sexta-feira, 19 de julho de 2024

Lancellin - Livro Iniciação Viagem Astral - João Nunes Maia - Cap. 30 - Autoaprimoramento



Lancellin - Livro Iniciação Viagem Astral - João Nunes Maia - Cap. 30


Autoaprimoramento 
 

A perfeição é a meta de todas as criaturas, encarnadas e desencarnadas, por ser esse o clima da verdadeira felicidade. Porém, para chegar à perfeição, temos de passar por inúmeros caminhos que nos levam ao conhecimento, à sabedoria e ao amor.

O Espírito ainda imerso em hábitos inferiores e vícios que lhe entravam, de certa forma, o progresso, não está preparado para o voo sereno e confiante à sua paz interior.

Quem já sente e observa a necessidade de melhorar, quem já começa a ver em si mesmo um campo imensurável de trabalho a realizar, quem já iniciou o autoaprimoramento, certamente está no caminho certo, pois trabalha em um garimpo divino, batendo a ganga da vida, e encontrará as pedras preciosas desta mesma vida.

O trabalhador sincero não deve ficar ansioso por mudanças externas, pois, o que nele opera externamente é reflexo daquilo que ele vive intimamente.

Existem companheiros que, mais ou menos conscientes de suas faltas e da sua persistência nos vícios, continuam a alimentá-los. Estão plantando e receberão, talvez em outra reencarnação, de acordo com o que semearam para o futuro. Isso é doloroso, mas a lei nunca é enganada.

Nós temos vários corpos sutis além do físico, e eles são afetados pelo mau uso da vida que levamos, desde os pensamentos inferiores, até a sua materialização na vivência. O homem inteligente sempre procura viver uma vida simples, que não sobrecarregue o seu fardo com compromissos que lhe tirem a Paz, nem comprometam a sua liberdade.

O mais culpado é aquele que usa os recursos espirituais para a sua satisfação pessoal, principalmente em sensações inferiores. Esse é duplamente castigado pela lei, que age com total justiça.

Autoaprimoramento é princípio de elevação espiritual, é iniciar a harmonia interior e nunca usar o que já aprendeu para perturbar vidas alheias, para ganhar dinheiro ou angariar simpatias por vaidade.

Quem abusa dos poderes espirituais se confunde nos caminhos e fica atormentado pela própria consciência.

O nosso empenho maior é mostrar a ressonância dos atos materiais nos outros corpos espirituais, que são muito mais engenhosos nas suas estruturas e, certamente mais difíceis de serem recompostos na sua condição ideal de vibrações harmônicas.

Autoaprimoramento é o fim da ignorância e o princípio da iluminação da criatura; é a finalidade de todas as escolas religiosas e de todas as filosofias espiritualistas da Terra. Até mesmo a ciência avança aprimorando métodos e solidificando conceitos, para que seja cada vez mais eficaz para a saúde dos povos e a sabedoria da humanidade.

Quem se ilumina por dentro, nunca teme a escuridão exterior. Tu, que estás lendo, sê sincero contigo mesmo, escuta e responde: já observaste, do princípio ao fim, tudo o que falas aos outros? Já fizeste um estudo, no silêncio do travesseiro, daquilo que pensaste durante o dia? E daquilo que desejas aos outros? Se alguém fizesse contigo, aquilo que fazes ao próximo, como reagirias? Começa a aparar tuas arestas, todos os dias, em cada hora, minuto e segundo, porque o trabalho não pode ser outro, para que a luz clareie todos os teus sentimentos, hoje e eternamente.

O homem mais educado não deixa transparecer suas imundícies interiores, para que os outros não o julguem, porém, quando longe dos que o conhecem ou no silêncio da mente, volta ao atavismo dos sentimentos e corrompe todo o seu organismo espiritual, e mesmo o físico, com o que verdadeiramente é. Esquece-se de que para Deus não há nada escondido, assim como, também, para as suas companhias espirituais, que são as testemunhas ocultas.

Estamos no fim de um ciclo, onde a vida nos pede um pouco mais de esforço, no sentido de elevação espiritual. Essa evolução nos marca com o dedo de Deus, para a entrada no reino da Luz.

Se alguém te injuria, não revides com injúrias, para não entrares na mesma faixa do ódio.

Se a torrente dos infortúnios inundou a tua vida, afogando em sofrimentos os teus maiores ideais, tem paciência e confia no Todo Poderoso, que os males que porventura estejas sofrendo constituem limpeza cármica para alívio do teu fardo.

Se nada fizeste de mal nesta existência e o mal não te deixa sossegar, tolera e espera, esforçando-te para te libertares disso que, certamente, é reflexo do passado.

Nunca procures defeitos no Criador, nem na criação; o que existe de errado, se existir, é somente dentro de nós.

É por isso que estamos estudando variados meios e processos inúmeros de aprimoramento espiritual, para que no amanhã estejamos perfeitamente harmonizados com a força divina, na divina extensão do infinito.

Estamos planejando este trabalho de viagens astrais conscientes para muitos Espíritos encarnados, não somente para deleitar os candidatos, nem tampouco os leitores, com fatos extraordinários e fenômenos transcendentais, mas, procurando levar a todos os que se deliciam nas leituras espiritualistas, meios mais seguros de informações no que tange à autoeducação, mostrando ao homem que não leva a sério a moral evangélica, o que lhe pode acontecer no mundo dos Espíritos. Assim, vamos dar prosseguimento aos nossos trabalhos, por amor ao bem comum.

