várias indagações, com respostas preciosas, por elucidativas e edificantes.

O inquérito educativo continuava proveitoso, quando um companheiro ventilou certa questão que me aguçou a curiosidade.

— Venerável instrutor — disse, reverente —, nos últimos tempos, na Terra, os psicologistas encarnados, em número considerável, esposaram os princípios freudianos como bases de investigação dos distúrbios da alma. Para o grande médico austríaco, quase todas as perturbações psíquicas se radicam no sexo desviado. Alguns discípulos dele, porém, modificaram-lhe algo as teorias. Corrigindo a tese das alucinações eróticas que a psicanálise aplicou largamente às próprias crianças, no estudo dos sonhos e das emoções, pensadores eminentes apuseram a afirmativa de que todo homem e toda mulher são portadores do desejo inato de se darem importância, o qual os compele a manter impulsos primitivistas de dominação; outros expoentes da cultura intelectual asseveram, a seu turno, que o ser humano é repositório de todas as experiências da raça, trazendo consigo vasto arsenal de tendências para determinadas linhas do pensamento.

O consulente fez uma pausa, ante o silêncio geral que reinava em derredor de sua valiosa indagação, e prosseguiu:

— Sabemos hoje, distanciados do corpo denso de carne, que a vida do Espírito é desconcertante em surpresas para a ciência terrestre; entretanto, já que nos consagramos à tarefa de auxiliar os companheiros torturados da Crosta Planetária, não poderíamos receber elucidações adequadas a respeito, com o fim de passá-las adiante?

O sábio instrutor não se fez rogado e esclareceu:

— Já sei o que deseja. Refere-se você aos movimentos da psicologia analítica, chefiados por Freud e por duas correntes distintas de seus colaboradores. O notável cientista centralizou o ensino no impulso sexual, conferindo-lhe caráter absoluto, enquanto as duas correntes de psicologistas, inicialmente filiadas a ele, se diferenciaram na interpretação. A primeira estuda o anseio congênito da criatura, no que se refere ao relevo pessoal, enquanto a segunda proclama que, além da satisfação do sexo e da importância individualista, existe o impulso da vida superior que tortura o homem terrestre mais aparentemente feliz. Para o círculo de estudiosos essencialmente freudianos, todos os problemas psíquicos da personalidade se resumem à angústia sexual; para grande parte de seus colaboradores, as causas se estendem à aquisição de poder e à ideia de superioridade. Diremos, por nossa vez, que as três escolas se identificam, portadoras todas elas de certa dose de razão, faltando-lhes, todavia, o conhecimento básico do reencarnacionismo. Representam belas e preciosas casas dos princípios científicos, sem, contudo, o telhado da lógica. Não podemos afirmar que tudo, nos Círculos carnais, constitua sexo, desejo de importância e aspiração superior; no entanto, chegados à compreensão de agora, podemos assegurar que tudo, na vida, é impulso criador. Todos os seres que conhecemos, do verme ao anjo, são herdeiros da Divindade que nos confere a existência, e todos somos depositários de faculdades criadoras. O vegetal, instigado pelo heliotropismo, surge na paisagem, distribuindo a vida e renovando-a. O pirilampo cintila na sombra, buscando perpetuar-se. O batráquio sente vibrações de amor e de paternidade nos recessos do charco. Aves minúsculas viajam longas distâncias, colhendo material para tecer um ninho. A fera olvida a índole selvagínea, ao lamber, com ternura, um filho recém-nato. E mais da metade dos milhões de Espíritos encarnados na Crosta da Terra, de mente fixa na região dos movimentos instintivos, concentram suas faculdades no sexo, do qual se derivam naturalmente os mais vastos e frequentes distúrbios nervosos; constituem eles compactas legiões, nas adjacências da paisagem primitiva da evolução planetária, irmãos nossos na infância do conhecimento, que ainda não sabem criar sensações e vida senão mobilizando os recursos da força sexual. Grande parte de criaturas, contudo, havendo conquistado a razão, acima do instinto, permanecem nos desatinos da prepotência, seduzidas pelo capricho autoritário, famintas de evidência e realce, ainda que atidas a trabalho proveitoso e a paixões nobres, muitas vezes… Pequeno grupo de homens e de mulheres, por fim, após atingir o equilíbrio sexual na zona instintiva do ser e depois de obter os títulos que lhes confere seu trabalho e com os quais dominam na vida, regendo as energias próprias, em pleno regime de responsabilidade individual, passam a fixar-se na região sublime, na, superconsciência, não mais encontrando a alegria integral no contentamento do corpo físico ou na evidência pessoal; procuram alcançar os Círculos mais altos da vida, absorvidos em idealismo superior; sentem-se no limiar de Esferas divinas, já desde a estrada nevoenta da carne, à maneira do viajor que, após vencer caminhos ásperos na treva noturna., estaca, desajustado, entre as derradeiras sombras da noite e as promessas indefiníveis da aurora… Para esses, o sexo, a importância individual e as vantagens do imediatismo terrestre são sagrados pelas oportunidades que oferecem aos propósitos de bem fazer; entretanto, no santuário de suas almas resplandece nova luz… A razão particularista converteu-se em entendimento universal. Cresceram-lhes os sentimentos sublimados na direção do campo superior. Pressentem a Divindade e anseiam pela identificação com ela. São os homens e as mulheres que, havendo realizado os mais altos padrões humanos, se candidatam à angelitude…

