terça-feira, 21 de fevereiro de 2023

Amélia Rodrigues - Livro Trigo de Deus - Divaldo P. Franco - Cap. 17 - Da oração dominical



Amélia Rodrigues - Livro Trigo de Deus - Divaldo P. Franco - Cap. 17


Da oração dominical (1)


Demoravam-se na paisagem tranquila os revérberos do entardecer, matizando com tons rosas, rubros e amarelos as nuvens passantes.

A brisa balouçava o leque verde das tamareiras exuberantes, carregadas de frutos.

Pairavam no ar, impregnando os corações, as ânsias e emoções dos acontecimentos que há pouco presenciaram.

O Mestre agigantava-se aos olhos da multidão.

O Seu estoicismo, revelado na conduta austera, exteriorizava-se na palavra ora dúlcida, ora enérgica, e nas ações enobrecidas com que favorecia aqueles que O buscavam.

Jamais alguém conseguira realizar tão admiráveis fenômenos de que somente Ele se fazia agente sublime.

A inveja rastreava-Lhe os passos, e as disputas vulgares entreteciam duelos emocionais entre os frívolos que Lhe buscavam a afeição.

O certo é que Ele viera para libertar as consciências e insculpir vidas nos painéis do amor.

Desse modo, as multidões sucediam-se-Lhe à volta, sedentas, emocionadas, confiantes.

Ele era portador das bênçãos de que todos necessitavam.

Na sua simplicidade afável, Ele penetrava os recônditos do ser, sem exibir-lhes as exulcerações.

Os Seus silêncios eram tão eloquentes quanto as Suas palavras, deixando impressas nas almas as marcas de luz da libertação.

A Sua voz, há pouco, terminara de envolver os homens nas esperanças e consolações do soberano código das Bem-aventuranças. (2) 

O odor de santidade e o vigor da sabedoria decorrentes da Carta Magna ainda inebriavam os ouvintes, quando os Seus discípulos d'Ele se acercaram, e um deles, comovido, interessado em compreendê-lO, interrogou:

— Senhor, por que orais tanto? Sempre quando terminadas as tarefas, por que buscais o silêncio e penetrais na oração?

Havia sadia curiosidade no questionamento do discípulo devotado.

Relanceando o olhar em torno e aplaudido pela musicalidade da Natureza em festa, Ele respondeu:

— A alma tem necessidade da oração, em maior dosagem do que o corpo de pão. 

"Orar é buscar Deus, penetrando-Lhe nas mercês e haurindo resistência nos Seus recursos divinos. 

"O silêncio propicia a busca; a solidão renova as energias e a comunhão com a Fonte Geradora de Vida faculta o prosseguimento dos compromissos abraçados."

— Mesmo vós — reinquiriu o amigo — que sois o Caminho para o Pai e o Seu Messias para a Humanidade, tendes necessidade de orar?

— A chama que ilumina — elucidou, paciente — gasta o combustível que a sustenta, e a chuva que irriga o solo retorna à nuvem de onde provém. "O intercâmbio de forças com o Pai Criador restaura-as na criatura, e eu próprio n'Ele encontro o reforço de sustentação para o messianato de amor em Seu nome. " Absorvido pelos ensinamentos elevados, João, que mais O amava, enternecido, inquiriu:

— E todos temos necessidade e dever de orar?

O Mestre benevolente envolveu o jovem em um luminoso olhar de bondade e elucidou:

— O homem. que ora eleva-se no rumo da Grande Luz e nimba-se de claridade radiosa.

Desejando que o ensinamento jamais fosse esquecido, o Mestre expôs:

— O Pai Celeste pode ser comparado a um rei poderoso que administra os seus domínios, mediante a cooperação de abnegados Ministros, que a seu turno se equipam de secretários, auxiliares e inumeráveis cooperadores abnegados. 

"Cada um deles rege um departamento específico, a fim de coordenar atividades e atender-lhes o impositivo. 

"À semelhança de todo reino, a variedade de deveres exige responsáveis para a sua execução. 

"O Ministério da oração é um dos mais delicados setores, exigindo hábeis servidores que se encarregam de registrar as solicitações em preces, selecioná-las e cuidar do seu atendimento conforme a procedência de cada emissão de onda mental. 

"Em razão disso, a oração deve ser uma vibração sincera, carregada de emoção, ao invés de expressivo palavreado sem a participação dos sentimentos honestos de elevação. 

"A oração é um apelo que, no entanto, deve alcançar mais ampla expressão, tornando-se, num momento, um hino de louvor; vezes outras, constituindo-se uma rogativa de auxílio e, por fim, um cântico de gratidão. 

"Examinados o mérito e as necessidades daquele que ora, são-lhe encaminhadas as respostas compatíveis com a sua realidade, tendo-se em vista sempre o seu progresso e crescimento diante da Vida. 

"Esse intercâmbio mental carreia vitalidade e restabelece os centros de energia da criatura que ora. "Claro está que este é um compromisso de cada indivíduo quite com os deveres sociais e comunitários, a fim de merecer usufruir os benefícios que a cidadania lhe confere. " 

Silenciando e permitindo que todos auscultassem as vozes inarticuladas da Natureza, aguardou que os companheiros assimilassem o ensinamento profundo, embora a linguagem simples de que se revestia.

Foi nesse comenos que um deles, profundamente sensibilizado, rogou:

— Senhor, ensina-nos, então, a orar.

E Ele abrindo a Sua boca e desatando as melodias latentes no coração, propôs-lhes a oração dominical, dizendo:

— Pai Nosso que estás nos céus...

A dúlcida palavra vestindo de sons o pensamento sublime, no qual estão exaradas todas as necessidades humanas, ofereceu-nos o legado precioso da prece, mediante a qual a criatura se comunica com o Seu Criador e este lhe responde pelos mecanismos santificantes da inspiração, equipando-a com os recursos próprios para enfrentar todos os dissabores, infortúnios, amarguras, desafios, ou as alegrias e benesses que fazem parte do seu dia a dia no formoso processo da sua evolução.


Amélia Rodrigues








(1) Mateus — 6 : 9 a 15 (Nota da Autora espiritual). 

(2) Os Evangelistas não precisam o local do acontecimento. Mateus situa-o após o “Sermão da Montanha”, de que nos utilizamos para os presentes comentários. Vide o livro Luz do Mundo — Cap. V de nossa autoria — Livraria Espírita Alvorada - Editora. (Nota da Autora espiritual)



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