Reunimo-nos em um grande salão, onde a serenidade reinava, e o ânimo pela vida, injetado na atmosfera do ambiente onde respirávamos, era o alimento indispensável, enriquecendo-nos de novas energias. Assuntos elevados eram ali debatidos com o maior interesse e humildade. O objetivo de todos era aprender uns com os outros.

As experiências apresentadas eram as mais diversas, e quem acompanhava as dissertações aprendia muito. Um Espírito foi entrando com muitas fichas nas mãos e, sorrindo, no-las entregou, dizendo:

- Esse é o trabalho desta noite. Que Deus vos abençoe. Miramez folheou as mesmas e fixou-se em uma com leve sorriso, dizendo:

- Este é o Quarenta. Ele exerce na Terra um lugar de destaque nas igrejas da Reforma. Vamos procurá-lo esta noite, em nome de Deus e de Cristo. Ele é norte-americano e veio para o Brasil por ter mais aflorados os sentimentos do verdadeiro cristianismo, embora esteja ligado às regras que o Protestantismo delibera aos seus seguidores. No entanto, por dentro é maleável; é fruta que não está bem ligada à árvore mãe. Quem gosta de religião, acaba pertencendo à religião universal, mesmo que adira a alguma das muitas que existem no mundo, porque a evolução o faz pertencer, por dentro, de coração e raciocínio, à religião natural da vida, que é o Amor.

Fiquei pensando: "Esses pastores, como são instruídos, farão com que a Reforma, em curto tempo, tenha o seu verdadeiro significado." Miramez percebendo os meus pensamentos, acrescentou: 

- Achas, Lancellin, que Jesus está no leme deste barco terreno, brincando no mar da vida? O homem, verdadeiramente, tem o livre arbítrio; ele idealiza seus caminhos, funda partidos, organiza filosofias de todos os tipos, cria na Terra religiões que, às vezes, nascem da vaidade, não obstante, elas todas - assim como os rios correm para o mar - se dirigem para Deus. O nosso livre arbítrio é livre escolha de métodos de aprimoramento, mas, as bases e os fins, somente o Senhor pode determinar. 

Fiquei sorrindo de alegria, pela segurança com que o nosso benfeitor espiritual dizia.

O sol, visto de onde estávamos, começava a se esconder no horizonte. Que espetáculo grandioso! Raios de luz matizada, como que vivos, deslizavam no colchão etérico do cosmo, como mensagem de esperança a toda a criação. Percebíamos, também, que estávamos sendo visitados pela claridade das estrelas, fecundando o nosso ambiente com a paz universal.

O trabalho era intenso naquele casarão; uns chegavam, outros saíam, naquele cinetismo de vida, sem tempo para os longos cumprimentos que a fraternidade aconselha, porém, que o dever interrompe, pela urgência da caridade. 

Fomos convidados a participar, com o nosso grupo, em uma assembleia de trabalhadores, por uma voz mansa que chegava por um interfone encravado no teto e que, ao mesmo tempo, agradecia a cooperação dos servidores.

Acompanhando o nosso guia, entramos em enorme salão, onde logo tivemos a atenção atraída por curiosas cadeiras que ocupavam todo o recinto e que somente uma inteligência superior poderia ter idealizado. Ao mesmo tempo em que descansava quem nelas se assentasse, era registrado em um painel luminoso, por meios desconhecidos por nós, quantos assentos estavam ocupados. Vimos, então, que havia oitocentos e vinte e cinco assistentes naquele momento.

O silêncio nos dava a entender o respeito com que todos esperavam o enunciado.

Estávamos conjeturando idéias de como seria a reunião, quando, sem que esperássemos, surgiu um ancião, cujos traços o faziam parecer com mais ou menos setenta anos, de voz segura e tranquilidade expressa no seu modo de ser. A sua presença nos fez encher o coração de simpatia e alegria. A sua voz ressoou pelo salão, com simplicidade, nestes termos:

— A paz de Deus esteja conosco, hoje e sempre, e que Nosso Senhor Jesus Cristo nos assista em todos os nossos trabalhos!

Sorriu para nós e abriu uma cortina ao lado, nos mostrando pelos gráficos expostos, a extensão do Brasil, salientando alguns pontos luminosos espraiados na grande nação brasileira, indicando postos de emergência. Algumas dessas luzes se acendiam e se apagavam, anunciando falta de mãos nos trabalhos mais urgentes da noite.

O ancião Belarmino apontou com um pequeno bastão, onde os grupos ali reunidos poderiam, ou deveriam, dar assistência e anunciou com serenidade que todos os grupos deveriam apanhar na portaria, por escrito e com mais detalhes, o que deveriam fazer, na região em que deveriam atuar sob as bênçãos de Deus. O diretor daquela casa de trabalho, da qual procurei saber o nome — Mansão da Serenidade — assumiu o gesto de quem iria orar, mas, antes, falou derramando sua visão tranquila em todos nós, como sendo novas energias a vivificar nossas almas de prontidão para todos os serviços de caridade que se nos apresentassem:

— Irmãos em Cristo, com muita alegria vos falo nesta noite. O que seria desta casa de Deus, se não fosse a ajuda de todos vós, que trabalhais neste lar espiritual, e daqueles que passam por aqui, doando os seus intervalos de tempo em favor da coletividade sofredora? Não sei o que ofertar de mim mesmo para vós; não tenho nada para doar, a não ser pedir a Deus que vos abençoe e ilumine na espontaneidade de servir pelo prazer de ajudar. Que Jesus, o nosso Mestre por excelência, vos acompanhe em todos os percursos dessas atividades cristãs.