“De um modo ou de outro, porém, tudo isto são sempre as faculdades criadoras, herdadas de Deus, em jogo permanente nos quadros da vida. Todo ser é impulsionado a criar, na organização, conservação e extensão do Universo!…”

O Instrutor estampou significativa expressão fisionômica, imprimiu longa pausa à preleção em curso e, em seguida, acrescentou, bem humorado:

— Muita vez, as criaturas instituem o mal, desviam a corrente natural das circunstâncias benéficas, envenenam as oportunidades, estacionando longuíssimo tempo em tarefas reparadoras ou expiatórias; entretanto, ainda aí é forçoso observar a manifestação incessante do poder criador que nos é próprio, mesmo naqueles que se transviam… Em verdade, caem nos despenhadeiros do crime, lançam-se aos vales da sombra, mas, organizando e reorganizando as próprias ações, adquirem o patrimônio bendito da experiência; e, com a experiência, alcançam a luz, a paz, a sabedoria e o amor com que se aproximam de Deus. Concluímos, deste modo, que, se a psicologia analítica de Freud e de seus colaboradores avançou muito no campo da investigação e do conhecimento, resolvendo, em parte, certos enigmas do psiquismo humano, falta-lhe, no entanto, a chave da reencarnação, para solucionar integralmente as questões da alma. Impossível é resolver o assunto em caráter definitivo, sem as noções de evolução, aperfeiçoamento, responsabilidade, reparação e eternidade. Não vale descobrir complexos e frustrações, identificar lesões psíquicas e deficiências mentais, sem as remediar… Em suma, não satisfaz o simples exame da casca: é essencial atingir o cerne e determinar modificações nas causas. Para isto, é imprescindível confessar a realidade do reencarnacionismo e da imortalidade. Até lá, portanto, auxiliemos nossos amigos do mundo na conquista da confiança em si mesmos, na penetração da esperança divina e no contínuo autoaprimoramento pelo trabalho redentor.

Calou-se o emissário, sorridente.

Outras perguntas surgiram, interessantes e oportunas, obtendo respostas claras e edificantes, com real proveito para todos os ouvintes.

Encerrada a reunião, retirei-me em silêncio, ao lado de Calderaro, que também se recolhia, como a reter a luz reveladora dos conceitos ouvidos. Não sei o que pensaria o prestimoso Assistente, submerso em funda meditação. Reconhecia tão só que, por minha vez, descobrira novo campo de conhecimento na província da sexologia. Daquele momento em diante, outras noções de amor desabrochavam-me na consciência, iluminando-me o ser.


André Luiz


Fonte: Bíblia do Caminho † Testamento Xavieriano



VÍDEO:
No Mundo Maior - Cap. 11 - Sexo
O Espírito da Letra

Apresentação: André Luiz Ruiz






O Espírito da Letra - Missionários da Luz - Analisando a obra de André Luiz psicografia de Chico Xavier. 

Produção - TV Alvorada Espírita - http://www.tvalvoradaespirita.com.br 

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