Joanna de Ângelis - Livro Vidas Vazias - Divaldo P. Franco - Cap. 13
Ingratidão
Quando não puderes retribuir ao teu benfeitor algo do muito que ele te ofereceu, passa a outrem a colaboração da amizade, o sorriso de simpatia, a ajuda que seja possível ofertares.
O processo antropológico da evolução é muito lento e as modificações, adaptações e conquistas psicossociológicas ocorrem ao longo do tempo. A princípio é toda uma evolução aritmética, passo a passo, e, logo depois, alcançados determinados patamares, dá-se o desenvolvimento geométrico.
Ao ser atingido o estágio elevado da inteligência, do discernimento, da compreensão, da ética e do sentido moral da existência, ocorrem conquistas em saltos quânticos que facultam atingir a plenitude.
Nada obstante, o desempenho do ego no processo de libertação das paixões exige cuidados e perseverança constantes, de modo a não permitir que as más inclinações, que procedem das etapas anteriores, sobreponham-se às experiências iluminativas.
Não raro, o candidato à elevação espiritual debate-se nas mazelas que estão fixadas como hábitos, tropeçando e reincidindo de maneira contínua, sem o avanço permanente, que naturalmente é o ideal.
Equivale a dizer que em cada reencarnação torna-se necessário libertar-se dos atavismos infelizes e dos comportamentos doentios que se impõem como forma de prazer.
Não são poucos os impositivos do passado que remanescem como formas de conduta dominadora.
Entre os mais danosos que insistem em permanecer, o egoísmo torna-se o comandante em chefe das imperfeições morais pelo tormento de acreditar-se merecedor de todas as deferências e considerações.
Herança perversa do período egocêntrico, quando se acreditava ser a razão pela qual o Sol brilhava, ele está presente na maioria das decisões e das tentativas de crescimento intelecto-moral.
Indispensável, portanto, que haja uma conscientização lúcida e firme de trabalhar-se mental e emocionalmente para derrocá-lo, ampliando os horizontes felizes da fraternidade, mediante o reconhecimento de quanto é necessária a convivência em grupo e quão feliz é todo aquele que sabe conviver e repartir alegria com o seu próximo.
Muitas vezes, o egoísmo é resultado de transtornos mentais ou emocionais, isolando o indivíduo que, dessa forma, sente-se superior aos demais, evitando misturar-se com a massa, assim se destacando do grupo social pelo temperamento enfermiço.
Nesse estágio é comum a pessoa supor-se credora do esforço dos outros, do seu trabalho, das suas gentilezas e dependência, girando a sua volta, porém, distante fisicamente para não gerar incômodos ou aborrecimentos no sempre insatisfeito egotista.
Conhecendo-se, e não tendo interesse em modificar-se, por sentir-se bem na situação inusitada, faz-se simpático para conquistar os demais, sabe atingir os pontos vulneráveis das pessoas generosas e torna-se parasita a roubar-lhes a confiança, a afeição, que jamais correspondem ou sequer consideram como valiosas. Sempre se acreditam mais merecedores e soberbos.
Com facilidade desprezam quem os ajuda e os estima, permanecendo vazios de valores emocionais para entender quanto prejudicam os demais com a sua maneira atrevida de conviver.
Igualmente, quando percebem que já não impressionam com os seus arroubos e gentilezas forçados, disfarçam e tentam reconquistar quem se afasta, para continuar no seu desar habitual… A ingratidão é doença do Espírito, que deve ser combatida por todos quantos lhe são vítimas.
Pedro, que conviveu com o Mestre em intimidade e d’Ele recebeu indiscutíveis tesouros de amor e de socorro, negou-O três vezes, apesar de advertido sobre o egoísmo que ainda permanecia no seu caráter.
Caindo em si, porém, soube conquistar a humildade e ofereceu-se com entranhada dedicação à pregação e à vivência dos formosos ensinamentos do Senhor, doando a existência em um sublime holocausto de amor.
Judas, que igualmente Lhe recebeu as mais variadas demonstrações de ternura e de afetividade, não resistiu à tentação de vendê-Lo, a fim de lucrar as moedas da traição, caindo, logo mais, em si, e optando pelo suicídio infame.
Esses exemplos altamente significativos de ingratidão podem ser catalogados como de traição ao amor, ao devotamento e à confiança que o Rabi lhes ofereceu aos sentimentos, e eles não souberam ou não conseguiram compreender.
O ingrato é, também, em consequência, um traidor da confiança e do respeito que lhe tem sido oferecido.
No momento áspero, ante dificuldades, foi beneficiado pela bondade do amigo e, a partir daí, todas as bênçãos que lhe advieram tornaram-se consequência feliz do ato inicial que o libertou do problema, da aflição.
Nunca se pode retribuir devidamente um ato de bondade salvador, uma entrega de ternura e um gesto de compreensão. Todavia, adquire-se uma dívida perante a Consciência Cósmica, que aguardará momento para que o gesto seja levado adiante em benefício de outrem que se encontre em situação equivalente.
Um grande mal que o ingrato produz naquele que lhe é benfeitor consiste no efeito emocional que o seu comportamento produz, diminuindo a intensidade do espírito fraternal ou tornando indiferente aquele que acreditava na generosidade, no socorro imediato.
Por fim, o ingrato é pessoa realmente infeliz, porque nem sequer possui sensibilidade para amar realmente alguém. Toda e qualquer expressão de afetividade está sob o impositivo da retribuição de algo.
Felizes são aqueles que não desanimam, mesmo quando traídos, enganados e esquecidos após o bem que fazem.
A semente abandonada no subsolo um dia germina, quando as condições lhe forem favoráveis.
Assim é a bondade que se oferece ao próximo.
Não te deixes afetar pela crueldade dos ingratos e prossegue gentil, porque é sempre melhor para aquele que oferece e é bondoso.
A existência terrena, por mais longa se apresente, é sempre de breve durabilidade.
Muitas vezes, quando ocorrem inimizades e alguém deseja a vingança, ao consegui-la, experimenta um prazer momentâneo, enquanto perdoando fruirá de alegria para sempre.
Não te perturbes com aqueles que te exploraram, que te enganaram, que mentiram para conseguir o que desejavam. Eles aprenderão com as experiências a que serão submetidos e tu prosseguirás amando, porque o bem que se faz é moeda de amor que se converte em soberana luz de bem-estar.
Quando não puderes retribuir ao teu benfeitor algo do muito que ele te ofereceu, passa a outrem a colaboração da amizade, o sorriso de simpatia, a ajuda que seja possível ofertares.
O mundo está repleto de ingratos, mas o amor lentamente vence as resistências do egoísmo e esparze ternura, afeto e gratidão em toda parte.
Joanna de Ângelis
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