Cerrou os grandes olhos e se notava a transformação da sua cândida fisionomia em semblante angelical de incomparável tranquilidade, escapando dos seus lábios luminosos estas palavras:

"Deus de imensuráveis poderes! Vamos pedir-Te novamente. Desculpa-nos por sermos os pedintes de todos os dias. Somos ainda crianças à procura de amparo todas as horas. Eis aí, diante do Senhor, esse aglomerado de servidores dos primeiros chamados. Abençoa a todos na sequência dos seus trabalhos nesta noite, para que eles possam, Senhor, cumprir seus deveres frente às suas consciências, sem esquecer as regras da caridade, o equilíbrio da justiça e a misericórdia do amor.

Não vamos nos alongar em pedidos, Pai, porque, felizmente, as nossas mãos pedem que nós abreviemos a nossa fala, para que elas possam ser mais úteis e o tempo mais aproveitado!" 

Levantou os braços em um gesto de humildade, como se estivesse recebendo algo de outras mãos invisíveis e falou com o coração, em um tom de voz que era todo ternura:

"Obrigado, meu Deus! Obrigado, Jesus!"

O salão parecia povoado de estrelas luminosas, como se fosse uma constelação viva que penetrava no ambiente, como resposta de Deus. E aquelas estrelas ficavam cada vez menores ao se aproximarem de nós, até se perderem no nosso cosmo orgânico, como mensageiras de energias divinas, nos dotando de esperança e fé, diante dos trabalhos empreendidos por aquela casa.

Música suave penetrava o ambiente, alegrando-o, e alguns permaneciam sentados, para escutá-la com mais proveito.

Saímos, e na portaria nos foram entregues, com gentileza, os acessórios da direção, onde se via, sem muito esforço da atenção, o Posto Seis em realce. Era um miniposto encravado rente ao chão do mundo, operando em coisas urgentes, com capacidade de dar a primeira assistência e avisar ao Posto Central as condições dos recém-chegados, muitas vezes em estado grave.

Já em plena viagem volitante, Miramez nos informou, depois de breve concentração:

— Apressemo-nos. O Posto Seis chama sem interrupção. Carecem lá de socorro urgente, pois estão emitindo pedidos de ajuda em várias frequências, para que a assistência não demore.

De longe avistávamos uma luz avermelhada girando na cúpula da construção simples, o que significava um chamado comum para Espíritos que fossem passando, com deveres em outras direções, mas, que pudessem dispensar alguns momentos de atenção à caridade daquele posto de socorro.

Descemos. Era um dos bairros de São Paulo. O posto estava movimentado e quando o dirigente avistou nosso guia espiritual, sorriu com tranquilidade. Apresentamo-nos e imediatamente começamos o trabalho de assistência.

Era um grande desastre que havia ocorrido na via férrea, e muitas mãos espirituais estavam assistindo, de acordo com a capacidade de cada um. Naquele momento, muitos perderam a vida física no choque dos vagões; outros estavam sendo socorridos às pressas, sendo levados para os hospitais mais próximos. Muitos, com ferimentos superficiais, iam para suas casas, para que os familiares não se preocupassem, pois, as emissoras de rádio anunciavam o acidente com frequência, acrescentando a sua parte de sensacionalismo. Mulheres e crianças choravam; a multidão se aglomerava em torno das ferragens.

Miramez aproximou-se de um dos assinalados para a desencarnação e, com habilidade, levou as suas mãos aos despojos que estavam estendidos com outros da mesma sorte, apagando um pouco a consciência do Espírito, já que ele estava aos gritos, em desespero desmensurado. Afastou-o do corpo físico com carinho e no-lo entregou, pedindo-nos para infundir nele, mesmo na inconsciência, pensamentos de coragem e de paciência, dando passes reconfortantes.

Kahena, já preparada, aplicava essências de plantas nas narinas de todos eles e, pelo pensamento, os ajudava a respirar. Diante do amor com que ela agia, eles logo se acalmavam.

Abílio fazia o preparo do ambiente, para que eles se apresentassem sem ansiedade, anulando o plasma mental dos encarnados que, nestas horas, muito atrapalham. Algumas mulheres balbuciavam orações, sem o mínimo de sentimentos que as levassem à concentração, que requer a presença de harmonia. Soldados puxavam os corpos mutilados, enquanto os corvos espirituais à cata de vitalidade, se aproximavam do ambiente de desespero, para se alimentarem das forças vitais concentradas em cada corpo. Entretanto, o Padre Galeno, juntamente com o nosso Celes, os afastavam por processos que os dois achavam mais convenientes àquele estado de calamidade. Fernando emitia pensamentos de ânimo e confiança em uma faixa que todos pudessem assimilar, para que não fosse quebrada a harmonia espiritual.

Miramez, depois de intenso trabalho junto a nós, reuniu os que poderiam ser afastados, e movimentamo-nos para o posto com rapidez. Todavia, eu senti no coração um pesar desmedido e muita compaixão por aqueles que lá ficaram ao desdém do tempo e expostos à falta de respeito da massa encarnada.

Percebendo a minha dissonância com o trabalho empreendido pela equipe, Miramez chamou-me à ordem, com gentileza, dizendo:

— Lancellin, não queiras compartilhar com aqueles que lá ficaram, do apego aos restos sem vida espiritual, pela força do egoísmo e pelas garras da ignorância! Não deves pensar que eles estão sem proteção; é o mesmo que dizer, ou formular ideias, classificando o nosso Deus de Amor, de injusto. Cada criatura recebe o que merece no campo da vida. O plantio é sustentado pela liberdade; a colheita é forjada pela justiça.

Desliguei logo meus pensamentos da falsa fraternidade e cuidei de trabalhar como os outros, em favor dos Espíritos traumatizados.

Depois de tudo calmo, com a presença de muitos outros trabalhadores espirituais, deu entrada no Posto Seis outra caravana, com uma leva de, mais ou menos, sessenta desencarnados recolhidos em outras regiões da Grande São Paulo. Ajudamos a recebê-los com presteza, e estendemos as nossas possibilidades em favor de todos os outros acidentados que estavam chegando para serem socorridos. Quando notamos todos calmos, acomodados em leitos simples, ouvimos um chamado do Posto Central pedindo informações sobre os Espíritos que deram entrada em nosso posto. Imediatamente, foi comunicado pelo vigilante que estava tudo bem, dependendo somente da presença do transporte coletivo espiritual, para serem removidos à Base Central de Assistência. Relatou, ainda, em poucas palavras, todo o ocorrido durante a assistência àqueles irmãos em provas. O Posto Central anunciou, então, que o veículo já havia partido em direção aquele posto.

Logo, a nossa audição assinalava um ruído fino, mas poderoso, e, em seguida, a chegada do transporte para aquelas almas arrebanhadas no desastre e as outras ali assistidas, levadas por vários mensageiros da fraternidade, que universalizam a palavra Servir, no trabalho anônimo. O carro tinha a aparência de um ônibus leito, porém, com propriedades mais avançadas que as existentes no campo material. Hábeis enfermeiros que não perdiam tempo, por já saberem o que fazer em qualquer situação de emergência, iam deslocando os Espíritos, dos leitos para o coletivo espiritual, com rapidez, mas, com alta expressão de carinho, notando-se o amor a irradiar dos seus semblantes e passar para os enfermos em notas de harmonia, como sendo energias vivificantes.

Entrei no veículo e assentei-me em um dos lugares reservados aos enfermeiros. Ouvíamos uma linda música, que era transmitida do Posto Central. A melodia era composição do famoso compositor polonês Frederico Francisco Chopin e, por estranho que possa parecer, era a Marcha Fúnebre. Suas vibrações, entretanto, nada tinham, de negativo, e sim, asserenavam as emoções mais exaltadas. Em seguida, deliciei-me com uma que me encanta, aliás, a única ópera feita pelo grande mestre da música, Luiz de Beethoven, intitulada Fidelio.

Quando estava me transportando para as estrelas nos sons da melodia espiritual, senti um toque de mão em meu ombro e uma fala meiga ao meu ouvido.

— Lancellin! Só falta tu saíres do veículo, para que os enfermos possam receber mais socorro no Posto Central! Tu te delicias, enquanto os outros sofrem!

Voltei à consciência, já que me sentia inebriado, abri os olhos e não vi ninguém ao meu redor. Desci, e o carro partiu com aquele ruído característico aos grandes engenhos do espaço. Presenciamos o seu desaparecimento no azul celeste, dando graças a Deus.

Procurei o nosso grupo e encontrei todos sorrindo, por causa da transmissão telepática feita a mim pela companheira de trabalho, Kahena, e sorri também com eles.

Padre Galeno falou com emoção, para todos nós:

— Meus irmãos, como é admirável a música! Como é bela a harmonia tudo aquilo que com ela podemos fazer em favor dos que sofrem e em nosso próprio benefício! Certifiquemo-nos, pois, de que Deus é a eterna harmonia e que tudo o que vive n'Ele está sorvendo o amor, pelas linhas dessa harmonia. Gloria Patri! A verdadeira música nasce Imo Pectore, acrescentou com sabedoria.

Já era de madrugada e o nosso objetivo maior, agora, era sair em busca do Quarenta, nas redondezas do Rio de Janeiro. Foi o que fizemos, sem demora.

A Capital do Samba estava belíssima, com suas luzes coloridas. O mar agitava suas ondas, como que entregando à terra cotas de energias benfeitoras, e era fácil observar certas entidades brincando nas cristas das mesmas, sem nenhuma intenção do mal. mas, sem nenhuma preocupação em favor do Bem.

Descemos, na suavidade dos ventos marinhos, e fizemos vários exercícios de respiração profunda na nossa dimensão de vida, sentindo também, como os encarnados, o cheiro do iodo e o gosto do sal. As baforadas dos ventos que vinham do oceano nos entregavam energias novas, com as quais renovávamos a nossa provisão de forças.

Miramez, diante do mar e sob o olhar das estrelas, nos convidou a orar. Postando-nos em torno dele, ouvimos sua sentida oração:

Senhor de todos os mundos! Deus de Bondade e de Amor! Tu, Senhor, que nos cercas de todo o carinho, com o conforto providencial da natureza, em todos os momentos; que nunca te esqueces de alimentar, desde os seres unicelulares aos grandes animais marinhos, do inseto que manifesta os primeiros voos às grandes aves que planam nas alturas; que não te esqueces de cuidar, desde a mônada, até aos anjos; dos mundos, até os sóis; das constelações, até as galáxias, nós te pedimos nesta hora, em que estamos em preparo para o trabalho, que nos revistas, Senhor, de ânimo, no sentido de ajudar com mais eficiência aqueles filhos que se dispuseram a compreender a Verdade em uma dimensão maior.

Estamos aqui como alunos incipientes, procurando no labor do Bem ensinamentos que outrora esquecemos de registrar.

Quantos nos cercam esta noite, em Teu nome! E a consciência nos Pede que cuidemos deles como filhos do coração. Não estamos invisíveis Por nosso querer: são as barreiras criadas pela Lei, para que eles não se assustem, nem se prejudiquem, mas, estamos trabalhando para que todos eles possam despertar os seus sentidos, abraçando-nos como irmãos do coração, sem as divisões impostas pelo tempo.

Abençoa, Senhor, todos eles, e dá-nos o discernimento necessário para somente acertarmos nos trabalhos que escolhemos. 

Rogamos a Jesus, em Teu nome, para que nos oriente nos caminhos que nos propomos a seguir.

Finalizando a prece, estávamos sendo banhados por outro mar que os olhos humanos não registram, estuante de forças na faixa da nossa existência, de onde seres saíam, como que vestidos de águas luminosas, a nos espargir perfumes de toda gama, como respostas à oração do nosso benfeitor espiritual. Notamos que, do alto mar, partia em nossa direção um objeto em forma de barco, deixando por onde passava um rastro de policromia encantadora. Ao se aproximar de nós fez uma parada, como se fosse reverência, e projetou um forte raio de luz em nossa direção, cujo volume nos circundou por instantes, e desapareceu como por encanto, nos deixando a todos fosforescentes, enquanto a luz penetrava em nosso organismo espiritual.

Acenamos as mãos para o grande oceano, agradecendo a Deus pelo amor que depositou em toda a Sua criação.

Partimos para um bairro da cidade, que era o nosso destino. Lá, encontramos nosso irmão Quarenta ainda acordado, lendo o Novo Testamento. Para não esquecer a sua pátria, estava lendo em inglês o capítulo vinte, de Lucas, versículos catorze e quinze.

Atento à leitura, ele repetia várias vezes esses versículos:

"But, when the husbandmen saw him, they reasoned among themselves, saying: this is the heir; come let us kill him, that the inheritance may be ours. So, they cast him out of the vineyard and killed him. What therefore shall the lord of the vineyard do to them?"

Quarenta, meditando muito nesta passagem, começou a avistar vultos à sua frente. Passou a mão nos olhos, pensando em ilusão de ótica. Foi até a pia dentro do seu quarto, lavou o rosto e caiu em oração, pedindo a Jesus que expulsasse aquela visão de sua frente. Deitou-se comodamente em sua cama e tornou a ver com maiores detalhes, o nosso grupo. Lembrou-se do texto de Lucas e meditou sobre ele mais profundamente, sentindo uma coragem indizível no coração. Disse então:

— Que venha, o que quer que seja, desde que venha em nome de Deus e Nosso Senhor Jesus Cristo!

Mentalmente, ele monologava, no silêncio do quarto: "Será que estou sendo como os lavradores da parábola, expulsando os mensageiros de Deus que vêm ao meu encontro para me instruir? Espero que não".

Recostou-se no travesseiro, já sonolento, mas, com a mente viva em Jesus, fonte de todo o saber, rocha onde todos os homens devem se sentir seguros, hoje e sempre.

Reunimo-nos em torno do seu leito. Passados alguns minutos, notava-se a mudança de sua respiração. Saíam de suas narinas, tenuíssimos fios, com aparência de algodão e um som não comum ao sono natural lhe escapava pelos ouvidos.

Miramez, tranquilo, estendeu as mãos rumo ao epigastro do pastor, fazendo evoluções, e emitiu uma ordem mental de alta frequência. O aprendiz de viagens astrais conscientes afrouxou o envoltório físico e confiou no comando espiritual. Parecia um fruto maduro, cujo caroço salta fora com facilidade quando apertado pelas mãos humanas.

Assim aconteceu com o Quarenta: saiu do corpo com facilidade incrível e apareceu ao nosso lado já nos vendo e sorrindo, pedindo desculpas por ter embaraçado nossa tarefa, em virtude de sua demora em dormir. Ele desconhecia o fato de termos chegado ali naquela hora, por causa do trabalho que nos prendera no Posto Seis. Pegou as mãos de Miramez e beijou-as com ternura; abraçou todos nós, como companheiros do coração e logo lhe veio à lembrança o que lera na hora de dormir. Algo desapontado, lamentou:

— Mesmo com o Evangelho me avisando acerca da presença espiritual, e eu vendo a todos vocês, ainda tentei expulsá-los do meu quarto! Como pode ser isto, eu que tenho a certeza da vida espiritual, que já tenho saído com vocês, por misericórdia e graça de Jesus Cristo?

Pôs as mãos na cabeça e repetia:

— Como pode?! Como pode?!

Estava em lágrimas. Miramez estendeu a destra por sobre sua cabeça e lhe falou paternalmente:

— Meu filho, quando o Espírito está envolvido pela carne, ele perde sensibilidade e, ainda mais quando faz parte de alguma religião, pois ele se sujeita as diretrizes dessa. Isso empana, de certa forma, os conhecimentos espirituais. A tua reação diante do nosso aparecimento foi por condicionamento, e não por prevenção, em função das sugestões ouvidas todos os dias, bem como da posição que ocupas diante dos homens. A carne sugere variadas oportunidades de evolução, no entanto, quem não souber se comportar nela, poderá ser arrastado para ambientes tenebrosos, onde haverá choro e ranger de dentes.

Quarenta dirigiu-se a Miramez e lhe falou com ternura:

— Senhor, não será a bíblia o único caminho para a humanidade se salvar? Não foi Deus quem a colocou no mundo, como Pai amoroso e bom? O que diz o senhor, para nós, das igrejas de Deus espalhadas por todo o mundo? Eu penso que são as portas dos céus que se abrem para salvar a todos.

Serenamente, Miramez respondeu:

— Enganas-te, procurando caminhos exteriores para a salvação das criaturas. A bíblia que serve para a salvação do homem, é a da consciência, onde o Senhor gravou todas as leis, sem faltar uma sequer. Ela é que está presente em cada segundo da nossa vida. Queiramos ou não, nós a estamos lendo constantemente. Ninguém se salva somente por ter lido um livro, por ter andado ou morado com alguém já salvo das mazelas do mundo. A transformação moral é feita de passo a passo, com a ajuda do tempo, na forja do esforço próprio. O anjo não chegou à angelitude por simples arrependimento. Fora assim, qual seria o trabalho da justiça de Deus? Estás te esquecendo das múltiplas reencarnações que já tiveste na sequência do tempo, sob o comando da vida? É nos renascimentos sucessivos em que vamos nos depurando, em um processo de evolução criado pela Inteligência Divina, por amor a todos nós. A Bíblia, meu irmão, verdadeiramente foi uma bênção dos céus aos Espíritos da Terra. Ela serve de toque para que despertemos do sono, porém, a salvação depende de Deus primeiramente; depois, de ti e da vida que escolheste. A citação "Fora da Caridade não há salvação" é o dito mais acertado, porque afirma uma verdade indiscutível. A reforma interna é uma grande caridade que fazemos a nós mesmos e aos outros. Os ensinamentos das igrejas atuais são rudimentos da filosofia espiritualista. Vós, da Reforma, estais presos pela letra que mata e vos esqueceis do Espírito que vivifica. Afirmais que ninguém se salva pelas obras e, na verdade, nós dizemos que não existe salvação do modo que pensais, sem obras. Tu és, pelo que fazes da vida.

Pensou um pouco e todos estavam atentos, em silêncio. Depois, continuou:

— Não podemos diminuir Deus tanto assim, a ponto de pretendermos colocar toda a Sua sabedoria em um livro escrito por mãos humanas. Observa o que Jesus fez com os dez mandamentos: resumiu-os em dois. Se a transformação for em todo o livro, o que irá restar do velho pergaminho de Moisés?

O pastor assustou-se, mas, como as palavras que ouvira eram de uma lógica irrefutável e o ambiente favorecia, calou-se, chorando.

Miramez correu os dedos nos cabelos do companheiro e falou com amor:

— Chora, meu filho. Essa transição é muito difícil, mas, se procuras a Verdade não há outro caminho. Ela, por vezes, é dura e áspera, contudo, no fundo é o mesmo amor que conforta e instrui.

Todos estavam felizes pela maleabilidade do nosso companheiro Quarenta. Ele abraçava todos nós, como irmãos em Cristo, e pedia perdão se tudo aquilo que fez era ofensa às nossas sensibilidades. Rimos, depois, e ele nos ajudou a rir. Olhou para todos os encarnados que nos acompanhavam e que estavam ali pela porta do sono, beijou um por um, com ternura fraterna e pediu a Deus que fizesse dele o menor de todos, mas, que o deixasse ser um dos trabalhadores da caravana em busca de irmãos sofredores.

Miramez iniciou a volitação com todos nós, e cada um foi instruído para que ajudasse a planar com os seus próprios esforços. Seguindo o Padre Galeno que ia de mãos dadas com o Quarenta, começamos a entrar em um grande cemitério do Rio de Janeiro.

O pastor, que não queria que o chamássemos assim, assumiu a postura do seu cargo e, aos olhos do porteiro espiritual, apareceu de bíblia na mão, acompanhado pelos outros encarnados. O porteiro deu o sinal de que poderiam entrar e comentou com o seu companheiro:

— Eles são religiosos que vieram orar pelos mortos. Só que os mortos estão mais vivos que eles.

Riram os dois, e o segundo personagem disse, em tom de gracejo:

— Será que eles não desconfiam que somente o corpo fica na Terra, continuando a alma a vagar pelo espaço?

— Deixa pra lá! Eles têm sua crença. Que fique cada um na sua! Entretanto, devemos manter vigilância. Estes são mansos e respeitam os mortos, mas, existem aqueles que vêm aqui só para perturbar.

Nós, o grupo dos sete, passamos por eles sem sermos notados.

O pastor abriu a bíblia e, ajudado por Padre Galeno, passou a ler, em silêncio, o texto que lhe caiu sob os olhos. Nós outros, invisíveis aos olhos da massa espiritual que vivia no cemitério, forjamos uma luz que se movimentava em torno daqueles que ali se reuniam, para atrair a atenção de todos. E foi o que aconteceu: grande aglomeração se fez em torno do nosso Quarenta, do Padre Galeno e dos outros companheiros, para ver o fenômeno nunca antes apreciado. 

O pastor meditou instantes, pedindo inspiração aos céus e leu com clareza, I Crônicas, capítulo dezesseis, versículos de um a seis, o seguinte: "Introduziram, pois, a arca de Deus, e a puseram no meio da tenda que lhe armara Davi; e trouxeram holocaustos e ofertas pacíficas perante Deus. Tendo Davi acabado de trazer os holocaustos e ofertas pacíficas, abençoou o povo em nome do Senhor. E repartiu a todos em Israel, assim a homens como a mulheres, a cada um, um bolo de pão, um bom pedaço de carne e passas. Designou dentre os levitas os que haveriam de ministrar diante da arca do Senhor, e de celebrar, louvar e exaltar o Senhor Deus de Israel, a saber: Asafe, o chefe; Zacarias, o segundo, e depois Jeiel; Semiramote, Jeiel, Matititas, Eliabe, Benaia, Obede, Edom, e Jeiel, com alaúdes e harpas; e Asafe fazia ressoar os címbalos. Os sacerdotes Benaia e Jaaziel estavam continuamente com trombetas, perante a arca da aliança com Deus".

A voz do pastor ficava cada vez mais profunda, tomando um caráter de tamanha sinceridade, que todos, ou quase todos, ouviam com o maior respeito. Ali estavam em Espírito, muitos dos seguidores, quando na carne, de Martinho Lutero, esperando o dia do juízo para serem libertados das trevas dos sepulcros; outros, ainda ligados aos restos mortais em putrefação.

A massa que estava ali se dividia por sintonia que eles mesmos não percebiam; uns do lado do Quarenta e outros do lado do Padre Galeno, que já se fazia visível, com a ajuda de Celes e Kahena.

Pudemos observar que, em cima dos muros e das árvores, estavam postados, em uma algazarra tamanha, inúmeros vampiros de formas esquisitas, que assombravam até os próprios Espíritos que ali se reuniam.

Um dos chefes fez menção de descer do muro, dando sinal para os outros, todavia, foi observado por Miramez que, em poucos segundos, moldou um aparelho com aparência de foguete, mentalizou uma camada de fluidos, cuja composição ainda ignoro, e revestiu o engenho com ela.

Enquanto Miramez segurava o engenho, ele permanecia inerte, porém, ao soltá-lo, ele movimentou-se com velocidade admirável, desenhando sobre os muros e árvores em luz incandescente. Os vampiros, ao verem aquele aparelho em brasa, puseram-se em debandada. Alguns conseguiam até uma volitação baixa. Era de fazer dó, o medo que eles demonstravam diante daquela chama volante que obedecia à mente do nosso instrutor.

Aquele que parecia ser o líder deu a ordem de recuar, gritando:

— É a luz que nos persegue outra vez! Vamos embora!

Um deles, tentando um voo incipiente, quase se chocou com o foguete; emitiu um grito estridente e caiu desmaiado, dentro do cemitério.

Os vigilantes do campo santo, ao presenciarem aquele acontecimento, comentavam entre si:

— São os anjos que estão nos ajudando novamente. Esses monstros são terríveis, mas, graças a Deus, existe quem olhe por nós.

Apanharam com rapidez as armas de que dispunham e saíram a examinar de canto a canto do cemitério, com ideia de expulsar os invasores daquela área sagrada.

Miramez distraiu a atenção dos servidores daquele ambiente, para não verem o vampiro desmaiado e nos chamou para observação mais de perto, daquele monstro voador. Assustei-me quando cheguei perto; nunca tinha visto tamanha degeneração fisionômica. Tive ímpeto de recuar, porém, a consciência me pedia para observar detalhadamente aquele irmão que descera tanto, tomando forma que não devemos descrever, por enquanto, a não ser alguns detalhes: as asas abertas eram duas vezes maior do que o corpo. Estavam no lugar dos braços, que se deformaram em protuberâncias. Eram, mais ou menos, como as dos morcegos. Em baixo dos pés, também apareciam saliências como pequenas asas.

Depois que os vigilantes passaram e desapareceram entre as sombras dos mausoléus, Miramez deu uma ordem mental ao filho das sombras, e esse levantou-se meio cambaleante. A mente do nosso instrutor o ajudou a levantar voo e ele sumiu em direção ignorada.

Miramez sorriu para mim dizendo:

— O pastor ainda não pode ver esse quadro, senão ele vai registrar como se tivesse sonhado com o Satanás, e isso poderia prejudicar as suas próximas experiências de viagens astrais.

Padre Galeno tomou a palavra e dissertou com veemência sobre os valores do Espírito. A multidão de almas, sendo a maior parte de mulheres, postava-se diante do sacerdote espiritual, como se tivesse sede da palavra evangélica, no entanto, algumas delas faziam menção de atirar algo em nosso companheiro, dirigindo-lhe palavras ofensivas. Alguns dos que ouviam o Evangelho com muita atenção, se dispuseram manter a ordem, afastando essas entidades endurecidas que procuravam perturbar o ambiente.

Do Padre Galeno era projetada uma luz viva, de um azul indescritível e com nuances variadas. Concentramos mais a atenção para observar de onde procedia aquela luz e ficamos encantados com a misericórdia divina, que nos oferecia a oportunidade de termos aquela visão. O coração do Padre Galeno tornou-se um sol, de onde se despejava aquela luz espiritual em todas aquelas criaturas sofredoras ali ajoelhadas. Muitas delas tinham terços e folhetos nas mãos, procurando manifestar a fé que sentiam no Todo Poderoso.

O ancião respeitável que estava com a palavra, fez silêncio, passou os olhos em toda a plateia em êxtase e continuou com doçura:

— Meus filhos, nós todos somos criados por Deus, nosso Pai de inconcebível amor. Se aqui, agora, há alguém que não recebeu a sua parte do grande tesouro da felicidade, é porque não se interessou em buscar o seu quinhão, no entanto, ele é seu, e não será dado a nenhuma outra criatura. Ele nunca se perde e é intransferível. A felicidade pertence a todos nós por excelência da lei divina.

Os olhos dos ouvintes brilhavam e se enchiam de esperança. A voz do sacerdote tocou as fibras mais sensíveis dos que o escutavam e ele, mansamente afirmou com convicção:

— A grande herança de todos os povos da Terra e do céu, até onde podemos observar, é o Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo. Ele é o Caminho que nos assegura a conquista da felicidade. Ele é a Verdade que nos mostra como poderemos nos libertar das amarras da ignorância acerca das leis espirituais que nos governam. Ele é a maior expressão de Vida nos círculos em que moramos, a nos mostrar a centelha divina que existe em nós, a ser despertada em sequências admiráveis, conquistada por nossas próprias mãos. Descobriremos o acervo de luz no coração, com a prática da vida que Jesus nos ensinou. O Evangelho não é para ser decorado, como folheto de música popular: ele deve ser observado, analisado e vivido. Respeitamos todos os tipos de crenças que existem e as que ainda possam surgir, no sentido de ajudar os homens a encontrarem a si mesmos. Porém, não podemos deixar de falar ou relembrar o nosso mestre Jesus, na Sua feição mais pura, na grandeza do amor. Temos que encontrar o Cristo Renovador dentro de nós mesmos, porque, se falamos muito do Evangelho aqui neste campo, com todo o respeito que lhe atribuímos, e ao partirmos para outras tarefas que nos cumpre realizar, nos esquecermos da vivência da Boa Nova, o que terá valido a reverência? O que valeu o respeito? E a aceitação daquele instante? Creio que alguma coisa valeu, pois ficou algo a mais em nossos corações, para toda a eternidade, não obstante, continuamos a sofrer, ligados à Terra, às vísceras em decomposição ou aos ossos nas tumbas frias, em um silêncio que parece interminável. Por culpa de quem? Por culpa nossa. Se estamos no escuro é porque não aprendemos a acender a luz, pois, em nossas mãos estão os meios de fazê-lo. A nossa mente gasta o mesmo combustível divino para pensar tanto o Bem como o Mal. Por que não optar pelo primeiro? Todos vós sereis abençoados por Deus todos os dias, se fizerdes um pouco de esforço para melhorar. Aqui mesmo, dentro desses muros, existem várias escolas de Deus funcionando permanentemente em favor daqueles que querem realmente melhorar e aprender pelos próprios esforços. Para encontrardes essas casas de luz basta que vos disponhais para tal. Indagai pelo coração, que vos serão mostradas as portas da residência onde existem dois instrutores, que se chamam Educação e Instrução. A nossa felicidade, meus filhos, não se encontra distante de ninguém, nem do céu, nem da Terra, porque ela mora dentro de nós, esperando que a procuremos.

Abençoou a todos com seu sorriso costumeiro e prometeu voltar em outra oportunidade.

Notava-se em muitos, riscos de lágrimas; outros estavam meditativos e alguns até alegres, acenando para o Padre Galeno, que continuava sorrindo. O pastor também fazia seu gesto de saudação para suas ovelhas, que apertavam, cada vez mais, a bíblia de encontro ao coração.

Aos olhos dos ouvintes, o Padre Galeno e o Quarenta foram se desfazendo no espaço e ficaram invisíveis para a multidão. Eram cerca de setecentas almas que se aproximavam da maturidade como o nascer do sol, e eram necessários toques cada vez mais frequentes, para ajudá-las a abrir os olhos à luz.

O Padre Galeno, ainda com o seu sorriso fácil, olhou para o pastor e disse, com tom educativo:

— Satis verborum! Nós semeamos; compete a eles cuidarem bem das sementes que, nos parece, depositamos no solo dos corações com amor.

O campo santo nos parecia uma verdadeira igreja, cuja serenidade nos convidava à meditação.

Demos pressa em sair, pois ainda tínhamos que levar nossos companheiros encarnados até suas casas, prepará-los para um bom despertar do sono e ajudá-los para que pudessem relembrar alguma coisa que lhes oferecesse impressões valiosas ao acordarem. Voltamos com o pastor, e ele, ao entrar em seu aposento, consciente do seu desdobramento, ajoelhou-se rente ao seu corpo físico, chorando emocionado e agradecido a Deus, pela oportunidade de ficar mais livre e sentir a felicidade, em Espírito, bater à sua porta, onde o coração entendeu o valor da ciência espiritual. Beijou as mãos dos companheiros, reconhecido, pensou firmemente em acordar, e vimos o seu corpo espiritual diminuir um pouco, o cordão fluídico consubstanciai novas tonalidades, mudando em vibrações que correspondessem às do corpo. O sistema glandular começou a vibrar com mais intensidade e os órgãos despertar da sua lentidão.

Quarenta abriu os olhos, como que procurando alguém dentro do quarto.

Começou gradativamente a se lembrar da sua viagem como se fosse um filme, no entanto, não se lembrava totalmente. Algumas passagens se confundiam, pelo fato de que o Espírito no corpo é qual um prisioneiro. As suas faculdades existem mas, não têm meios de alcançar todo o entendimento.

O pastor repetiu o mesmo gesto anterior: ajoelhou-se no chão, chorando por não poder negar a realidade que vibrava em seu sensível coração. Pediu a Deus que os seus companheiros em Cristo pudessem compreender a sua transformação interna, as suas mudanças de conceitos e a sua liberdade de pensar, porque estava conhecendo a verdade que o faria mais livre.

Ele não queria negar o Cristo que começava a despertar em seu coração com os braços abertos à humanidade. Na verdade, seus colegas de posição religiosa já comentavam entre si sobre as mudanças do Quarenta e não viam com bons olhos as suas novas atitudes.

Mas, Quarenta acordou feliz. De momento a momento vinha em sua tela mental a viagem que fizera com os anjos de Deus que, pensava ele, talvez fossem os profetas.

Nós nos reunimos em curta oração ao Criador e planamos para outra esfera, onde nos esperavam novos trabalhos. 


Lancellin






VÍDEO:


INICIAÇÃO VIAGEM ASTRAL - Lancellin, Miramez e João Nunes Maia- esse livro me deixa emocionada!
Canal Leitura Espírita





Nenhum comentário:

Postar um comentário